Capítulo Vinte e Oito

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|KAILE|

O calor é insuportável, como se cada célula do meu corpo estivesse sendo queimada por dentro, por fora e por toda parte. É horrível e assustador. O prédio está se desfazendo ao meu redor, em chamas, um verdadeiro inferno na Terra. A fumaça grossa se espalha por todos os lados, corroendo meus pulmões a cada respiração. Meu coração dispara em um ritmo frenético, mas não importa. Eu tirei Amara de lá. Ela está segura longe dessa bagunça infernal. Só isso já me dá forças para seguir em frente, mas agora preciso voltar. Meus amigos ainda estão presos nesse pesadelo. Eu os trouxe aqui. É minha responsabilidade garantir que saiam vivos também, ou jamais me perdoarei por causa disso.

— Kaile, não! — ouço o grito desesperado de Amara atrás de mim, mas não posso ouvir isso agora. Preciso voltar, preciso consertar o meu erro.

Deixo Amara em segurança, longe das labaredas e dos escombros que caem do céu como bombas. Meu corpo quer desistir, meus músculos imploram por descanso, mas não há tempo para hesitar. Rodolfo, Débora, Lígia... ainda estão lá dentro, presos no meio desse caos. Eu sei que são adultos, capazes de tomar suas próprias decisões, mas fui eu quem os convenceu a participar desse projeto, quem trouxe essa ideia maluca para as nossas vidas. E agora, eles dependem de mim.

Corro de volta para o prédio em chamas, o calor me atinge como uma onda brutal no rosto. A fumaça é espessa demais, tornando difícil enxergar, mas preciso ignorar tudo. Cada passo é uma batalha. Ouço gritos distantes, pessoas clamando por ajuda. Algumas passam correndo por mim, desesperadas, algumas cobertas de cinzas, outras feridas, mas eu sei que não posso parar. Meus amigos. Eles são a minha missão.

A estrutura do prédio range como um animal ferido, prestes a ceder. Subo o que restou de uma escada, os degraus estão desmoronando sob meus pés. A dor atravessa meu corpo quando algo pesado cai em meu ombro. Um pedaço de concreto, talvez. Sinto o impacto, mas não tenho tempo para me preocupar com isso agora. Amara está segura, mas Lígia... ainda não consegui encontrá-la.

— Lígia! — grito, a voz rouca, engolida pelo calor e pela fumaça.

Os corredores são um labirinto de destruição. Em meio ao caos, vejo algumas pessoas feridas tentando escapar. Com um esforço sobre-humano, ajudo dois homens até a saída mais próxima, sentindo o peso deles nos meus braços. Eles estão vivos, mas isso não é suficiente. Eu preciso encontrar Lígia, Rodolfo e Débora. Eu preciso...

De repente, uma explosão. O barulho me ensurdece, e uma onda de calor me joga contra a parede. As chamas lambem minhas pernas, e eu sinto a pele queimando. A dor é lancinante, mas tenho que continuar. Com dificuldade, me ergo e sigo em frente, mancando. O ar está cada vez mais difícil de respirar, e a fumaça é como uma cortina negra que não consigo atravessar.

E então, para meu alívio, vejo uma silhueta se movendo à minha frente. Rodolfo surge em meio à fumaça, mancando, com o rosto coberto de fuligem e um corte profundo na testa. Ele está apoiando Débora, que parece estar sem forças, o braço dela enrolado em sua cintura.

— Kaile! — Rodolfo grita, me vendo ao longe. — Me ajuda com ela!

Corro o mais rápido que posso até eles, ignorando a dor que se irradia pela minha perna. Juntos, conseguimos guiar Débora até a saída. O ar lá fora parece mais limpo, mais frio, como um abraço de alívio. A sensação é quase indescritível.

— Vai com ela, Rodolfo! — digo, empurrando os dois para longe do fogo. — Eu ainda não encontrei Lígia!

— Você está louco? — Rodolfo me segura pelo braço. — Não vai voltar lá!

— Eu preciso! — grito, arrancando meu braço da mão dele. — Não posso deixar ela lá!

Os dois desaparecem na fumaça enquanto eu volto para o inferno. A dor é insuportável, mas o medo é maior. Cada segundo que passa pode ser o último para Lígia. Eu a ouço chamando por mim, como um fantasma na minha cabeça. Tento me concentrar, mas a fumaça é densa demais, e meus pulmões ardem com cada respiração. Não vou desistir. Não posso.

Continuo cambaleando pelos escombros, mancando e tossindo, lutando contra o impulso de desmaiar. O suor escorre pelo meu rosto, misturado com lágrimas que não sei se são de dor, frustração ou medo. E então, em meio às sombras, vejo uma forma familiar.

— Lígia!

Ela está caída no chão, desmaiada, os cabelos espalhados como uma cortina escura sobre o concreto sujo. Meus pulmões quase explodem de alívio, mas também de pânico. Eu corro até ela, tropeçando nos escombros, e caio de joelhos ao seu lado. Minha cabeça está girando, o calor está me matando, mas eu tento levantá-la.

Ela é pesada, muito mais do que meu corpo exausto consegue suportar. Tentei uma vez, duas vezes, e falhei. Meus braços parecem feitos de chumbo. A fumaça está tão densa agora que mal consigo ver. Estou ficando sem tempo.

— Não... não... — murmuro, a voz quase inaudível.

Tento novamente, reunindo cada fragmento de força que ainda me resta. Meu corpo inteiro grita de dor, mas eu consigo. Levanto Lígia nos meus braços e começo a andar, cambaleando pelos corredores que ainda estão de pé.

Mas então, um som horrível atravessa o ar. Um rugido, como se o próprio prédio estivesse gritando. O chão treme sob meus pés. Tudo está desmoronando. Ouço o estalo das paredes e, em um segundo, a estrutura começa a ceder.

— Não, não, não...! — Tento correr, mas é tarde demais.

O teto racha, pedaços de concreto começam a desabar, e em um instante, tudo à minha volta desmorona. O som é ensurdecedor. Uma parede inteira cai diante de mim, bloqueando qualquer rota de fuga.

Eu caio. O peso de Lígia em meus braços, o calor insuportável, a fumaça que preenche meus pulmões. Tudo vira escuridão. As últimas coisas que sinto são o calor das chamas, o peso dos escombros sobre mim e o grito abafado de Amara em minha mente. E então, tudo apaga. 


💔

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Aprendizes -Os Bertottis #4 [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora