V 5.8 Filha de Amadum

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Braços fortes a envolveram, roubando-a da correnteza. Ela se viu desnorteada, confusa, diante do trono da própria família. A estátua de Amadum brilhava à sua frente, mas havia um impostor no lugar que, antes, ela se lembrava como um jardim florido e alegre, onde o pai reinava na sua infância.

Porém, Amadum já tinha vingado a sua família.

O usurpador estava morto.

– Bryanna, você está bem? – ela ouviu a preocupação na voz de Damien, sentiu as mãos firmes que seguravam seus ombros, mas ela não conseguiu desviar o olhar do trono. Nem mesmo para mirar aquele que a salvara, que a protegera da fúria do seu próprio lar.

Aquele momento não era sobre Damien, nem sobre os sentimentos novos e confusos que ele despertava nela.

Era sobre ela, Bryanna Yahia, a última de seu clã.

Era sobre ela, uma rani perdida que, finalmente, regressava para casa.

Rani, não.

Uma rana.

Não havia ninguém à sua frente.

Ninguém no seu caminho.

O trono de Amadum, com seu brilho de ônix a enfeitiçava. Seus olhos pareciam grudados naquele assento que, finalmente ela entendia, sempre fora seu lugar.

Pouco importava que estivesse rodeada de água pútrida.

Pouco importava que corpos inertes boiassem ao seu redor.

Ela se desvencilhou das mãos de Damien, firmando as pernas trêmulas, obrigando-as a andar para frente.

Passo a passo, subiu os degraus até o trono de Amadum.

A armadura encharcada fazia com que ela se sentisse pesada, como se cada passo fosse tão decisivo e estrondoso quanto o barulho que seus pés faziam contra a pedra molhada.

O silêncio da morte era interrompido apenas pelos lamentos, soluços distantes, que ela não identificava.

Não havia espaço para pesar no seu coração.

Ela estava em casa.

O corpo de Luc, pálido e frio, era o único obstáculo entre ela e o trono, porém, assim que ela o puxou pelas vestes, fazendo que tombasse no chão, as asas de Amadum, revestidas de ágatha escura e pétrea, tremeram. Ela recuou, achando que o trono ia desmoronar, assim como o restante daquele Palácio assombrado, porém, para sua completa surpresa, as asas se moveram para dentro, fechando-se como se fossem feitas de carne e penas e não pedra imutável.

O Palácio a rejeitava, Bryanna compreendeu.

Sua própria casa a desprezava.

As palavras do velho ghaya arderam mais uma vez no seu estômago, fazendo suas bochechas ruborizarem.

Negligência e covardia, era isso que ela tinha oferecido nos últimos anos.

Ressentimento, era isso que o Palácio sentia em relação a ela.

A vergonha a inundou e ela recuou vários passos, sendo amparada por Damien, quando quase tropeçou no primeiro dos degraus.

– Não sou bem-vinda – ela sussurrou. – O trono não se fechou para Luc, porém para mim...

– Essa é a sua casa – determinou Damien. – Só você pode decidir quem é bem-vindo ou não.

Ela se virou para tentar compreender aquelas palavras, porém a atenção de Damien não estava nela, apesar da mão que a impedia de cair.

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