Ela o sentia por todos os lados. Não estava enjaulada como ele, mas os dias e noites sob o comando do líder não eram tão diferentes. Ela era um pássaro exótico, preso em uma gaiola.
Quando havia um baile, uma comemoração dos filhos, ele a libertava para que os encantasse.
Depois, só lhe restava retornar a sua vida solitária.
Os filhos da dor não se dirigiam a ela.
Os filhos da morte a temiam.
Mas havia outro prisioneiro dentro do cárcere úmido em que viviam.
Assim como Luc, sua energia era intensa, dominadora.
Porém, ao contrário da energia do líder, que a sufocava, quente e vigorosa, esta era fria, sorrateira, difusa.
Ela demorara anos para entender que conseguia pressentir a presença de algumas pessoas. Especiais. Como ela. Não compreendia os motivos, mas a busca por um semelhante a atraía, apesar do arrepio que sempre sentia quando a presença do prisioneiro se manifestava.
Na maior parte dos dias, ela não o sentia. Ele não era uma ameaça constante como o líder. Mas, no cair da noite, quando o sono a tomava, era ele quem a despertava. Em meio aos sonhos de fogo em um palácio esquecido, rastejava algo viscoso, gelado, pútrido. Ela acordava com um grito e a certeza de que ele estivera por perto, observando-a. Sempre que isso acontecia, ela via a menina ao seu lado, já desperta, os olhos aterrorizados e os lábios trêmulos. Mas, como nesta noite, ela se recusava a contar o que sabia.
— Quem esteve aqui?
— Por favor...
— Me conte!
— Eu não vi nada – a menina tampou os olhos, encolhendo-se nas cobertas.
— Mentirosa! – Ela jogou os próprios cobertores para trás, pulando da cama. Ainda sentia a presença e sabia que, se conseguisse se concentrar, o encontraria.
Deu passos incertos para fora do quarto, ouvindo apenas o sussurro da menina antes de se afastar: — Não estou mentindo. Não é algo para ser visto.
Ela a ignorou e percorreu o corredor escuro. A brisa que passava pelos arcos era fresca. O chão, como de costume, ainda reunia os cacos da última festa dos filhos. Ela tentou evitá-los, enquanto apertava a camisola preta contra o corpo. A cauda era longa e se arrastava no chão molhado. Ela segurou a barra, tentando não estragar mais uma roupa. Sabia que o líder a queria sempre impecável e insistia em ornamentá-la como se fosse algo a ser exibido.
Era o meio da madrugada. O caminho estava silencioso. Ela percorreu os corredores instintivamente, como se seus pés já soubessem exatamente onde encontrá-lo.
A energia a guiava como se a pegasse pela mão. Era tão densa que parecia palpável, na forma de dedos longos pressionando seu pulso.
Ela a seguiu até uma porta pesada e escura, na ala mais erma do Palácio dos Afogados. Era onde, no passado, ficavam os quartos dos servos e dos guardas. As barras de ferro indicavam que, não muito depois, os quartos se tornavam celas. Ela passou pelas celas abandonadas, com hesitação.
O que teria que fazer para que o líder se cansasse dela e decidisse enfiá-la em uma dessas celas?
As grades enferrujadas cederam à pressão do tempo se transformando em barras esburacadas. Ao final de um túnel que, no passado, era o lar dos encarcerados, havia uma porta.
A porta não era comum, com apenas uma fechadura. Dezenas de ferrolhos, trancas de aço e até uma barra estavam à disposição de quem quisesse usá-las, no entanto, elas estavam abertas. A energia pulsava pela porta, tão ameaçadora que desafiava qualquer um que pensasse em abri-la.
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O Portal IV - Fios de Alim
FantasiCinco anos se passaram desde que a terra se abriu e, no lugar da Torre do Arzhel, não sobrou nada além de cinzas e uma fenda de morte, o Abismo da Rani. Noa Rariff é Raj e Kral, dois soberanos em um, mas isso não é suficiente para conter a instabili...