Foi um começo de relação bem diferente do que ela idealizava, baseado, claro, apenas no que ela tinha vivido com o ex-marido...
Cadu era ótima companhia. Gostavam de fazer os mesmos programas, mas também continuaram a fazer atividades separados. Ela, saindo para o teatro ou um barzinho com as amigas. Ele, jogando futevôlei na praia e tomando chopp com a turma dele. E tudo seguia de forma gostosa, sem pressão.
Laura percebia o desejo que rolava entre eles, mas Cadu agia como se estivesse "fazendo a corte", devagar, se conhecendo. Ela, por seu lado, achava fofo o cuidado dele, mas já estava planejando um programinha mais ousado, para dar um empurrãozinho e partirem pros finalmente.
Mas foi no sexto encontro com Cadu que a coisa toda melou. E por uma divergência de opiniões, que, para Laura, dizia muito do caráter dele.
Estavam passeando pela praia, o lugar preferido dos dois. O meio do mês de agosto já estava mais quente e convidava para uma caminhada. Iam devagar, apreciando a companhia um do outro. Rita Lee ia na guia frouxa, correndo para o mar e voltando quando uma onda chegava perto dela.
Laura estava contando para ele sobre seus filhos, dando mais detalhes sobre cada um. Contou ainda sobre o encontro que tiveram no ano passado com o pai, em um restaurante, para revelar ao ex-marido a orientação sexual de André.
- Eu achei que Flávio iria ficar chocado mas, como bem disse o namorado do meu filho, "os pais sempre sabem". Flávio tentou esconder uma certa decepção no olhar, mas pelo menos não rejeitou o filho. Os irmãos e eu estarmos juntos acho que o fez ver como a família é mais importante do que qualquer preconceito.
Cadu parou e retrucou:
- Acho que não deve ter sido assim tão tranquilo para o seu ex, não... ele pode ter fingido, talvez porque vocês estivessem em um restaurante.
- Não, Cadu, ele aceitou. Passou até o final do ano com eles. O Flávio é conservador em muitos aspectos, mas é um homem inteligente. E ama muito os filhos. Ele sabe que, se rejeitasse um filho, ia sofrer a rejeição dos outros. E, no final das contas, ele próprio iria sofrer muito. E, vamos combinar, qual é o problema ter um filho gay?
- Eu acho que ele pode até ter aceitado da boca pra fora, Laura. Mas, de boa, não foi, não. É muito difícil para um pai aceitar um filho assim.
Ela o olhou, franzindo o cenho:
- Como assim?
- Puxa, nem sei por onde começar... mas, vamos lá! Além da vergonha que um pai pode sentir ao saber que tem um filho gay, vem a preocupação. Ele pode sofrer violência? Pode. Ele pode perder o emprego por causa disso? Pode. Ele pode pegar uma doença e morrer? Pode!
Ela sacudiu a cabeça, sem acreditar no que estava ouvindo. Soltou a mão dele e parou de andar, encarando-o. Rita Lee tinha parado de brincar e observava os dois, sentindo a tensão:
- Vergonha?! Vergonha por quê? São pessoas adultas, que não devem nada a ninguém!
- Falar é fácil, né... mas muita gente rejeita esse tipo de vida. Não é... natural!
- Não é natural? Natural de acordo com o quê? Você que dizer... você está falando de religião? Em pleno século 21?!
- Sim, está na bíblia, se você quer saber.
- Ah, Cadu, me poupa! Tem milhares de coisas na bíblia que, se fossemos praticar hoje, não haveria mais espécie humana. Pela madona, cara! Bíblia?!! Fala sério!
Cadu desviou o olhar para o mar. Rita Lee tentou subir no seu colo, mas ele a ignorou. Laura continuou, começando a sentir raiva:
- Não consigo entender como um homem inteligente e com acesso a tanta informação como você pode se basear na bíblia para justificar preconceito. E ainda achar que é vergonhoso ter um filho porque ele é homossexual?
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Quase 50tona
ChickLitLaura estava livre.... Depois de 27 anos de casamento, depois de três filhos, depois de 49 anos de vida, depois de quase 30 anos de trabalho como professora de Inglês - é muito número..., ela estava livre para fazer o que quisesse. Sem amarras nem o...