Capítulo 22

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Abril
𑁯 Outono

੭࣪ 22Taehyung

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੭࣪ 22
Taehyung

JENNIE VOLTOU PARA CASA COM O FONE PENDURADO NOS OMBROS, O OLHAR DESCONfiado e mais cautelosa do que o normal, como se estivesse com medo de que eu fizesse algo inesperado, como organizar uma festa do pijama ou começar a tocar um pandeiro às três da manhã. Era óbvio que ela estava me evitando; se eu entrava na cozinha, ela saía; se eu fosse para a varanda, ela ia para dentro de casa. E talvez eu não devesse estar tão puto, mas estava. E como estava.

— Por acaso estou com alguma doença contagiosa e ninguém da minha família me contou nada porque eu vou morrer e eles querem que eu passe meus últimos dias sendo feliz, ou algo assim?

Ela se segurou para não rir.

— Não. Não que eu saiba, pelo menos.

Isso era um pequeno detalhe, mas fazia toda a diferença se comparado com o primeiro mês, porque antes ela se limitaria a dizer "não" antes de sair correndo. E agora, mesmo que quisesse fugir, ficava parada na minha frente com um ar desafiador.

— Então seria bom se você parasse de me evitar.

— Não estou te evitando. É difícil te encontrar.

— Difícil? Nós moramos juntos — lembrei.

— Sim, mas você está sempre na praia ou trabalhando.

— Agora estou aqui. Perfeito. O que quer que a gente faça?

— Nada, eu ia... ia ouvir música.

— Boa ideia. E depois você me ajuda a fazer o jantar.

— Mas Taehyung ... A gente não...

— A gente não o quê?

— A gente não funciona assim.

— Na verdade, a gente não funciona de jeito nenhum. Espera, pensando bem, você não quer funcionar, mas a gente vai mudar isso. Estou cansado de entrar em um cômodo e ver você saindo. E, caso esteja se perguntando, sim, neste momento isso é uma espécie de ditadura temporária. Nos vemos na varanda daqui a cinco minutos.

Procurei entre os discos que estavam juntando pó ao lado do baú de madeira onde estava o toca-discos. E por fim o encontrei: um vinil dos Beatles. Limpei a capa com abmanga do moletom que estava usando, porque à noite já estava refrescando um pouco, e o coloquei para tocar.

"I'm so tired" começou enquanto eu saía para a varanda. Sentei nas almofadas e, como se fosse puxada pela música, Jennie se sentou ao meu lado. Bateu no meu cotovelo com o braço, estremeceu e aumentou a distância entre nossos corpos.

Quando soaram os primeiros acordes de "Blackbird", ela suspirou fundo, como se estivesse prendendo a respiração. Fiquei me perguntando o que estaria sentindo com aquela música, tão perto de mim. Estava com os lábios entreabertos e os olhos perdidos no mar, sobre o qual a noite caía.

— Eu gosto dessa — eu disse.

— I will — sussurrou ela.

— Um dia, no estúdio, seu pai me obrigou a escutá-la do início ao fim com os olhos fechados. — Ela tentou se levantar, mas fui rápido o bastante para segurá-la pelo braço e mantê-la ao meu lado. — Ele me contou que, pelo que diziam, Paul McCartney precisava ter alguém ao lado dele para inspirá-lo a compor. Ele teve várias musas e, na falta de uma mulher, até mesmo sua cachorrinha, até que apareceu Linda. E essa foi uma das músicas que ele fez para ela. Sabe o que Douglas me disse? Que, no dia em que ele viu sua mãe pela primeira vez, ele ouviu as notas dessa música na cabeça. Por isso sempre a colocava para tocar quando pintava algo relacionado ao amor.

Jennie pestanejou e eu senti um aperto no peito ao ver seus cílios molhados, e fiquei me perguntando como eu os desenharia se me fizessem esse pedido, exatamente esse, o momento exato em que eles se moviam como asas batendo, tentando afugentar a dor.

— Por que está fazendo isso comigo, Taehyung?

Merda, a súplica que havia na voz dela... Sequei uma lágrima com o polegar.

— Porque isso é bom para você. Chorar.

— Mas me faz sofrer.

— O sofrimento é um efeito colateral da vida.

Ela fechou os olhos, senti que estremeceu e a abracei.

— Então eu já não sei se quero viver...

— Não fala isso. Porra, não fala isso nunca.

Eu me afastei dela com medo de que tombasse, mas vi exatamente o oposto: ela parecia mais forte, mais inteira, como se algum pedaço tivesse se recomposto. Eu queria compreendê-la. Queria... eu precisava saber o que estava acontecendo dentro dela; entrar, escavar, abrir seu coração e vê-lo por completo. E a impaciência me vencia, a curiosidade me consumia. Eu tentava dar espaço a ela, mas acabava tirando-o depois.

— Eu sabia dessa história do meu pai - disse Jennie tão baixinho que o vento da noite engoliu suas palavras e eu precisei me inclinar em sua direção para ouvi-la. — Ele me disse que, se no momento em que você encontrar sua alma gêmea uma música tocar em sua cabeça, é um presente. Algo especial.

Concordei, em silêncio, com as costas apoiadas na madeira.

— E já aconteceu com você?

Tentei parecer divertido, tirar o peso do assunto, mas Jennie me olhou muito séria, com os lábios apertados e os olhos ainda úmidos depois de chorar.

— Sim.

— Sim

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𖹭

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