capítulo 26

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Sheilla entrou em seu apartamento no primeiro andar e fechou a porta atrás de si. Os únicos sons eram o da sua respiração e da tv dos vizinhos. Um casal de idosos que sempre a deixavam no volume máximo. Já tinha se acostumado com o som e sempre conseguia ignorar. Ainda assim, não sentiria falta disso quando se casasse com Breno e se mudasse dali.

Seu coração acelerou com o pensamento.

Agora, não.

O apartamento estava com aquele cheiro de guardado, apesar de só ter ficado fora por quatro dias. Havia alguns copos de café vazios na mesa, assim como dois pratinhos. Foi até o sofá cinza e pegou as almofadas, arrumando- as. Foi até a cozinha, limpando alguns farelos. Colocou a água para ferver e caminhou até a geladeira. Estava sem leite. Teria que fingir que era italiana e beber café preto. Podia fazer isso.

Dez minutos depois, estava jogada no sofá e o café começava a esfriar. Não queria tomar. Não queria nada. A não ser uma coisa.

Ou melhor, uma pessoa.

Então apoiou a cabeça nas mãos, esfregando o rosto. Ainda conseguia sentir vagamente o cheiro de Gabriela na ponta dos dedos. Ainda se lembrava da sensação de estar dentro dela. Excitante. Sexy. Fantástico.

Balançou a cabeça.

No tempo que passou táxi na volta para casa, ficou se perguntando o que fazer. Pegou o celular algumas vezes, encarando o número de Gabriela, e depois o deixava de lado. O que escreveria? "Foi ótimo transar com você no avião. Agora, sobre as flores do meu casamento...". Não daria certo.

Nada daria certo, e esse era o problema.

Ficava tentando arrumar desculpas para não ligar para Breno e pedir para ele que fosse até sua casa para terem uma conversa. Até a ideia de ligar para ele era estranha. Eles não eram nada parecidos com Thaisa e Rafael. Talvez pudesse adiar o casamento, pedir um tempo para pensar. Ele ficaria magoado. Ia perguntar o porquê. E ela não poderia contar para ele. "Porque estou apaixonada pela minha madrinha de casamento. Sabe aquela que você contratou?" Não, isso acabaria com ele. E com ela também. Além do mais, teria que lidar com Brenda. E todas as outras pessoas. Respirou fundo. Que confusão.

Deveria encontrar Gabriela no dia seguinte para conversar sobre o discurso. Mas conseguiria fazer isso? Se fossem se encontrar, teria que ser estritamente profissional. Isso aconteceria? Poderia confiar em si mesma? Nunca se considerou alguém que não inspirava confiança. Alguém incapaz de controlar suas ações. Mas foi o que aconteceu.

Era o que sua madrinha fazia com ela.

Gabriela a fez ver o mundo de uma forma diferente. Nesse final de semana, solidificaram uma conexão. Falou de coisas que não confidenciava há anos. Coisas das quais se esqueceu com sua vida ocupada. Trabalhar para caridade. Fazer a diferença. Não ser sugada pelo mundo corporativo. Quando sua vida havia escapado por entre os dedos?

Pegou o celular do trabalho e checou os e-mails. Tinha cento e cinquenta e dois. Não era ruim para quatro dias fora. Um dos primeiros chamou sua atenção. Era do seu chefe. Quando o abriu, viu que ele estava pedindo por uma reunião sobre "algo importante" na hora do almoço do dia seguinte. Talvez fosse sobre o projeto que ela queria liderar.

Sheilla se endireitou. Amanhã? Quando deveria se encontrar com Gabriela? Droga.

Antes de conhecê-la, Sheilla teria ficado muito empolgada com esse e-mail. Agora, nem tanto. Precisaria verificar se a madrinha poderia se encontrar com ela mais tarde. Já estava sentindo muito a falta dela.

Uma batida na porta fez com que pulasse.

Quando abriu a porta, o seu coração contraiu de tristeza. Sabia que não deveria ser a reação ao ver o noivo. A cabeça de Breno era quase invisível atrás do enorme buquê de rosas vermelhas que ele segurava. Havia um presente na outra. O coração de Sheilla se afundou um pouco mais. Merda, ele tinha comprado um presente na despedida dele? Ela não havia trazido nada, a não ser um caminhão de culpa.

Era uma pessoa horrível.

Breno se adiantou para abraçá-la, oferecendo as flores com um beijo na bochecha.

— Olá, futura sra. Blassioli. — Ele abriu um sorriso, passou por ela e pegou um vaso no balcão da cozinha. Encheu com água e então pegou as flores da mão dela para colocá-las no lugar. Breno era melhor que ela para lidar com flores. Isso já havia sido determinado desde cedo. Era daí que vinham os cutucões de Caroline sobre sua sexualidade. Ele não era gay, só era criativo. Sheilla, por outro lado...

— Como foi? A mansão não é espetacular? — Sheilla assentiu, colocando um sorriso falso no rosto. Flashes do beijo de Gabriela continuavam a passar na sua cabeça, mas ela os afastou. Precisava fazê-lo se quisesse sobreviver.

— Foi incrível. Todo mundo aproveitou muito, e a Gabriela garantiu que tudo corresse bem.

Era quase verdade. Colocou a mão em seu braço quando ele começou a cortar as folhas das rosas e a tirar a ponta dos cabos. Preciso. Breno era assim.

— E você? E o seu final de semana? — Breno deu de ombros sem olhar diretamente para ela.

— Sabe como é. Muitas bebidas, comportamentos indecentes. E... — Ele fez uma pausa, olhando para ela antes de deixar as flores no balcão e respirar fundo. — Me arrumaram uma stripper. Falei que não queria, mas sabe como o Thiago é quando coloca uma ideia na cabeça. O Ryan também. Tiraram fotos, então caso alguma delas apareça, queria que soubesse. Me senti mal. — Ele parou, estendendo a mão para o presente. — Te trouxe um presente. Não é motivado pela culpa. Eu já ia comprar.

Sheilla engoliu em seco, imóvel. Breno estava preocupado por causa de uma stripper?

Ela abriu a caixa. Dentro dela, havia uma linda pulseira prateada, rodeada por diamantes. Não a merecia, mas não podia deixar que ele percebesse. Ela o olhou.

— É linda, mas você não precisava. — Ela era uma pessoa horrível.

— Eu sei, mas queria. Sei que era minha despedida de solteiro, mas fiquei com saudades. É cafona? — Ele ergueu as mãos e deu um sorriso. — Não me importo, mas é assim que me sinto. Além disso, se não posso ser cafona ao me casar com minha melhor amiga, quando vou ser? — Sheilla sorriu, apesar da sensação estranha no estômago. Não era uma tarefa fácil. Era como esfregar a barriga e dar tapas na cabeça ao mesmo tempo.

— O outro motivo pelo qual o comprei, além de dizer que te amo, é porque preciso pedir um favor. Meus pais querem que a gente jante lá amanhã à noite. Sem nenhum compromisso extra, só um jantar para passarmos um tempo juntos. Eles querem te conhecer melhor. Já disse que sim, porque presumi que terça seria um bom dia por você. Tudo certo? — Seu ânimo diminuiu ainda mais.

— Amanhã à noite? — Estava querendo ver Gabriela, mas agora não estava livre nem para o almoço e nem para o jantar. Não poderia dizer isso, poderia? Não quando Breno estava olhando para ela como um cachorro sem dono. Mordiscou o lábio superior. — Certo, amanhã está bem. — Breno pareceu estudar sua expressão.

— Excelente atuação. Você está ficando melhor nisso. — Ele sorriu. — Obrigado.

O celular dela tocou. Sheilla foi até o sofá e Breno voltou a arrumar as flores no vaso. Era uma mensagem de Gabriela. Sheilla engoliu em seco. Poderia cobrir com a mão ou ir até o quarto ler. Estava sendo idiota, então clicou logo na mensagem.

Espero que tenha chegado bem em casa. Ainda vamos almoçar amanhã? Para falar do seu discurso e todo o resto?

Cerrou os dentes. Gabriela ia achar que estava arrumando uma desculpa, mas não tinha nada que pudesse fazer.

Sinto muito, mas apareceram algumas coisas. Te envio uma mensagem durante a semana para combinarmos.

Olhou para a mensagem. Estava fria demais? Deletou o que tinha escrito, olhou para Breno e então escreveu de novo. Não tinha tempo para se preocupar. Explicaria para Gabriela quando a encontrasse. Apertou o botão enviar com uma sensação de mau agouro tomando conta do seu estômago. Tudo isso só adiava seu encontro, e agora ainda teria que aguentar um jantar com Breno e os pais dele.

— Está tudo bem? — ele perguntou, indo até ela e beijando-a nos lábios. — Sheilla precisou de tudo o que tinha para não entrar em colapso naquele instante.

— Sim.

Mas agora, ela sabia.

Não queria ser beijada por mais ninguém a não ser Gabriela.

before you say i do - sheibiOnde histórias criam vida. Descubra agora