Cap 24 - Invadiu e fim

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O jantar aconteceu como Laura planejou, afinal. Ganhou elogios pelo macarrão, pela mousse de chocolate e por ter metido o seu bedelho naquela história.

Ela e o filho também ficaram emocionados e André pensou na sorte que tinha por ter uma mãe tão incrível. Eles viam Gabriel e o pai brincarem e zoarem um com o outro, como faziam antigamente. Toda hora, os homens brindavam por Laura, e ela espalhava sorrisos e beijinhos para todos.

Foi uma noite memorável. A energia estava eletrizante. Ela percebia Cadu olhando-a, em silêncio. E ela se sentia única por causa disso. E só pensava em como iria se despedir dele, dali a pouco... "Será que a gente vai conseguir conversar, se acertar? Tou quase rezando para esse tal de Deus me ajudar agora!"

Os filhos saíram bem tarde. Cadu e Gabriel combinando de se verem, de o pai ir conhecer a casa do filho levando Rita Lee, é claro. Laura abraçou os dois rapazes. Gabriel agradeceu de novo, baixinho, em seu ouvido:

- Obrigado, Laura, por trazer meu pai de volta pra mim... E não desiste dele, não... ele é muito a fim de você ainda, tá na cara... – Laura ficou roxa de vergonha e não respondeu.

Depois que fechou a porta, ficou meio sem tem o que fazer ou dizer. Felizmente, Cadu já tinha apanhado as xícaras de café na mesa de centro e levado para a cozinha. E começou a lavá-las junto com o resto da louça. Ela respirou fundo e foi atrás.

- Deixa isso aí, Cadu, que eu lavo.

- É o mínimo que eu posso fazer, depois de uma noite como a de hoje.

Trabalharam num silêncio confortável, a música suave na sala embalando os dois. Ele ia lavando e ela ia secando e guardando tudo. Logo, acabaram. Ela enxugou as mãos e deu o pano de prato para ele fazer o mesmo. Nada mais a ser feito, voltaram para a sala. Ficaram em pé até que ela convidou:

- Quer ficar mais um pouco? Posso servir um licor... a gente pode terminar a nossa conversa.

- Você acha que precisa? Depois do que rolou aqui esta noite?

- É que... eu queria saber o que aconteceu com você e seu filho. Senta - ela sentou-se no sofá, ele ao seu lado.

- As suas palavras entraram nessa cabeça-dura aqui. Ou melhor, aqui – e apontou para o próprio peito - Eu olhava o meu filho e me orgulhava de como ele estava. No final das contas, o que importa mesmo é o amor... não é?

- É isso aí...

- Eu sei que vou ter que... rever alguns conceitos, não é assim que você disse? Pra melhorar minha relação com ele... e pra normalizar em mim essa vida que ele leva hoje.

- Uma vida que ele escolheu viver, ao lado do meu filho.

- Sim.

- Teve um momento na nossa conversa que você desistiu de dizer algo. O que foi?

- Nada, outra besteira minha. E ainda bem que eu não disse.

- Pode dizer, pois acho que até já sei o que era...

- Eu ia culpar seu filho. Ia dizer que foi ele que transformou meu filho num gay.

- Isso, era isso o que achei que você iria dizer. E ainda bem mesmo que você se tocou do absurdo ridículo desse pensamento.

- Sim. Absurdo e ridículo. Como pode, né?

- Como pode o quê?

- Eu ser tão absurdo e ridículo e você ainda gostar de mim?

- Era o que eu me perguntava sempre, todos esses dias que ficamos longe.

- E, mesmo assim, você quis me ajudar. – ele se aproximou um pouco.

- É... tou batalhando um lugar no paraíso...

- Você, a Senhora Agnóstica? Acreditando no paraíso? – ele se aproximou mais um pouco.

- Pra você ver... e a culpa é toda sua...

- Minha? Por quê? – e chegou bem perto, os narizes quase se encostando.

- Porque você fez da minha vidinha um inferno, desde aquela nossa briga horrível na praia...

- Puxa, me desculpe por isso... como eu posso me redimir?

- Adivinha... – e ele a beijou. Primeiro, de forma suave. Era como se estivessem matando as saudades. Dali a pouco, ele a abraçou e a puxou, deitando-a no sofá. Ela correspondeu ao abraço, sentindo uma urgência e um desejo que doía seu ventre. Beijaram-se com muita vontade um do outro, Laura mal cabendo em si de tanta felicidade. Estavam ali, juntos, eram de novo um do outro. E ele a queria tanto quanto ela. Mas, de repente, Cadu parou e disse:

- Desculpe, Laura, eu não tinha planejado nada disso... Não esperava... As coisas estão indo muito depressa?

- Depressa? Eu sonho com esse momento desde aquele maldito dia na praia... – ele sorriu, feliz. – Vamos pro quarto... – Ele se levantou e ajudou-a.

Ela o levou para o quarto. Não estava nervosa nem ansiosa. Sentia que era o certo. Ele era O cara. Aquele com quem sonhara, aquele que iria realizar junto com ela todos os planos e sonhos mais loucos. Laura finalmente se sentia completa. Faria 50 anos dali a alguns dias. Depois de 27 anos casada, depois de três filhos, depois de quase 30 anos de trabalho, depois de três namoros na juventude e de meia dúzia de decepções mais recentemente – ah, os números... – ela agora estava aonde queria estar.

Na matemática da sua vida, um mais um, definitivamente, será sempre mais que dois.


                                                                                                 FIM

Quase 50tonaOnde histórias criam vida. Descubra agora