34. PESQUISAS

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Julia observava da janela de vidro a náiade que dormia na beira do lago, com o corpo submerso apoiado em um tipo de esteira de algas entrelaçadas que balançava suavemente com as ondas que chegavam até a porta da cabana. Somente o rosto da  ninfa aparecia na superfície da água enquanto seus cabelos negros dançavam no ritmo das ondulações e crustáceos maiores que caranguejos se seguravam em suas vestes cinzentas.

A garota estava encantada com a cena, imaginando se todas as ninfas aquáticas dormiam assim também.

Seus pais conversavam baixinho, sentados à mesa da sala enquanto sua mãe folheava o maior livro que ela já tinha visto. O sol surgia por trás das montanhas na margem oposta, refletindo sobre a água turva como um arco-íris de tons quentes. A neblina da madrugada se dissipava e o canto dos pássaros dava à menina uma experiência completamente diferente do que acordar com o barulho do trânsito de Londres.

A pequena mestiça sentiu algo se agitando em seu interior ao contemplar as árvores cujas folhas balançavam com o vento que vinha do lago. Fazia quase três meses desde que sentiu isso pela primeira vez, e desde o acidente na escola, quando perdeu o controle, vinha treinando e se conectando com a natureza todos os dias. Sua mãe dizia que quanto mais ela treinasse, menor seria essa força que tomava conta dela, mas em vez de diminuir, ela sentia que ficava mais descontrolada a cada dia, como se pudesse explodir a qualquer momento, e isso a assustava.

Fechou os olhos, sentindo uma lágrima molhar sua bochecha rosada. Nesses momentos sentia muito a falta de seu irmão. Apesar de amar seus pais mais que tudo no mundo, Joshua era o único que entendia como se sentia tão diferente das outras pessoas. Em seus braços tinha um refúgio, um lugar confortável para chorar e sonhar com um mundo onde não fosse a garotinha esquisita e anormal para as outras pessoas.

Mas agora ele estava longe, não podia abraçá-la e falar sobre o ciclo de vida da flor de lótus ou de como as flores da classe asteracidae se fecham lentamente durante a noite e abrem quando o sol está forte. Ele a ensinava coisas sobre as plantas que nenhuma criança humana entenderia. Agora sabia que entendia o que ele falava porque não era humana, seu lugar não era na cidade, no meio de pessoas que nunca a entenderiam ou aceitariam.

Estava ansiosa para conhecer o lugar onde seu pai disse que ela iria se encontrar com o Joshua. Um lugar onde as pessoas eram como ela, onde nunca mais se sentiria rejeitada ou humilhada. Tinha saudades dos seus amigos, é claro, porém Norma e Theo estariam para sempre em seu coração. Talvez um dia ela pudesse vê-los de novo.

Abriu os olhos e ofegou assustada ao ver Kelpie sentada, olhando diretamente para ela, com os olhos brilhando em uma fraca luz branca. A náiade fez uma careta e se virou para o lado, mergulhando na água e sumindo de vista.

— Ju, vem aqui, meu amor. — Ela olhou para sua mãe, que havia fechado o livro. — Quero conversar com você.

Julia se aproximou e pulou no colo de Hamish, que abriu os braços para recebê-la.

— Filha, eu vou precisar sair para pegar algumas ervas na floresta para fazer um encantamento com a Kelpie, então falei com seu papai para vocês irem passear na cidade e passarem o dia todo lá, conhecendo a história local. O que você acha?

— É barulhento? Eu gosto dos sons calmos daqui.

Isla sorriu.

— Inverness é o centro das Terras Altas, mas é um lugar quase rural se comparado às Terras Baixas. É tranquilo, apesar de ser muito visitado pelos turistas por causa do Monstro do Lago Ness.

Os olhos de Julia brilharam, empolgados.

— Ele é de verdade? O Josh disse que é um dinossauro que come pessoas, mas que se olhar de longe não tem problema.

No Coração do Bosque ProibidoOnde histórias criam vida. Descubra agora