Aquarela

751 71 40
                                    

Chuya

Meus olhos não ficavam tão inchados a tempos. Sentada ao lado do leito em que minha mãe repousava, segurei a sua mão, a beijando. Em todos aqueles meses, era a primeira vez em que eu estava no Hospital da Vila da Areia e desejava do fundo do meu coração nunca mais precisar retornar. Visivelmente abatida, minha mãe ensaiou um sorriso para me tranquilizar, o que era inútil diante de todos aqueles fios e acessos venosos conectados nela.

Aconteceu um pouco depois que eu cheguei da Residência do Kazekage. Ela estava feliz, lavando as louças, enquanto eu contava em detalhes todo o meu segundo dia de negociação com o ruivo, quando, de repente, ela caiu. Os olhos fechados e cerrados, as mãos sem responder aos comandos e o corpo tremulo, no azulejo de nossa cozinha. Desesperada, protegi sua cabeça e gritei, alto, e um vizinho veio rapidamente nos ajudar. Ele nos direcionou ao hospital, e ali estávamos, muitas horas depois. Ela estava acordada e bem, entretanto, de acordo com o médico do plantão, teria que ficar até a manhã seguinte em observação e para realizar alguns exames.

— Deveria avisar a Ume. — Ela aconselhou, a voz rouca e tremula. Observei seu rosto pálido e senti ainda mais preocupação. — Assim, amanhã, ela poderá ficar comigo pela manhã, enquanto você descansa.

— Não sairei ao seu lado por nenhum minuto, mãe. — Falei, a voz embargando de preocupação.

— Você e essa sua mania de querer fazer tudo sozinha. É melhor que vá, assim, Ume também fica ciente do que aconteceu. O bar não fica nem cinco minutos daqui. — E então, olhando para o relógio de parede do quarto, que marcava uma e meia da manhã, suspirou. — A essa hora ela já se apresentou e está apenas servindo mesas. Ela sempre está nos primeiros grupos, pois ninguém consegue dançar de forma tão exaustiva e ainda servir mesas depois com tanta habilidade. — Disse, orgulhosa.

— Nem mesmo doente a senhora para de puxar o saco da Ume. — Reclamei, enciumada. — E se a senhora passar mal?

— Estou em um hospital, Chuya.— Constatou, olhando para os acessos em seu braço.— Nada de ruim irá me acontecer. Se apresse e vá avisar sua prima, assim ficarei mais tranquila.

— Certo. — Me levantei, e, olhando ao redor, percebi que a equipe médica estava atenta a todos os pacientes. Não faria mal sair por alguns minutos.

Era muito esquisito estar caminhando pela madrugada sozinha por as ruas da Vila da Areia. A noite estava bela, com estrelas lindas e nenhuma nuvem no céu, como era de praxe no deserto. Senti meus olhos marejarem e a tensão me invadir. Eu estava morrendo de medo do que poderia acontecer com minha mãe, e ter que lidar com tudo aquilo sozinha com uma falsa postura de forte havia sido péssimo. Tudo estava silencioso e calmo, e se ninguém avisasse, eu jamais saberia que a alguns metros dali havia um bar tão movimentado como o que Ume trabalhava.

E então, lá estava eu. De pé em frente ao bar que minha prima trabalhava. De fora, ainda era possível ouvir alguns ruídos, mas nada que incomodasse a vizinhança.

— Não acredito que estou fazendo isso. — Murmurei para mim mesma, antes de atravessar as portas, dar um sorriso sem graça para o segurança, que me encarou de cima a baixo e descer as escadas para o subsolo, onde se localizava o bar.

Ao finalmente entrar, meus olhos se arregalaram de surpresa. O lugar era um verdadeiro oásis de mistério. No ar, um aroma de incenso e especiarias, que me obrigou a segurar um espirro. A decoração era envolvente. Tecidos de todas as cores adornavam as paredes, criando padrões hipnóticos e sensuais. Cadeiras e mesas estavam espalhadas por todo o salão, e o público, era, por sua maioria, masculino e de bandanas. Engoli em seco.

Areia e Açúcar  • gaaraOnde histórias criam vida. Descubra agora