Capítulo Vinte e Sete

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Minha mão treme enquanto toco a maçaneta. Nunca tive medo de entrar em minha loja, mas também jamais estive em situação tão tensa.

Está tudo escuro quando entro, então prendo a respiração ao acender as luzes. Eu me encaminho lentamente para o escritório, abrindo a porta com cuidado.

Ele não está ali, mas está em todo lugar.

Quando sento à mesa, ligo o celular pela primeira vez desde que fui me deitar ontem à noite.

Eu queria dormir bem, sem ter de me preocupar se Ryle tentava me contatar.

Quando o aparelho liga, tenho vinte e nove mensagens perdidas de meu marido. Por acaso esse é o mesmo número de portas em que Ryle bateu até encontrar meu apartamento no ano anterior.

Não sei se rio ou se choro da ironia.

Passo o resto do dia assim. Olhando por cima do ombro, observando a porta toda vez que ela abre. Será que ele acabou comigo? O medo que sinto nunca vai me abandonar?

Enquanto cuido da papelada, metade do dia se passa sem um único telefonema. Allysa me liga depois do almoço, e, pelo tom de voz, percebo que ela não faz ideia da nossa briga. Eu a deixo falar um pouco sobre a bebê antes de fingir que preciso atender um cliente e desligar.

Pretendo ir embora quando Lucy voltar da pausa do almoço. Ela ainda tem meia hora. Ryle entra pela porta da frente três minutos depois.

Estou sozinha.

Assim que o vejo, fico gélida. Estou em pé atrás do balcão, a mão na caixa registradora porque o grampeador está ali perto. Claro que um grampeador não machucaria muito os braços de um neurocirurgião, mas vou usar o que tiver à mão.

Ele se aproxima lentamente do balcão. É a primeira vez que o vejo desde aquela noite, quando ele ficou em cima de mim em nossa cama. Meu corpo volta imediatamente àquele momento, e sou tomada pelas mesmas emoções intensas que senti naquela hora. Medo e raiva percorrem meu corpo quando ele chega ao balcão.

Ryle ergue a mão e põe um molho de chaves a minha frente no balcão. Meus olhos focam nas chaves.

— Vou para a Inglaterra hoje à noite — avisa ele. — Vou passar três meses fora. Já paguei todas as contas para que você não precise se preocupar com nada enquanto eu estiver fora.

Sua voz está calma, mas as veias em seu pescoço provam que ele está se esforçando ao máximo para mantê-la assim.

— Você precisa de tempo. — Ele engole em seco. — E eu quero que tenha isso. — Ele faz


uma careta e empurra as chaves do apartamento em minha direção. — Volte para casa, Lily. Não vou estar lá. Prometo.

Ele se vira e segue para a porta. Percebo que ele nem tentou se desculpar. Não estou com raiva disso. Entendo. Ele sabe que um pedido de desculpas jamais vai desfazer o que aconteceu. Ele sabe que o melhor para nós, no momento, é ficarmos separados.

Ele sabe que cometeu um grande erro... mas, ainda assim, me sinto impelida a cutucar um pouco mais a ferida.

— Ryle.

Ele olha para mim, e é como se um escudo tivesse se erguido entre nós. Não se vira completamente e fica tenso enquanto espera para ouvir o que tenho a dizer. Ele sabe que minhas palavras vão magoá-lo.

— Sabe qual foi a pior parte disso tudo? — pergunto.

Ele não diz nada. Fica me encarando, esperando minha resposta.

— Tudo o que você precisava ter feito quando encontrou meu diário era pedir uma verdade nua e crua. Eu teria sido sincera com você. Mas não fez isso. Decidiu não pedir minha ajuda, e agora nós dois vamos arcar com as consequências de suas ações pelo resto da vida.

Ele contrai o rosto a cada palavra.

— Lily — diz ele, se virando para mim. Ergo a mão para que ele não diga mais nada.

— Não. Pode ir embora. Divirta-se na Inglaterra.

Percebo que ele trava um conflito interno. Ryle sabe que não vai conseguir nada de mim agora, por mais que queira implorar por perdão. Ele sabe que a única escolha é se virar e sair pela porta, mesmo sendo a última coisa que deseja.

Quando ele finalmente se obriga a sair pela porta, vou correndo trancá-la. Deslizo até o chão e abraço os joelhos, apoiando o rosto ali. Estou tremendo tanto que sinto meus dentes rangerem.

Não acredito que tem uma parte desse homem crescendo dentro de mim. E não acredito que um dia vou ter de contar isso a ele.

É ASSIM QUE ACABAWhere stories live. Discover now