VII

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Seus olhos semiabertos deixavam um pouco da luz do lugar invadir sua visão. Por um momento não enxergou nada, pois aquela iluminação tomava conta de tudo ao seu redor; mas logo se habituou e começou, aos poucos, a conseguir observar o que estava em sua volta. Era uma sala de paredes pálidas, com alguns detalhes azuis claros sem vida. Ele estava em uma cama nada confortável, com um lençol também branco. Estava com um aparelho respiratório, e ao notar isso, pôde também perceber que realmente  sentia uma dificuldade de respirar. Estava com o braço posicionado de uma forma que o soro pendurado ao seu lado poderia chegar até seus vasos sanguíneos. Estava há muito tempo ali, já que aquele soro se encontrava perto de acabar. Estava tonto e sentia dificuldade de lembrar o que aconteceu, pois só algumas fagulhas de lembranças passavam pelo seu cérebro. Olhou para os lados, esperando encontrar algum rosto conhecido; não sabia o que havia acontecido, mas sentia uma solidão profunda e saudades de seus conhecidos. Cada vez mais se sentia desesperado, esperando pela companhia de qualquer pessoa que fosse, mas além dele, não estava presente mais ninguém. Tentou se mexer de forma mais brusca, mas sentiu seu pescoço doer. Logo se recordou da dor que o lençol, apertado como estava, causou naquela região de seu corpo. Estremeceu. Seus olhos ainda estavam cansados. Talvez o tivessem sedado um pouco. Esperou mais um pouco que alguém aparecesse, mas como não foi o caso, resolveu dormir mais um pouco.
Abriu os olhos mais uma vez, não se sabe quanto tempo depois, mas desta vez ao olhar para o lado, pôde ver uma enfermeira passando, que virou o rosto para ele, em uma expressão assustada. Sua mão tentou acenar para ela, mas a enfermeira logo saiu do lugar, chamando um nome que ele não pôde ouvir direito. Alguns minutos depois, uma médica alta de cabelos negros e cacheados chegou rapidamente na sala e se sentou ao seu lado, em uma cadeira que ali repousava.

- Você acordou! Como está se sentindo? – Perguntou, cuidadosamente removendo o aparelho de respiração.

Oliver sentiu uma certa dificuldade para respirar sem a ajuda do aparelho, mas se acostumou com o passar dos segundos.

- Onde que estou? Há quanto tempo tô assim? – Perguntou de volta, forçando para conseguir falar.

- Há mais ou menos 2 dias. – Respondeu, em um tom gentil e calmo, mas bastante sério. – Você quase morreu, Oliver. Se os policiais não tivessem chegado em sua casa naquele momento, você nem estaria aqui agora.

- Quem mandou os policiais?

- Seu pai. Depois da ligação que você fez.

- Ele está aqui?

- Está sim. Não saiu do hospital até que você acordasse. Dormiu aqui e tudo.

- Me deixe falar com ele.

- Tudo bem. – Olhou um caderno que estava em seu colo. – Mas apenas um pouco. Você ainda precisa descansar.

Ela se retirou da sala onde Oliver descansava depois de verificar sua respiração e batimento cardíaco.  Seus olhos continuavam fixos no teto, enquanto tentava lembrar do que havia acontecido.  Não demorou muito para que seu pai chegasse correndo naquela sala. O brilho da lâmpada fazia os olhos de Oliver arderem. Seu pai, com olhar choroso e cansado (era difícil imaginar como conseguiu ficar aquele tempo todo no hospital sem dormir) chegou perto dele, sem jeito, ansioso e preocupado. Lhe fez várias e várias perguntas e frases amorosas misturadas com desculpas e arrependimentos sobre o passado. Deitado naquela cama de hospital e com a mente confusa foi que, ironicamente, ele pôde notar o quão diferente seu pai estava. Até então não havia prestado tanta atenção na evolução que aconteceu em tão pouco tempo. Claro, ele percebeu de relance as características de sobriedade que Guilherme apresentou, mas em momento algum decidiu parar e refletir diante de tal situação. Tanta desgraça lhe aconteceu que sentiu que ficaria louco, e só a presença de seu pai no cemitério foi motivo para tudo piorar. Porém, agora, naquele ambiente, incapacitado de sair daquela cama, não havia outra coisa a fazer a não ser pensar. Oliver se assustou ao vê-lo daquela forma, pois talvez nunca pôde ter a oportunidade de presenciar um estado tão favorável em seu pai antes. Os poucos momentos em que estava sóbrio nunca pareceram algo bom, e sim um comportamento que demonstrava falsidade ou imprevisibilidade; afinal ele estava bem naquele momento, mas não significava que continuaria da mesma forma no momento seguinte. Oliver se sentia estranho, pois dentro de si, como uma faísca brilhante em uma dança frenética, se remexia uma sensação diferente. Talvez não diferente por si só, mas por quem essa sensação se manifestava. Nunca antes tinha sentido algo parecido pelo pai, e isso era estranho, já que até então tudo que sentiu por ele não passou de ódio ou até pena. Mas então por que sentia isso? Mesmo que pouco, ainda estava lá. Era uma sensação adocicada, fraca, mas quente. Tudo muito estranho.

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