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Em um momento que para Oliver pareceram anos, esperaram que atendessem após baterem na porta. Diversas vezes seus olhos se mexiam descontroladamente, indo de Laura ao chão (mas nunca à porta), enquanto seu pé não parava de bater no chão. Ouviram alguém falando de dentro um “já vai”, seguido de passos e um barulho de chave destrancando a porta. Ao ser aberta, puderam ver uma mulher de altura média, magra (até demais, provavelmente por ficar sozinha naquele lugar insalubre), com um belo cabelo curto e grisalho, que se encontrava logo acima de seus pequenos olhos castanhos. Apesar de cansada, seu rosto aparentava ser mais jovem do que sua idade dizia.

- Ah, oi filho! – falou com animação. – Quanto tempo não te vejo.

- Oi mãe. – respondeu, sem jeito.

Ela se aproximou e o abraço. Após o gesto carinhoso, se virou e fitou Laura, com um olhar curioso.

- Essa é Laura, mãe... – não soube como continuar. Ela não era sua namorada, mas não era apenas amiga. Do que chamar ela? Não via outra opção. – Minha namorada.

Sua mãe abriu um largo sorriso e se dirigiu a ela, com os braços abertos para um abraço.

- Ah que graça! Finalmente, hein? – Oliver corou. – Prazer em conhecê-la, sou Giselle.

- O prazer é todo meu. – disse, sorrindo. – Há muito queria conhecer a senhora.

- Ah, não me chame de senhora, fique a vontade com “você”. Me faz sentir como parte de vocês.

- O pai tá em casa? – perguntou Oliver.

- Não. – Respondeu, ficando séria. – Você sabe.

Oliver se acalmou. Era óbvio que ele estava em algum bar aleatório da cidade naquele momento. Em algum lugar sujo e desorganizado conversando e gritando qualquer merda com seus amigos. Quem sabe estivesse até entrando em brigas e fazendo piadas sobre a esposa? Não seria surpreendente.

- Bom, vamos entrar? – disse ela sorrindo novamente para Laura e entrando primeiro. – Tem alguns biscoitos com café aqui, fiz agora há pouco.

Laura olhou para Oliver rindo baixinho.

- Namorada?

Oliver deu de ombros.
A casa por dentro não era muito diferente do que se via por fora. Era simples, mas aconchegante. O mais moderno que podia se achar na sala de estar era a televisão, que era bastante grande. Os sofás eram antigos, mas bem conservados como todos os outros elementos (Afinal praticamente o dia inteiro só ela estava em casa, e era uma pessoa organizada). No rack era possível encontrar, em sua superfície, fotos antigas e uma vitrola, da qual estava tocando um dos seus discos em um volume baixo. Na sala havia também algumas estantes com diversos livros (todos de Giselle) e objetos de decoração. Giselle os chamou para a cozinha, que era igualmente simples. Biscoitos e café se encontravam nela.

- Sentem-se por favor. - disse ela, ajeitando as cadeiras. – Ainda vou terminar de ferver a água para o café.
Pegou uma chaleira e ligou o fogão.

Oliver e Laura se sentaram e mordiscaram os biscoitos do prato.

- Como está indo o relacionamento?
Oliver não conseguiu responder, devido ao seu nervosismo. Laura tomou a atitude e deu continuidade para o assunto.

- A gente tá bem, ele tá morando comigo faz 2 meses. Nos conhecemos no trabalho dele.

- Ah, você está trabalhando de novo, filho? – perguntou.

- Sim, desde o começo do ano. Em uma cafeteria.

- Que bom, e o que está achando?

- É ótimo, mãe. – respondeu, sem graça.
A chaleira começou a fazer barulho, e Giselle logo a tirou, com um pano de prato em suas mãos para se proteger da alta temperatura, e colocou um pouco da água quente em três xícaras.

- Com leite? – perguntou, se dirigindo à Laura.

- Sim, obrigado.

Passaram um tempo conversando, principalmente sobre o relacionamento dos dois, que arrancava um sorriso cada vez maior de Giselle a cada frase dita pelos dois. A ausência do pai e a conversa envolvente fizeram com que Oliver se esquecesse (por um tempo, pelo menos) das lembranças dolorosas que aquela casa trazia, e consequentemente foi (de forma gradativa) se soltando e ficando mais animado. Se sentiu bobo por ter ficado tão preocupado em vir para cá. Já deveria ter previsto que seu pai não estaria, e sempre amou sua mãe incondicionalmente, pois era a única que até então o entendia de forma verdadeira e o apoiava. Ela lhe dava a força e a determinação que não era capaz de ter. Muito do que Oliver era como pessoa se deu pelos ensinamentos de sua mãe. O que seu pai lhe ensinou sobre o que de pior tem os seres humanos, sua mãe lhe ensinou sobre o lado bom da vida. Ele sempre a respeitaria, pois mesmo vivendo daquela forma horrível, mesmo chorando todos os dias, continuava de pé e sendo otimista, para que seu filho não ficasse mais triste do que já era. Ele só nunca entendeu o porquê de ela nunca ter se separado de seu pai. Teria tido uma vida maravilhosa, a vida que merecia.

- Quando ele era pequeno, ficava observando os brinquedos, escondido, esperando que se mexessem como em Toy Story – disse ela, rindo.

Laura riu e Oliver corou.

- Ele também costumava tomar banho de mangueira todo final de semana, quando estava muito quente, ele ria tanto que parecia que iria estourar.

A lembrança dos dois, numa tarde ensolarada, se divertindo com uma simples mangueira fez Oliver sorrir. Sim, apesar de ter passado por situações que odiava lembrar, ainda existiam lembranças, mesmo que escondidas, que valiam a pena serem revistadas. Talvez estivesse são e até vivo por conta desses momentos de paz que pôde vivenciar com sua mãe.
Continuaram a conversa por mais algum tempo, até que um barulho fez com que os rostos de Oliver e Giselle mudassem completamente de expressão. Laura se assuntou com a velocidade que seus sorrisos sumiram e foram substituídos para rostos sérios e assustados. Não conseguiu entender o porquê de terem paralisado completamente por ouvirem um barulho de chave na fechadura da porta.
Oliver sentiu seu corpo gelar. Seu coração começou a bater tão rápido que achou que teria um infarto. Achou que iria chorar, mas nem essa reação conseguiu ter em meio ao medo que sentia.
Uma porta se abriu.
Seu pai havia chegado.

Amor à Tarde.Onde histórias criam vida. Descubra agora