Capítulo 9 - Anos de mudanças

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O ano era 1974. Bóris e Fernando tinham 21 anos. Ísis e Mário com 20 anos.

Bóris e Fernando, estavam sentindo o cerco se fechar à medida que a ditadura militar se tornava mais implacável. Suas atividades em prol dos direitos da população e da justiça social incomodavam as autoridades do regime autoritário.

Eles estavam convencidos que o curso que estavam fazendo de direito tinha um propósito maior: ajudar as pessoas a entenderem e reivindicarem seus direitos.

Bóris e Fernando, todas as quartas-feiras à noite se reuniam com pessoas leigas da cidade para ensinarem sobre seus direitos, em um esconderijo que ficava nos fundos de um bar do amigo do pai de Bóris.

Ísis sempre os acompanhava, mesmo achando perigoso. Ela ficava na parte da frente do bar para avisá-los caso visse a polícia.

— Sabemos que a situação lá fora está cada vez mais perigosa. Alguém tem mais alguma pergunta? - diz Bóris, bem baixinho.

Uma mulher levanta a mão.

— Pode perguntar.

— Ouvi dizer que podem nos prender sem motivo. Isso é verdade? - pergunta Maria.

— Sim, Maria, infelizmente é verdade. Eles não respeitam os direitos individuais, e fazem muitas prisões ilegítimas. - respondeu Bóris.

— Pessoal, devemos ter muito cuidado em tudo o que fazemos. Evitem fazer coisas que possam atrair a atenção indesejada. Sei que o que fazemos aqui é um risco, mas precisamos alertá-los. - disse Fernando. — Mais alguma pergunta?

— E se eles entrarem na minha casa sem permissão?

— Se isso acontecer, é ilegal, mas sob o regime atual, eles frequentemente ignoram a lei. Tente ser discreto e mantenha sua casa segura. - responde Bóris.

Eles são interrompidos por Ísis, que entra correndo e esbaforida.

— Bóris, tem policiais na rua. Estão vindo na direção do bar.

Imediatamente, todos ficam em silêncio. Fernando apaga as luzes.

— Boa noite senhor. Recebemos uma denúncia anônima de uma reunião de opositores que está acontecendo aqui no seu bar. - diz o policial.

— Deve haver algum engano. Aqui não tem nenhuma reunião. - diz Seu Marcos, dono do bar.

— Temos que revistar o local.

Eles entraram bar adentro, sem pedir permissão. Revistaram a cozinha, a despensa e não acharam nada. Pensaram que realmente deve ter sido um engano, e foram embora.

O que eles não sabiam era que a entrada para o esconderijo ficava atrás de um freezer que tinha na cozinha.

— Pessoal, eles já foram. Só esperem um pouco para saírem, eles podem estar lá fora de tocaia. Vão saindo aos poucos. - diz Marcos a Bóris e Fernando.

Ísis se aproxima e abraça Bóris.

— Meu amor, isso está ficando muito perigoso. Não é melhor cancelar essas reuniões? - diz Ísis preocupada.

— Não podemos fazer isso, minha querida. Sei que fica preocupada, e agradeço por isso, mas nossa missão é alertar o povo. - diz Bóris, passando a mão no cabelo de Ísis.

— Tenho medo que peguem você e o Fernando. - diz Ísis, com os olhos cheios de lágrima.

Fernando vê e se aproxima.

— Ei mocinha, por que está chorando?

— Ela tem medo que nos peguem. - responde Bóris.

Fernando a abraça, e beija sua testa como era de costume fazer.

— Não se preocupe Ísis, vamos tomar cuidado, tá bom? - diz Fernando, carinhoso.

— Tá bom, tá bom. - diz Ísis. — Eu tenho muito medo por vocês. Eu não sei o que faria sem vocês.

— Vamos ficar bem. - diz Fernando.

E os três se abraçam.

Duas horas se passaram, e todos já tinham ido embora. Ísis, Bóris e Fernando entram no carro para irem para casa.

Ísis senta no banco do carona, e Fernando no banco de trás.

No caminho, Fernando olha para trás e percebe que há um carro de polícia seguindo-os a uma distância perigosa.

— Pessoal, temos companhia. Tem um carro de polícia atrás da gente.

— O que? Isso não é bom. O que vamos fazer? - diz Ísis, com a voz trêmula.

— Calma, meu amor. Vamos agir naturalmente, não podemos levantar suspeitas.

— Eles estão cada vez mais próximos. Acho que vão nos parar. - diz Fernando.

Ísis agarra o braço de Bóris, com os olhos arregalados de medo.

— Bóris, o que faremos se nos pararem? Eles podem nos prender a qualquer momento.

Bóris olha para Ísis tentando transmitir calma.

— Fique calma, minha querida. Vamos pensar em algo, mas primeiro preciso que se tranquilize. Respire fundo.

O carro da polícia faz sinal com os faróis e pede que parem o carro. Um policial se aproxima, batendo na janela do motorista.

— Documentos. - diz o policial com um tom severo.

Bóris entrega os documentos com as mãos trêmulas. O policial os examina rapidamente e, em seguida, olha desconfiado para o trio no carro.

— Recebemos uma denúncia anônima de uma reunião de opositores no bar ali atrás. Vocês estavam lá?

— Nós estávamos no bar, sim, mas apenas para tomar um café. Não estávamos envolvidos em nenhuma reunião política.- diz Bóris, tentando parecer calmo.

O policial olha para Ísis no banco de trás e a reconhece. Ele faz uma pausa, avaliando a situação.

— Vocês deveriam ter mais cuidado em tempos como este. Estamos de olho. Vão para casa. - diz o policial com um tom de ameaça.

O policial volta para o carro e antes de sair, cochicha algo com seu colega enquanto olham para o carro. Depois vão embora.

— Foi por pouco. Eles quase nos pegaram. - diz Ísis assustada.

— Sim, quase. Precisamos ser ainda mais cautelosos daqui em diante. Essa situação está ficando mais perigosa. - diz Bóris ainda tenso.

O Amor que Desafiou o Tempo - Ísis & BórisOnde histórias criam vida. Descubra agora