Isla observou o interior da cabana de Kelpie. Era toda arrumada, perfumada com flores diversas plantadas ao redor da construção e em alguns vasos espalhados pelos cômodos.
Hamish e Julia dormiam em uma cama improvisada de peles no que poderia ser o quarto de Kelpie, mas era apenas um cômodo com objetos dispostos em mesas e armários, pois ela era uma náiade, não dormia na terra. Sua cama era feita de algas e ela costumava dormir nas margens do lago ou na piscina de pedra que ficava no meio da sala, com um túnel subterrâneo que dava no lago.
Plantas luminosas estavam dispostas pela cabana em padrões que formavam figuras do teto ao chão. Uma das paredes era coberta por estantes cheias de livros e com alguns mostruários de vidro que continham papiros com aparência antiga e frágil. Kelpie estava calada, passeando em frente à estante, numa parte em que se encontravam grossos livros com as mais variadas capas.
Em dado momento, a náiade parou em frente a uma das caixas de vidro e a abriu para pegar um pergaminho.
— Este é um pedaço do grimório mais antigo que consegui encontrar. Estava no mercado ilegal humano, no lugar que chamam de Cairo. Pertenceu a uma bruxa egípcia, provavelmente dado a ela por uma ninfa feiticeira como tu, filha de Cibele.
— Meu nome é Eilean. Na tribo me chamavam Eileanach, por ser da família real.
— Estou tentando não pensar no fato de que és da família real e extremamente parecida com Hariel. Foi por isso que eu soube que pertencias ao clã dos carvalhos reais e à família de Marleg.
— Não escolhi nascer com essa aparência. Minha mãe era uma versão mais madura de mim, assim como a mãe dela.
— Eu tive esperança de que as próximas gerações se pareceriam com a pequena Fler e não com sua mãe.
— Essa é a aparência da nossa família, Kelpie. Nem todos são assim, com cabelos e olhos dourados, mas a maioria sim. Meu filho é idêntico a mim, exceto pelos olhos esverdeados que herdou do meu pai. E você viu a Julia, não se parece em nada com uma dríade real, assim como o Hamish.
Kelpie estendeu o pergaminho para que Isla o abrisse sobre a mesa.
— Teu irmão era como tu? Sei apenas que ele também fazia feitiços.
Isla suspirou tristemente.
— Zapir tinha cabelos vermelhos como os do nosso pai, mas as feições e os olhos amarelos eram exatamente como de nossa mãe. Ele perdeu a razão quando sua companheira morreu em uma caçada de lua nova, foi empalada no coração pela cauda de um fnekr. Zapir me culpou porque eu era a líder das caçadoras, mas Nyla não estava na minha equipe e, quando Vctrya, a atual Grande-Mãe da tribo, me falou o que aconteceu, não havia mais nada que pudesse ser feito. As ninfas com poderes de cura são raras, e geralmente elas se tornam cuidadoras junto com a Invta e as fadas. Eu nunca vi uma caçadora com dom de cura.
— Mesmo as que têm esse dom não conseguem curar qualquer ferimento, depende de quão profunda é a ferida. Já andei por vários lugares à procura de alguma solução para a minha condição. Uma vez eu vi uma selkie¹ da Irlanda sair para caçar em mar aberto e ser destroçada por um tubarão. Uma ninfa curadora fez de tudo para sarar os machucados, mas no fim a garota sangrou até morrer. — Kelpie tinha o olhar distante, como se estivesse vendo em sua cabeça o que relatava. — Enfim... O que aconteceu com teu irmão depois disso? Ele partiu?
Isla parou de examinar o pergaminho e sentiu sua garganta travar com lágrimas reprimidas. As lembranças eram dolorosas.
— Se ele tivesse ido, nada seria como foi depois. — Ela devolveu o pergaminho para Kelpie com um suspiro, pois estava escrito em copta, a antiga língua egípcia, e ela não entendia nada. — Meu irmão me atacou. Nós lutamos e ele me lançou um feitiço que deveria me matar, porém nosso pai se colocou na minha frente e tomou todo o impacto. Zapir pediu perdão, tentou desfazer o feitiço, mas só o que conseguiu foi que nosso pai não morresse na hora. Ele ficou muito doente e nem a Invta conseguiu ajudar. Depois disso, o Líder Guerreiro nunca mais foi o mesmo. Passou a ser cuidado por uma curandeira diariamente e não pôde mais andar ou falar como antes.
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No Coração do Bosque Proibido
FantasyJoshua Wood cresceu ouvindo que jamais deveria entrar no bosque que delimitava o quintal de sua casa. Aos nove anos ele teve uma experiência que o fez viver sem saber se aquilo realmente aconteceu ou se foi sua imaginação de menino. Muitos anos depo...