Cap 2 - E Agora?

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Agora é correr pro abraço? Gíria de futebol totalmente aleatória e que em nada colaborava com esse momento e, muito menos, servia de resposta.

Não havia nenhum abraço à sua espera... Não havia ninguém ali para lhe responder...

Os filhos estavam trabalhando, e acompanharam tudo no cartório pelo whatsapp. Mais tarde, à noite, eles virão para ver como Laura estava. Ela fará um lanche com os sanduíches preferidos de cada um.

Flávio seguiu para a casa da mãe, onde estava morando há algumas semanas, enquanto não alugava algo pra ele. Ela suspeitava de que esse momento demoraria a chegar, já que, para ambos, esse arranjo parecia estar funcionando. Depois de alguns anos da morte do marido, sua ex-sogra, Amélia, tinha de novo com quem conversar e de quem cuidar; e ele tinha quem lhe fizesse a comida, lhe arrumasse as roupas e, claro, lhe disponibilizasse uma TV para chamar de sua...

Seus próprios pais voltaram a morar em Goiânia. Depois de uma vida inteira vivendo no Rio, resolveram ir para uma cidade menor e menos estressante há cinco anos. Laura tinha lamentado a ida do pai e celebrado a ida da mãe, com quem tinha um relacionamento difícil e conturbado. Se lembrou do telefonema que deu para anunciar o divórcio. De como seu pai ficou triste, mas a apoiou amorosamente. E de como sua mãe só faltou xingá-la e culpá-la pelo fim do casamento, sem um pingo de empatia e compaixão por ela. Foram vários minutos de condenações e conselhos, tipo: e se você fizer assim, se você agir assado, vai conseguir seu marido de volta. Ela simplesmente não ouvia. Não compreendia que era Laura quem estava querendo se separar. Que já tinha tentado de tudo para "salvar" a relação. E, principalmente, que o amor havia acabado.

- Amor?! Você é uma mulher de 50 anos! Amor para quê, minha filha? O importante é o companheirismo e a segurança financeira... – Laura lamentou pelo seu pai, ali ao lado, ouvindo esse tipo de coisa. Não, definitivamente, não queria ter essa vida junto a Flávio.

E, claro, tinha a sua irmã, Márcia. Ela se dava bem com a irmã mais velha quando estavam longe da mãe. Mas, em qualquer festa familiar na qual estivessem as três juntas, dava algum revertério na energia, na química do ambiente, e elas se tratavam com animosidade. Laura também investigou isso na terapia, e pode tomar consciência de como Márcia era muito parecida com a mãe, e de como a relação entre elas, mãe e filha, baseada em bajulação, a fazia mal. Ela nunca tinha sentido qualquer afinidade com sua mãe. Desde pequena, se sentia diferente e distante. Sua mãe parecia ter olhos apenas para a irmã. Uma vez, chegou a ouvir uma conversa entre a mãe e a tia, na qual Rosana dizia que não queria ter engravidado uma segunda vez... e aquilo a marcou para sempre. Foi como se seu coraçãozinho de criança tivesse afundado num barril de gelo. E cresceu sob essa impressão. Ela sempre se sentia sobrando nos natais e aniversários, não conseguia puxar o saco nem coisa parecida. Era adepta da filosofia de que, se não há nada de bom para falar para a pessoa, preferia ficar calada. E calada passava as celebrações. Felizmente, como tinha três crianças para correr atrás, usava os filhos como desculpa para sempre se colocar longe das conversas desinteressantes que rolavam entre elas.

Com seu pai, a relação era totalmente diferente. Ela se via muito no pai, no espírito aventureiro dele. Vivia recordando dos passeios que dava com ele. Felizmente, o Rio de Janeiro era uma cidade com muitas opções de lazer ao ar livre. E foi pela mão do pai que ela conheceu a praia da Macumba, o Jardim Botânico, o Jardim Zoológico, a Floresta da Tijuca... na floresta, foi milhares de vezes, cada uma seguindo por um caminho diferente. A irmã, Márcia, tinha ido algumas vezes, mas sempre reclamava de cansaço, dos mosquitos, do calor, e o pai passou então e ir somente com ela. E foram momentos deliciosos e inesquecíveis. Laura achava que essas experiências é que incutiram nela essa vontade por viagens e aventuras. Que nunca conseguiu realizar depois de adulta, nem solteira e nem casada... Foi na terapia que Laura também se deu conta de que a mãe poderia sentir ciúmes da relação dela com seu pai, uma cumplicidade que ela jamais teve com o marido. E, apesar dos pesares, os dois eram companheiros, e conseguiram construir uma relação que, aparentemente, estava boa pros dois. Quem era ela para condenar?

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