O jantar aconteceu como Laura planejou, afinal. Ganhou elogios pelo macarrão, pela mousse de chocolate e por ter metido o seu bedelho naquela história.
Ela e o filho também ficaram emocionados e André pensou na sorte que tinha por ter uma mãe tão incrível. Eles viam Gabriel e o pai brincarem e zoarem um com o outro, como faziam antigamente. Toda hora, os homens brindavam por Laura, e ela espalhava sorrisos e beijinhos para todos.
Foi uma noite memorável. A energia estava eletrizante. Ela percebia Cadu olhando-a, em silêncio. E ela se sentia única por causa disso. E só pensava em como iria se despedir dele, dali a pouco... "Será que a gente vai conseguir conversar, se acertar? Tou quase rezando para esse tal de Deus me ajudar agora!"
Os filhos saíram bem tarde. Cadu e Gabriel combinando de se verem, de o pai ir conhecer a casa do filho levando Rita Lee, é claro. Laura abraçou os dois rapazes. Gabriel agradeceu de novo, baixinho, em seu ouvido:
- Obrigado, Laura, por trazer meu pai de volta pra mim... E não desiste dele, não... ele é muito a fim de você ainda, tá na cara... – Laura ficou roxa de vergonha e não respondeu.
Depois que fechou a porta, ficou meio sem tem o que fazer ou dizer. Felizmente, Cadu já tinha apanhado as xícaras de café na mesa de centro e levado para a cozinha. E começou a lavá-las junto com o resto da louça. Ela respirou fundo e foi atrás.
- Deixa isso aí, Cadu, que eu lavo.
- É o mínimo que eu posso fazer, depois de uma noite como a de hoje.
Trabalharam num silêncio confortável, a música suave na sala embalando os dois. Ele ia lavando e ela ia secando e guardando tudo. Logo, acabaram. Ela enxugou as mãos e deu o pano de prato para ele fazer o mesmo. Nada mais a ser feito, voltaram para a sala. Ficaram em pé até que ela convidou:
- Quer ficar mais um pouco? Posso servir um licor... a gente pode terminar a nossa conversa.
- Você acha que precisa? Depois do que rolou aqui esta noite?
- É que... eu queria saber o que aconteceu com você e seu filho. Senta - ela sentou-se no sofá, ele ao seu lado.
- As suas palavras entraram nessa cabeça-dura aqui. Ou melhor, aqui – e apontou para o próprio peito - Eu olhava o meu filho e me orgulhava de como ele estava. No final das contas, o que importa mesmo é o amor... não é?
- É isso aí...
- Eu sei que vou ter que... rever alguns conceitos, não é assim que você disse? Pra melhorar minha relação com ele... e pra normalizar em mim essa vida que ele leva hoje.
- Uma vida que ele escolheu viver, ao lado do meu filho.
- Sim.
- Teve um momento na nossa conversa que você desistiu de dizer algo. O que foi?
- Nada, outra besteira minha. E ainda bem que eu não disse.
- Pode dizer, pois acho que até já sei o que era...
- Eu ia culpar seu filho. Ia dizer que foi ele que transformou meu filho num gay.
- Isso, era isso o que achei que você iria dizer. E ainda bem mesmo que você se tocou do absurdo ridículo desse pensamento.
- Sim. Absurdo e ridículo. Como pode, né?
- Como pode o quê?
- Eu ser tão absurdo e ridículo e você ainda gostar de mim?
- Era o que eu me perguntava sempre, todos esses dias que ficamos longe.
- E, mesmo assim, você quis me ajudar. – ele se aproximou um pouco.
- É... tou batalhando um lugar no paraíso...
- Você, a Senhora Agnóstica? Acreditando no paraíso? – ele se aproximou mais um pouco.
- Pra você ver... e a culpa é toda sua...
- Minha? Por quê? – e chegou bem perto, os narizes quase se encostando.
- Porque você fez da minha vidinha um inferno, desde aquela nossa briga horrível na praia...
- Puxa, me desculpe por isso... como eu posso me redimir?
- Adivinha... – e ele a beijou. Primeiro, de forma suave. Era como se estivessem matando as saudades. Dali a pouco, ele a abraçou e a puxou, deitando-a no sofá. Ela correspondeu ao abraço, sentindo uma urgência e um desejo que doía seu ventre. Beijaram-se com muita vontade um do outro, Laura mal cabendo em si de tanta felicidade. Estavam ali, juntos, eram de novo um do outro. E ele a queria tanto quanto ela. Mas, de repente, Cadu parou e disse:
- Desculpe, Laura, eu não tinha planejado nada disso... Não esperava... As coisas estão indo muito depressa?
- Depressa? Eu sonho com esse momento desde aquele maldito dia na praia... – ele sorriu, feliz. – Vamos pro quarto... – Ele se levantou e ajudou-a.
Ela o levou para o quarto. Não estava nervosa nem ansiosa. Sentia que era o certo. Ele era O cara. Aquele com quem sonhara, aquele que iria realizar junto com ela todos os planos e sonhos mais loucos. Laura finalmente se sentia completa. Faria 50 anos dali a alguns dias. Depois de 27 anos casada, depois de três filhos, depois de quase 30 anos de trabalho, depois de três namoros na juventude e de meia dúzia de decepções mais recentemente – ah, os números... – ela agora estava aonde queria estar.
Na matemática da sua vida, um mais um, definitivamente, será sempre mais que dois.
FIM
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Quase 50tona
ChickLitLaura estava livre.... Depois de 27 anos de casamento, depois de três filhos, depois de 49 anos de vida, depois de quase 30 anos de trabalho como professora de Inglês - é muito número..., ela estava livre para fazer o que quisesse. Sem amarras nem o...