O discurso entre a lei e as virtudes

16 1 0
                                    

No ano de 100 antes de Cristo, numa cidade do glorioso Império Romano, um homem andava nas margens do rio Tibre. Seu nome era Astarco, um homem que antes fora nobre, rico e possuidor de muitas terras, mas que havia perdido tudo e agora vivia como mendigo. Astarco perambulava pela cidade buscando transmitir ensinamentos de filosofia e autoconhecimento.

Numa manhã de primavera, ele avistou um grupo de jovens que estavam filosofando e debatendo. O idoso homem decidiu sentar-se ao lado deles e ficou admirando o horizonte. Quando se acostumaram com a sua presença, ele falou:

- Bom dia, alguém poderia me dizer o que vocês estão discutindo? Ele pegou uma fruta de sua bolsa e a comeu com vontade, encarando o grupo. O mais velho deles, chamado Plínio, um estudante de direito, respondeu:

- Estamos aqui para fazer história, estamos discutindo sobre as virtudes e como elas são inferiores às leis. Astarco então olhou para o jovem e respondeu:

- Oh grande sábio, de fato as virtudes podem ser pequenas em comparação às leis. Então, se um mau juiz cria leis fúteis, em quem estaria a falha? Ele olhou para os jovens e percebeu que eles estavam intrigados, conseguindo assim a atenção de todos. E continuou:

- Digamos que as leis são como uma taça. Se eu a der nas mãos de um ignorante, ela será usada de acordo com a vontade do portador. Talvez ele a use para comer cevada, ou então para plantar uma flor. Nesse momento, o jovem mais novo abordou o velho e disse:

- Então, a mesma lei poderia ser interpretada de diferentes maneiras, de acordo com as habilidades. Mas onde residem as virtudes? O velho então pegou um copo e pediu vinho, sendo prontamente servido por um dos jovens. Em seguida, ele respondeu:

- Meu caro sábio, essa pergunta é ordinária, mas o que seria da vida sem questões como essa?

- Eu lhes digo: será que um homem sem ética, com uma moral questionável, seria capaz de julgar um inocente? Plínio respondeu, de maneira desdenhosa:

- Sim, ele seria capaz. Pois sua ética não tem valor diante das leis. E, além disso, nós, nobres e sábios, não merecemos tratamento igual, uma vez que estamos acima dos demais. Aristarco pediu pão e bebeu novamente, em seguida, sorriu e disse:

- Sua sabedoria é inigualável, de fato a nobreza é extrema, e abaixo dela existem poucos serviçais. Eu digo a vocês, se a ética não tem relação com as leis e a justiça, então por que existem tantos pobres em Roma? Plínio, sendo nobre, não conseguiu responder. Foi o jovem mais novo quem disse:

- Isso ocorre porque não há trabalho e o governo nada faz. Muitos são servos e não têm direitos como cidadãos. Enquanto os nobres festejam, os pobres tentam sobreviver como podem. Astarco sorriu e retrucou:

- Observem a criação das leis. São homens sábios no poder, mas há poucos pobres e muitos ricos, não é verdade!? Todos ficaram constrangidos e envergonhados, exceto Plínio, que ainda não conseguia compreender. Na verdade, ele estava cego diante da falta de virtudes.

O mais jovem então discursou, sentindo a dor no peito diante de tais verdades. Ele disse:

- Senhor andarilho, meu nome é Vero Maximus, e eu não concordo com isso. Um homem só pode ser medido pela sua ética. Um senador que faz leis para o seu próprio benefício ou que não tem consideração pelo povo esqueceu o seu propósito. Astarco então sorriu e disse:

- Mas a lei é justa! - Diga-me, há algum problema em roubar do meu povo, afinal, eu descobri uma interpretação da lei que me permite fazer isso. Estou apenas sendo justo! Vero simplesmente não queria acreditar nas palavras do velho mendigo e respondeu:

- Então, como poderei me considerar justo se falto comigo mesmo? Como posso seguir o caminho dos justos se me torno um viciado em trair o povo e caminhar pela via da hipocrisia?

Aristarco olhou para a sua plateia, os jovens que antes estavam fazendo história agora estavam curiosos para ouvir o que o velho tinha a dizer, inclusive Plínio, que começava a sentir vergonha pelas suas atitudes.

O homem terminou de encher seu odre com vinho e então respondeu:

- Vero está certo, ele me pegou. Um homem justo e dotado de virtudes e valores com certeza será um bom líder. As leis por si só não regulam o estado, pois são apenas uma ferramenta do governo. Se o governo não possui ética, ele não governará para o povo como um todo. Senhores, digam-me, um homem justo e cheio de valores não é um exemplo a ser seguido?

Todos os jovens concordaram. Afinal, um homem justo facilmente se torna um ícone, um modelo a ser seguido, pensou Vero, que esperava pela resposta de Astarco. O velho filósofo então completou:

- Senhores, um bom governante é aquele cujas virtudes e valores servem de exemplo. As leis criadas pelos sábios e valorosos de espírito não são para satisfazer o ego, mas sim para cultivar a justiça. O sábio compreende que tudo neste mundo é cíclico e, portanto, sabe que ao seguir as virtudes, as pessoas também as seguirão. E se as pessoas seguirem esse caminho, todas as ações retornam ao sábio de alguma forma. O velho mendigo levantou-se, limpou a sua barba e concluiu dizendo:

- Se vocês querem fazer história, então usem a cabeça. Vocês têm a obrigação de construir a si mesmos, dominar as virtudes e os valores de modo que eles sirvam de exemplo. Dessa forma, chegarão onde poucos chegam. Eu lhes digo: usem a razão. Bem, agora devo partir. Boa sorte! Astarco saiu caminhando e os jovens ficaram paralisados, começando a refletir sobre o que haviam aprendido. Até mesmo Plínio começava a sentir vergonha por suas ações.

Os discursos de Astarco Onde histórias criam vida. Descubra agora