Luzes Da Cidade

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Chuya

Depois de toda a confusão que aconteceu naquela noite tumultuada, as coisas finalmente começaram a se acalmar na Vila da Areia. Ume havia sido presa, Hiroto, morto, e eu sabia que minha mãe estava profundamente abalada com o que aconteceu. Ela mal conseguia acreditar que a própria sobrinha havia maquinado tudo aquilo do incêndio e da minha tentativa de assassinato, e levou dias até que ela conseguisse se recuperar da notícia de que sua sobrinha estava envolvida em algo tão sombrio. Era como reviver o luto de perder um ente querido, e não havíamos falado diretamente sobre, mas eu respeitei o seu tempo e seus sentimentos. Estávamos muito envolvidas na organização do Festival, que já aconteceria no dia seguinte, e eu estava na cozinha, quando senti uma mão familiar pousar em meu ombro.

— Filha.

— Oi, mãe. — A respondi, sem olhar para ela, mas eu sabia bem quando a senhora Mori precisava de atenção. Quando encontrei sua feição, percebi que seus olhos estavam cheios de lágrimas. — O que foi?

— Eu estava pensando e... Acho que te devo desculpas.— Começou a dizer.— Eu nunca percebi o quanto Ume te odiava. Ela... Ela te chamou lá para te matar. O que seria de mim se eu tivesse perdido você?

A abracei com carinho, sem nem conseguir imaginar naquela possibilidade.

— Mãe, está tudo bem.

— Não, não está, Chuya. — Ela resmungou, em meio as lágrimas, ainda agarrada a mim. — Você é tudo o que eu tenho, minha filha. Eu não acredito que defendi alguém que maltratava você.

— Como a senhora ia advinhar, se eu nunca disse?

Ela soltou um suspiro profundo, as lágrimas descendo por suas bochechas.

— Mas eu deveria ter percebido. — Insistiu, em um lamento. — Eu devia ter protegido você de tudo isso.

— Eu disse que já passou. — Insisti, olhando para ela. — Nós duas passamos por momentos díficeis. Você é uma mãe maravilhosa, e agora, nós podemos recomeçar. Juntas.

Ela assentiu, enxugando as lágrimas com as costas das mãos. Era um começo, um passo em direção à cura das feridas do passado. Enquanto olhava para minha mãe, eu sentia que, apesar de tudo o que havíamos enfrentado, ainda havia uma chance de finalmente viver em paz.

— Certo. — Ela disse, fungando e parecendo se recompor. — E você já foi lá fora ver os preparativos para o Festival?

— Eu não tive tempo ainda. — Respondi, de maneira sincera. Eu havia passado tanto tempo fugindo dos olhares curiosos que não me importaria em ficar trancafiada em minha cozinha para sempre.

— Ah, não se preocupe com isso. — Minha mãe me deu um leve empurrão de onde eu estava. — Eu termino isso aqui pra você. Vá ver como tudo está lindo! Imagine só como não vai estar amanhã. Aproveite e caminhe até onde a nossa barraquinha vai ficar. Eles já montaram.

Dei um sorriso sem graça, sem querer a contrariar e me retirei a passos lentos da doceria.

Saí de seu interior e dei de cara com a agitação que tomava conta das ruas. As ruas estavam decoradas com lanternas de papel coloridas, algumas penduradas em postes, outras adornando as fachadas das casas e também das lojas. Eu me perguntei como ficariam a noite. Sem dúvidas, seriam como se as estrelas houvessem caído do céu! Caminhei alguns metros, e ao longo das calçadas, os organizadores montavam as barracas, em que cada uma seria vendida uma iguaria da Areia. Também haveriam um lado apenas para os artesãos locais, e eu me perdi em meio a tantas coisas lindas que já eram expostas, mesmo que o festival fosse apenas no dia seguinte. Retornei, observando que havia um palco no centro da praça principal, onde alguns músicos afinavam seus instrumentos. Vi algumas dançarinas de dança do ventre com o canto dos olhos também, e engoli em seco, dando meia volta e retornando para as barraquinhas de alimentos. Em um canto bem iluminado e posicionado, lá estava a fachada da Doceria Mori. Senti meu coração pular de emoção, apenas em ver que eu também participaria de toda aquele evento gigantesco, fazendo o que eu mais amava.

Areia e Açúcar  • gaaraOnde histórias criam vida. Descubra agora