Duelo de imbatíveis

813 90 127
                                    

— Tudo pronto? — Cacá descansa a mão no porta-malas aberto, completamente lotado.

— Têm certeza de que não esqueceram nada? — Vovó pergunta pela quinta vez.

— Nada, nada. — Fernanda entra no carro.

Naquela manhã, eu não troquei de roupa, nem arrumei os cabelos. Entrei no carro, com a roupa que havia dormido, sem ânimo algum. Neguei o café, e os biscoitos de goiaba que vovó havia oferecido. Eu não tinha apetite.

— Aaah, peraí! Esqueci um negócio. — Tio Zinho volta para dentro da casa, fazendo vovô suspirar.

Não dormi essa noite. Virei de um lado para o outro na cama durante toda a madrugada. Minha cabeça não parou de borbulhar em pensamentos um instante sequer. E continuava até agora.

— Que cara de morta, hein? Que horror. — Fernanda abre a bolsa. — Passa um corretivo nessa olheira. — Ela me entrega o produto.

Eu teria xingado minha prima. Mas no momento, não faço isso. Apenas aceito e passo, olhando no espelho do carro. 

O silêncio da rua é fúnebre. É cedo demais para qualquer um estar acordado além de nós. Poucos passarinhos cantam, competindo com a música de meu avô no som do carro. Uma música triste que me causa agonia, não entendo como todos conseguem não ter vontade de morrer ouvindo isso às cinco e meia da manhã.

Não vou mudar 

Esse caso não tem solução

Sou Fera Ferida

No corpo, na alma

E no coração...


Eu poderia me jogar de um precipício agora mesmo.

— Anda logo, José Roberto!!!

— Ai, vó! — Fernanda tapa os ouvidos. — Ele já deve tá vindo.

— Vai atrasar a gente desse jeito.

Que as cicatrizes falam
Mas as palavras calam
O que eu não me esqueci...

No momento em que meu tio vem correndo, sinto uma sensação terrível, de algo preso em minha garganta.

— Anda rápido!! — Minha vó grita irritada.

— Calma, calma! — Ele entra no carro desesperado e bate a porta.

Quando Cacá fecha o porta-malas e entra no carro, todos nós já estamos colocando o cinto de segurança. Meu avô aumenta o volume da música sofrida, e eu faço uma careta, sentindo o nó cada vez mais apertado em minha garganta.

Eu sei que flores existiram
Mas que não resistiram
A vendavais constantes

Então meu avô vira a chave, fazendo-nos ouvir o som do motor engasgado do velho Fiat. Veremos quantos minutos vamos ficar aqui esperando esse carro pegar, da última vez, a demora atingiu o recorde máximo de 10 minutos.

— O que que cê esqueceu? — Cacá pergunta.

Meu tio sorri, e faz um pouco de suspense para tirar algo do bolso.

— Aqui, Ju. — Ele me entrega um pequeno saquinho rosa rendado.

— O que é isso? — Sorrio fraco, sem muita empolgação.

Ao puxar o laço, o pano se desfaz, revelando um par de brincos de flores de hibisco, artificiais.

— Nossa... — Meu sorriso é o mais genuíno que consigo dar nesse momento. — Que lindos!

O Preço Do Verão - Han JisungOnde histórias criam vida. Descubra agora