[1] - Habitat

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Por alguma razão, em determinado momento de sua vida, você já se pegou divagando sobre o quanto somos pequenos diante de nossa própria existência?

Por si só.

O mundo existe e acontece independente de nossa vontade concreta, quer dizer, ainda que achemos ser o centro de uma grande conspiração, como Thurman Burbank em The Thurman Show, nossas vidas podem não ser interessantes o suficiente para suprir a necessidade de entretenimento pontual das demais pessoas.

Não, infelizmente, nós não somos o centro do mundo. E essa dura realidade pode nos levar a loucura se refletida demais.

Quer dizer, podemos até ser o centro de tudo. Em certa parte, até porque é importante que exista egoísmo na existência de cada um, o amor próprio para diluir de forma gentil a sobrecarga de nem tudo ser exatamente como queremos que seja. Um ótimo roteiro para um ótimo ser humano, todo mundo é protagonista da própria vida.

Logo, a história que vamos conhecer, inicia nesse ponto de partida peculiar, egoísta e contraditório: o amor.

Amor próprio.

Nada fantasioso e muito menos altruísta como se espera de um romance. Bruto, obscuro e muito exigente, mas digno de ser destaque durante o caminho que percorre para se tornar doce. Porque, ainda que pequenos diante da própria existência (há controvérsias), Yan e Peter são enormes.

Grandes demais – não apenas no sentido físico da palavra, porque também são –, o suficiente para serem predadores em seus territórios, nos habitats aos quais pertencem desde muito antes de cruzar o caminho um do outro.

Habitat 1, por Yan Satoru: o crime.

Habitat 2, por Peter Skylar: o sucesso.

Ambos escravos da fama, a fama que é um conceito sobre algo ou alguém; reputação e renome... Imagem. Nada mais que imagem.

Mas, não existe forma de estabelecer se a fama é algo positivo ou negativo, não quando somos apenas peças do sistema ao qual fomos inseridos. Pensando bem, quem nunca foi ovacionado ou devorado por causa da fama?

Aqui, meus caros, a fama é protagonista. Egocêntrica, arrogante e faminta, o centro entre dois pólos, extremos de tão opostos e desesperados para que isso nunca mude, pelo simples fato de não saber o que irão fazer quando/se mudar. Se o planeta passar por mais uma Era.

Daí, criando um novo habitat.

Habitat 3, por Yan e Peter: o amor.

E nesse habitat, esses dois homens não se tornam presas, eles ainda são predadores famintos.

Tentando devorar um ao outro.

Nada é mais perigoso que o amor, afinal, a fama é uma amante muito ruim.

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Sacramento - Califórnia, Distrito-1

Setembro de 2021.

O clima estava seco.

Na esquina da St. Thomas com a Luke Paradise, uma bela mulher pendurou um Camel Kretek nos lábios artificialmente cheios, usando o isqueiro da loja de conveniência para acendê-lo. O sol estava se pondo e ela podia observar o céu mudando para longe. Apesar de prever uma noite pouco abafada, suas pernas longas estavam nuas, expondo a meia arrastão bem fixada graças a cinta ao redor das coxas pouco fartas. Ela era o retrato perfeito do tipo popular na cidade.

Tragando demoradamente, a mulher encheu os pulmões com a fumaça tóxica que cheirava a cravo e menta, tão doce quanto o perfume sobre sua pele bronzeada. Há alguns metros, dois homens meio embriagados saltaram da loja de conveniência segurando garrafas de bebidas baratas e duas caixas com maços de cigarros falsificados. Um deles, o mais alto, assoviou para a mulher antes de cuspir uma dúzia de palavras nojentas sobre seu corpo. Ela o ignorou com quase classe, rolando os olhos azuis e maquiados, mostrando o dedo médio.

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