Capítulo 2 | Parte 4

169 25 4
                                    

Alfonso entrou em casa e jogou as chaves sobre a mesa. Ele conhecia Anahí desde que tinham 6 anos e, nos últimos dez anos — desde que ela se mudara para Nova York —, ela vinha sendo uma constante em sua vida. Ele não apenas a conhecia, ele sabia quem ela era. Sabia que ficava vermelha com facilidade e que sempre usava protetor solar. Sabia que ela detestava tomate, filmes românticos e o metrô. Sabia que ela era faixa preta de caratê. E Alfonso não sabia apenas dos fatos mais básicos. Ele tinha conhecimento de coisas mais profundas. De coisas importantes. Como o fato de a relação de Anahí com a mãe ser complicada e o quanto o divórcio dos pais a afetou.

Ele sabia de todas essas coisas, mas, até esta noite, não tinha se dado conta de que ela não precisava dos óculos que sempre usava.

Alfonso esfregou o rosto com a mão. Como ele não tinha percebido antes?

Anahí usava aqueles óculos desde sempre e ele nunca questionara por que ela precisava deles. Ele havia notado que ela os ajeitava sempre que uma situação a deixava nervosa ou desconfortável, como se a oferecessem algum tipo de segurança, mas nunca entendera o porquê disso. Eles deviam ser a coisa mais feia que Alfonso já vira. A armação era grossa, pesada e de um tom marrom nada agradável, como se tivessem sido enfiados numa poça de lama.

Eles eram bem pouco atraentes e, conhecendo Anahí como conhecia, Alfonso tinha certeza de que esse era o motivo por que os escolhera. Os óculos eram uma armadura. Arame farpado, para afastar invasores.

Relacionamentos, pensou ele. Havia algo mais complicado na vida?

Garrinhas se esfregou contra suas pernas e Alfonso se inclinou para acariciá-la. Quem ia ser o emissário das más notícias, informando Anahí de que ela era muito linda com ou sem os óculos? O fato de ela parecer negligenciar isso só a tornava ainda mais atraente. Havia tanto que ela desconhecia sobre si...
A gata saltou sobre o sofá, cravando suas garras nele, ao que Alfonso deu uma risada mesmo sem achar graça.

— Sim, ela provavelmente faria o mesmo se eu lhe dissesse isso. Ela enfiaria as garras em mim. E iria se esconder debaixo da mesa da cozinha. Vocês duas têm muito em comum.

Depois de pegar uma cerveja na geladeira, Alfonso subiu os degraus que levavam ao terraço da cobertura. O sol que se punha lançava estilhaços de vermelho e laranja sobre a silhueta de Manhattan.
Nova York era a cidade dos bairros famosos, dos arranha-céus, das buzinas estridentes dos táxis, do vapor sibilante e dos ruídos sem fim dos canteiros de obras. Era a cidade dos pontos turísticos icônicos: o Empire State, o Chrysler, o Flatiron. Era o destino dos sonhos de muita gente e Alfonso entendia o motivo.

Os turistas que pisavam ali tinham a impressão imediata de serem figurantes em um set de filmagem. Eles apontavam para todos os lados: Foi ali que filmaram Homem-aranha ou É ali que Harry e Sally foram feitos um para o outro. E era uma cidade de indivíduos. Os ricos, os pobres, os solitários, os ambiciosos. Solteiros, famílias, locais e turistas: todos se misturavam nessa faixa de terra cercada por água.

— Você vai ficar aí a noite inteira admirando seu reino ou vai dividir uma cerveja comigo?

Alfonso virou-se bruscamente e viu Mane esparramado em uma das espreguiçadeiras com uma cerveja na mão. Ele xingou baixinho:

— Quer me matar de susto?

Mane deu risada:

— O quê? Um cara durão como você? Jamais.

— O que você está fazendo aqui? — Normalmente ele ficaria feliz de ver seu amigo, mas, naquele momento, queria espaço para processar o novo dado sobre Anahí. O que mais ele desconhecia sobre ela? O que mais ela escondia?

Pôr do sol no Central ParkOnde histórias criam vida. Descubra agora