Chapter one

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O começo

   Eu não queria ir e também não via muita necessidade nisso. Por que ir se já fiz tudo o que tinha que fazer? Dei Feliz Natal para papai quando tomamos café da manhã e trocamos presentes que combinamos de deixar sob a pequena árvore-de-natal no canto da sala de estar para abrirmos juntos e depois liguei para meus avós, que ficaram contentes com a ligação logo de manhã da neta deles, desejando um feliz Natal. Pensei que, ligando assim, de manhã, e desejando minhas felicidades, eles me deixariam livre.

   Liguei para meus amigos e conversei com eles por uns 10 minutos, depois tomei banho e agora estou aqui, no meu quarto, enrolada em cobertores pesados, observando a neve invadir meu quarto pela pequena fresta aberta da janela enquanto faço carinho em meu gato.

   — Ainda não entendi a necessidade de irmos. Podemos só fingir que esse jantar não existe e pedir pizza, como nos outros anos — respondo para o homem que estava ao meu lado.

   — Exatamente. Anos. Seus avós devem estar com saudades de passar o Natal com você — sua voz sai baixa e calma, talvez até um pouco cansada.

   — Mas já passamos a Páscoa com eles. Temos mesmo que ir? 

   Sinto o colchão ao meu lado afundar e, logo em seguida, um suspiro cansado.

   — Sinto muito, Violet, mas temos. Eles me ligaram e sua avó praticamente me ameaçou — desvio o olhar da janela e encaro seu rosto, ele também não quer ir — Se formos, eu aumento sua mesada — diz por fim.

   — Sabe que isso é chantagem, não sabe?

   Me sento e olho para as paredes azuis pastéis do quarto, evitando olhar papai. Continuo a fingir que as paredes azuis são mais interessantes que papai até ele pigarrear.

   — E você não vai mais estar de castigo — sua voz sai baixa, quase em um sussurro, mas consigo escutá-lo perfeitamente.

   — Tudo bem — encaro ele — Podemos ir, se for mesmo me tirar do castigo e aumentar a mesada.

   Ele concorda e sai do quarto, provavelmente indo para o seu escritório.  Mida mia e me encara, me odiando nesse exato momento por acordá-lo. Volto a deitar, descanso minha mão em seus pelos, fazendo um carinho leve e lentamente vou deixando a inconsciência me domar.

   Já estava quase na hora de irmos e nunca me arrependi tanto de uma decisão em toda minha vida. Eu já havia pedido com educação, chorado, implorado, chantageado e chorado mais um pouco, até me autocoloquei de castigo, mas nada funcionou. Papai não queria me deixar ficar em casa. 

   Coloquei os saltos que vovó me deu no mês passado, quando fui visitá-la, e o colar que vovô me deu de presente de aniversário no ano passado. Quando passei por papai na sala, fiz uma cara triste, mas ao invés de dizer que eu poderia ficar em casa, ele elogiou meu bom gosto para roupas.

   Estávamos na metade do caminho quando papai parou a música que tocava no rádio, mas antes que eu pudesse protestar, sua voz inunda o carro.

   — Lorelai estará lá — diz, pondo um fim naquele silêncio confortável.

   — Qual das duas? 

   — As duas.

   Me mexo no banco e puxo uma mexa solta do meu cabelo, começando a brincar com ela entre meus dedos. Olho para o reflexo de papai no vidro do carro. Ele estava com os olhos vidrados na estrada. 

   — Tudo bem, se não quiser ir, consigo socializar sozinha.

   Papai fica alguns minutos em silêncio, por longos minutos. 

   — Nós dois sabemos que não é verdade. Principalmente com as duas lá — diz por fim.

   O resto do caminho não foi silencioso. Papai me encheu de perguntas sobre a escola e o que eu andava fazendo com meu tempo livre. E eu também fazia algumas perguntas para ele. Não tínhamos muito tempo para conversar em casa, apenas no café da manhã e em alguns jantares, então, sempre que podíamos, estávamos conversando sobre nossas vidas.

   Quando faltava apenas um quarteirão, papai estacionou o carro e me encarou.

   — Já sabe as regras, certo? — perguntou sabendo a resposta, mas mesmo assim anuo — Ótimo. Mas, por segurança, vamos repassá-las.

   Suspiro e inspiro fundo algumas vezes antes de retribuir seu olhar e começar a ditá-las: — Não seja sarcástica. Não seja maldosa. Responda as Lorelais com educação. E, por fim, caso esteja prestes a ter um ataque, peça licença educadamente e vá a um lugar calmo.

   Ele me encara por alguns segundos e depois fecha os olhos, mexendo os lábios como se pensasse profundamente. Quando os abre, me parabeniza e então volta para a estrada e liga o carro, dirigindo até parar na garagem da casa de vovô.

   Quando descemos do carro, arrumo o vestido em meu corpo e me obrigo a seguir os passos de papai até a porta, onde ficamos alguns segundos.

   — É só apertar a campainha — sussurro para ele, que me olha rindo. E então ele aperta a campainha.

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