A porta da frente se abriu com um estrondo e Matt entrou encharcado, com uma expressão de puro pânico ao me ver.
-Olívia! — Ele correu até mim, me segurando firmemente. — Estou aqui princesa, vai ficar tudo bem, Carmem está aqui também.
-Pessoal, vamos nos acalmar agora e agir com cuidado, eu garanto que essas meninas ficarão bem ou não me chamo Carmem!
Ela se aproxima de mim e embora não consiga ver claramente o que ela está fazendo, confio plenamente nela.
-Não teremos tempo para levar Olívia ao hospital, eu já ajudei em alguns partos na vila, nunca de gêmeos, mas elas ficarão bem custe o que custar. Matt, Alejandro! Tragam-na para baixo.
-Por favor, Carmem, ajuda minhas filhas. Se algo me acontecer e você precisar escolher, por favor, escolha elas.
A situação parecia saída de um pesadelo, a sala estava escura, apenas iluminada pelas lanternas dos celulares que Alejandro segurava com mãos trêmulas. Carmem se movia com uma calma sobrenatural, mas eu sabia que ela estava ciente da gravidade da situação. Ela havia assumido o controle e todos nós atordoados pelo pânico e pela adrenalina, seguimos suas instruções sem questionar.
-Matt, vá até o quarto das Bebês, traga toalhas limpas, álcool gel e a tesoura do kit primeiros socorros!
Matt, com os olhos arregalados, correu em direção ao quarto, eu ouvia os sons abafados de gavetas sendo abertas e fechadas apressadamente e em poucos minutos, ele estava de volta com tudo que foi pedido.
-Alejandro, tente falar com Daryl; ele precisa saber que as filhas estão nascendo.
Carmem pegou os itens das mãos de Matt e organizou tudo meticulosamente sobre a mesa improvisada ao seu lado.
-Agora respire fundo e tente se acalmar. Vai dar tudo certo. - Ela falou, olhando diretamente para mim. Sua voz era um bálsamo para minha alma aflita.
Deitada no chão, senti uma onda de dor e medo me invadir e tento me concentrar nas palavras tranquilizadoras de Carmem. Ela me ajudou a assumir uma posição mais confortável e começou a me orientar sobre o que viria a seguir.
-Alejandro, mantenha a luz focada aqui. - Carmem indicou com um gesto onde queria a iluminação, enquanto se preparava para fazer o parto.
Com um olhar carinhoso, ela segurou firmemente minhas mãos, transmitindo confiança.
-É hora, querida. Vamos lá! Empurre! Você consegue! - Ela disse, colocando um pedaço de toalha entre meus dentes para morder.
Matt se ajoelhou ao meu lado e segurou minha mão com delicadeza.
-Princesa, aperte minha mão para aliviar a dor.
-Olivia!" – Carmem exclamou animada. – Consegui ver a cabecinha de uma delas!
Eu apertava a mão de Matt com força, incapaz de descrever o que sentia, tamanho era o meu sofrimento. Ele sussurrava baixinho:
-Você é forte, princesa. Eu acredito em você.
POV DARYL
-Enrico, eu não posso mais ficar aqui sem notícias. Olha essa merda de tempestade! Preciso saber se elas estão bem!
Aquela sensação pesada no meu peito só aumentava, uma certeza amarga de que alguma coisa estava errada.
-Calma, Daryl. Não tem como sair no meio dessa tempestade, irmão. Olívia está bem e você está nervoso à toa.
Sentei na poltrona om minha perna tremendo incontrolavelmente. Olhei mais uma vez para o meu celular, ainda sem sinal e aquilo só aumentava minha angústia. Então, não suportei mais a incerteza e desci os quarenta andares do prédio pelas escadas, já que a cidade inteira parecia estar sem energia e o elevador definitivamente não funcionava. Ao chegar no térreo, abri a porta de vidro e ao colocar o pé para fora, tive a sensação de que o vento me carregaria. Uma senhora, que esperava com outras pessoas no prédio, gritou:
-Moço, você é louco? Vai ser carregado pela tempestade! Volte aqui!
A chuva batia no meu rosto como agulhas e o vento parecia querer arrancar minha roupa do corpo. A cidade estava irreconhecível, ruas alagadas, árvores arrancadas, pedaços de telhados voando como se fossem de papel. Sabia que o caminho até nossa casa seria difícil, mas a preocupação por Olívia me dava forças.
Depois do que pareceu uma eternidade, virei a esquina da nossa rua e vi nossa casa, mas estava escuro e as janelas estavam fechadas. O portão era eletrônico, então tive que pular o muro, mas depois de o jardim, percebi que a tempestade estava acalmando e ao abrir a porta de casa completamente ensopado, me deparei com o que mais temia: Olívia dando à luz. Sabia que ela precisava de mim e algo estava errado, algo fora do comum estava acontecendo.
-Carmem, mas o que...
-Daryl, meu filho...
Ajoelhei-me ao lado de Olívia e pela primeira vez em minha vida, me senti impotente diante da situação, só me restava rezar e pedir a Deus pela vida delas.
-Olívia, meu amor, estou aqui! Vamos! Você consegue!
Matt se levantou ao ouvir-me falar com Olívia, mas Carmem o puxou pelo braço, então olhou nos olhos de Matt, nos meus olhos e em seguida para Olívia dizendo:
-Preciso da ajuda de todos! Estou falando sério.
POV OLÍVIA
O tempo parecia se arrastar e correr ao mesmo tempo, eu sentia cada contração como uma eternidade, as palavras de Carmem, seus gestos cuidadosos e firmes e a presença de minha família ao meu redor foram a âncora que me manteve centrada. E então, num momento de dor intensa e alívio indescritível, ouvi o primeiro choro.
O som era pequeno e frágil, mas carregava o peso de um milagre. Carmem segurou o bebê com mãos experientes e sorriu para mim. Lágrimas escorriam pelo meu rosto e por um instante, o mundo ao redor desapareceu, tudo que importava era aquele pequeno ser em meus braços, sua presença era um testemunho da força, coragem e amor que haviam nos guiado até ali.
Carmem usou algodão para limpar a boquinha de Tatia, e a envolveu em uma das toalhas. Nesse intervalo, a energia elétrica da casa foi restaurada, trazendo um pouco de alívio a todos. Ter minha filha nos braços foi a experiência mais emocionante que já vivi, superando qualquer sentimento de amor anterior, pois esse é o verdadeiro amor.
-Daryl, por favor, pegue sua filha. - Carmem disse, estendendo os braços com Tatia em direção a ele.
Daryl não hesitou, ele segurou a pequena como se tivesse muita prática, seu instinto paternal recém-nascido também aflorava.
Alejandro nos avisou que conseguiu chamar uma ambulância, mas que iriam demorar devido ao caos da cidade.
Independentemente de qualquer coisa eu e Carmem tínhamos que continuar nosso trabalho, não dava para esperar a ambulância chegar.
-Vamos lá Olívia, Elena precisa nascer. Força!
Iniciei outro esforço, enquanto Daryl estava encantado com Tatia em seus braços, cuidando dela com carinho, ele andava de um lado para o outro, visivelmente emocionado e radiante.
Matt permanecia ao meu lado, enxugou o suor da minha testa e colocou a toalha na minha boca novamente.
-Vamos lá, princesa, você consegue mais uma vez. – Me encorajava Matt, olhando para Daryl, que retribuía com um sorriso.
Forcei duas vezes com toda minha alma, mas não foi o bastante, eu estava exausta tornando a tarefa mais difícil desta vez.
-Elena precisa vir ao mundo, faça mais uma vez, minha querida. – Carmem falava, afastando meus joelhos.
Neste momento pedi forças a Deus silenciosamente, implorando por ajuda para trazer mais uma vida ao mundo.
Matt e Daryl notaram minha exaustão e começaram a ficar preocupados. Matt deu um beijo em minha testa, nesse momento eu senti o medo se misturar com sua lágrimas, e com a voz forte ele gritou:
- Olívia não desista!
Olhei a minha pequena Tatia nos braços do pai eu reuni minhas forças novamente pensando: Não posso desistir, Elena precisa de mim.
A Dor foi intensa, senti meus músculos se contraindo com meu grito doloroso, que se tornou muito mais alto ecoando por toda a casa e no último empurrão senti um pequeno alívio porque a cabeça de Elena acabara de sair.
Carmem puxou a pequenina e fez o mesmo que havia feito com Tatia, mas Elena não chorou, então fiquei confusa, tentando entender o que estava acontecendo. A sala ficou em um silêncio angustiante, meu coração batia acelerado, cada segundo sem o choro de Elena parecia uma eternidade.
Senti um frio na espinha e meu corpo tremia de cansaço e desespero, Matt segurava minha mão com força, tentando me passar alguma força, mas eu conseguia sentir o pânico em seu aperto. Daryl se aproximou mais, e sua expressão era um misto de esperança e medo. Carmem segurava Elena nos braços, seu rosto estava pálido e seus olhos se enchiam de lágrimas. Mas ela não queria acreditar e continuava limpando o corpinho pequeno e frágil, como se de alguma forma isso pudesse trazer a vida de volta. Minha mente tentava processar o que estava acontecendo, mas a realidade cruel parecia me paralisar.
-Carmem, o que está acontecendo? - Minha voz saiu como um sussurro, quase inaudível.
Carmem respirou fundo e sua expressão agora era de uma resignação dolorosa. Ela olhou para mim e eu soube a verdade antes mesmo de suas palavras confirmarem meu pior medo.
-Olívia, eu sinto muito... - Sua voz quebrou no final da frase, e suas lágrimas começaram a cair.
Meu mundo pareceu desmoronar naquele instante, um grito de dor escapou dos meus lábios ecoando pela sala, misturando-se ao silêncio que parecia mais alto que qualquer som. Matt me envolveu em seus braços, e suas lágrimas se misturando com as minhas. Daryl caiu de joelhos com Tatia no colo, o desespero era claro em seus olhos enquanto abraçava nossa filha que dormia inocentemente.
– Alguém faça alguma coisa droga. – Grita Daryl
- Eu preciso estancar esse pequeno sangramento de Olívia, por favor segure o corpinho de Elena Alejandro, – Carmem disse com lágrimas escorrendo por seu rosto.
- Me dê minha filha Carmem, quero pegar Elena - Eu supliquei.
Um grito de dor irrompeu de meus lábios, ecoando pela sala e Matt me envolveu ainda mais em seus braços, tentando, sem sucesso, me consolar.
-Olívia eu preciso cuidar de você primeiro, seu marido e sua filha te esperam.
Alejandro fica sem reação e parece não ter muita convicção no que vai dizer.
- Não posso segurá-la Carmem, é muito triste. Me desculpe, eu sinto muito.
Matt se levantou e estendeu os braços na direção de Carmem.
-Eu pego Elena Carmem, pode me entregar.
POV MATT
Eu não sei o que aconteceu comigo, mas senti que Elena era parte de mim no momento em que a peguei praticamente sem vida nos braços. Meio desajeitado, porque nunca havia segurado um bebê antes, ajeitei-a com cuidado apesar de ela estar sem reação. Por um instinto inexplicável encostei meus lábios em sua pequena cabeça ainda coberta de sangue e lhe dei um beijo. Todos me olharam sem entender, e como eu poderia explicar algo que nem eu compreendia?
- Elena meu anjinho por favor acorde... — Eu repetia com minha voz entrecortada pelos soluços. — Por favor, meu amor, acorde...
Antes que eu pudesse completar a última frase, ela começou a chorar e a mover levemente seus bracinhos. Levei um susto, mas confesso, foi o melhor susto da minha vida.
O som do choro de Elena preencheu a sala, trazendo um alívio indescritível. Eu e Daryl nos olhamos sem acreditar e Carmem ainda ajoelhada ao meu lado, começou a chorar de alívio e felicidade.
-Ela está viva! — gritei, com a voz trêmula pela emoção. — Elena está viva!
Daryl, ainda segurando Tatia, veio para perto e Carmem rapidamente se aproximou para examinar Elena, agora chorando vigorosamente em meus braços.
Meu amor por Elena foi instantâneo; tê-la nos meus braços me fortaleceria para sempre, sem nem mesmo compreender porquê. Embora soubesse que amaria minhas sobrinhas, não imaginava que esse sentimento pudesse ser tão intenso a ponto de doer no peito, um amor eterno por esse pequeno milagre chamado Elena.
POV OlÍVIA.
Eu me permiti chorar de alegria abraçando Elena contra meu peito. O pesadelo havia terminado e Matt se juntou a nós, envolvendo-nos em um abraço apertado.
Daryl estava ao nosso lado com Tatia, todos unidos em um momento de felicidade e alívio que mudou tudo. A vida de Elena que começava a pulsar em meus braços, agora trazuma nova esperança e renova a força dentro de todos nós.
Alejandro recebeu a equipe médica recém-chegada e eles prestaram o primeiro atendimento às gêmeas no local, levando-as rapidamente até a ambulância.
Na maternidade, fui prontamente atendida, passando por uma avaliação que impressionou o médico, pois apesar do estresse eu estava milagrosamente bem. Ao receber notícias das meninas de um dos pediatras, senti um alívio imenso ao saber que estavam perfeitas. Tatia era mais pesada que Elena, com 2,850 kg, enquanto Elena pesava dois quilos. O médico explicou que Elena precisaria de cuidados especiais por mais cinco dias e ficaria na incubadora até ganhar pelo menos mais 600 gramas.
Dr Josh não conseguiu explicar o porquê desse episódio com Elena, visto que o cordão umbilical foi cortado de maneira correta e agora ela parecia estar saudável.
Depois de receber os devidos cuidados médicos e cair no sono contra minha vontade, acordei assustada no quarto do hospital tomando soro, ligada alguns aparelhos que monitoravam meus batimentos por precaução.
Daryl me encarava aflito quando acordei novamente ainda um pouco grogue devido aos remédios calmantes. Notei que havia um sofá cama encostado na parede, mas mesmo assim ele estava sentado do lado da minha cama mexendo carinhosamente em meus cabelos.
-Daryl? – Chamei-o levantando um pouco a cabeça.
-O que foi, meu anjo?
-As meninas.... Quero vê-las!
-São 3:00 da manhã meu amor, elas estão na enfermaria. Acabei de ir lá para garantir que estão bem. O melhor pediatra daqui está cuidando e nossa pequena guerreira Elena e Daqui a pouco Carmem estará aqui. Eu preciso ir para casa tomar um banho, tudo bem?
-Claro, amor, eu vou ficar bem. Vá descansar um pouco.
Ele me dá um sorriso sereno e tranquilo junto com um beijo na testa.
-Daryl, alguém avisou a Liza?
-Sim, eu avisei. – Ele disse, mostrando as mensagens em seu celular. – Ela estará aqui cedo no horário de visitas.
-Que bom, ela precisa conhecer as afilhadas. – Eu digo, bocejando.
-Você foi incrível, Mi Maya. Quem poderia imaginar que, desde o dia em que te vi no Central Park, você me daria os maiores presentes da minha vida? – Ele diz, mudando de assunto.
Eu sorrio recordando dos momentos do meu parto horas antes.
-Daryl?
-Sim?
-Você precisa falar com o Matt e agradecê-lo! Por favor, faça isso hoje.
-Eu acabei de fazer isso há pouco tempo meu amor.
-Ele está aqui? - Perguntei curiosamente, levantando um pouco a cabeça do travesseiro.
-Ele acabou de sair, queria se certificar de que tudo estava bem e quando viu que estava, foi embora. Nina veio buscá-lo; ela mandou um beijo para você e disse que virá hoje com Liz.
Descansei a cabeça em seu antebraço, um milhão de pensamentos girando em minha mente após essa turbulência de emoções, mas aos poucos os pensamentos deram lugar ao sono.
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Um Amor em Dois Mundos
RomanceDesde criança, Olívia Price Dias sonhava em morar em Nova York. Mas foi aos seus 25 anos que ela finalmente conseguiu realizá-lo. Sua ascendência americana paterna a atraía para a cidade que nunca dorme. Há seis meses, ela deixou o Brasil para trab...