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O sol chegou em Salvador de novo e me chamaram para ir à piscina, então acabei atrasando o ajuste deste capítulo - que ficou grande e complexo. 

O que eu posso dizer é: que montanha-russa.

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Maria Inês Almeida Martins deixou os gêmeos na escola para o primeiro dia na nova instituição de ensino.

Era um colégio de alto padrão, ensino bilíngue – mas todas as crianças pareciam no mesmo nível: ou seja, o básico do básico.

A jovem temia muitas coisas no ambiente em que os gêmeos ficariam inseridos a partir de agora, tanto que buscou, em meio aos colégios caros, de excelência, alguns próximos do duplex onde passou a morar, alguma instituição de ensino com alunos negros. Sabia que teriam poucos, era consciente do elitismo da sociedade em que viveria, do racismo que perpassava todos os setores – incluindo a educação – mas na penúltima escola, que ficava na Pituba, encontrou uma estrutura que a acalmou o mínimo.

Além de alguns alunos, professores negros, e a presença de uma psicóloga para ajudar na transição.

- Os meninos estudavam em uma creche da prefeitura desde os dois anos, e as crianças eram conhecidas, vizinhas. Minha preocupação é em eles se sentirem incomodados ou melindrados, mas como tinha feito visitas junto com as crianças em outras escolas, eles gostaram do ambiente, viram alguns alunos e professores e... Se sentiram um pouquinho menos incomodados.

- Por que essa transição tão extrema? – perguntou a psicóloga, mexendo os óculos e anotando informações em um caderno. – Poderiam ter começado por um colégio menor, com menos alunos, mas que deixasse as crianças mais confortáveis.

Maria Inês tinha a história na ponta da língua, e temia errar tudo, fazendo a profissional à sua frente desconfiar. Havia uma cláusula no contrato muito específica sobre o que aconteceria caso a pedagoga revelasse algo sobre a verdadeira causa de sua "mudança de vida" a outra pessoa fora do círculo do "noivo".

Ela não teria dinheiro algum para cumprir a cláusula.

- O pai dos meninos. Na verdade, o pai adotivo das crianças.

A história a ser contada por Maria Inês era uma versão floreada de como ela e Edmundo se conheceram, preparada por um roteirista de uma agência de marketing político. Existiam duas versões que o profissional desenvolveria: a primeira, era que Rafael e Maria Rosa eram filhos biológicos do casal, que teria se relacionado rapidamente e perdido o contato, sem que Edmundo soubesse da existência das crianças.

- A ideia é boa. – considerou o deputado. – Tem um toque de romantismo, os eleitores adoram. Parece algum romance de banca. Só que precisaríamos pagar umas pessoas aqui e ali, gerar boatos no povoado, para que a história que eles conhecem, a da irmã drogada abandonando os filhos, se misturasse à da mãe solo. Complexo, mas poderia dar certo. Mas precisamos ver questões da idade, Maria Inês tem 23 anos.

O roteirista coçou a cabeça e fez um bico.

- Ela é de quando?

- 11 de fevereiro.

- As crianças?

- 15 de dezembro, idade especulada, mas fizemos exames. Chegaram à vida de Maria Inês pouco após 11 de fevereiro. – O próprio Edmundo parou de falar e respondeu. – Aborte. Meus inimigos políticos diriam que me envolvi e abandonei uma adolescente menor de idade.

- Poderíamos considerar que ela... Mentiu? Ela teria se encantado por um homem mais velho e...

- Minha noiva não mentiria sobre algo tão grave para mim, e eu jamais me envolveria com menores de idade.

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