22. Intruso, parte 2

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Chelsea

— Confie em mim para te ajudar, não sofra sozinha desse modo — pede, mas uma parte de mim tem certeza de que em seus olhos, há mais do que uma solicitação, é como se ele estivesse prestes a implorar para que eu deixe que cuide de mim. — Se não for por você, mas pelas crianças.

— Por que se importa tanto com o que acontece comigo? — Pergunto e experimento uma sensação estranha enquanto me olha, apesar de ela ser reconfortante. Com um olhar, pede para continuar comendo e eu faço.

— Se você vê uma pessoa ferida, não é normal ajudar? — Questiona, mas tenho a sensação de que já ouvi essas palavras antes, porém, onde? Beatrix me disse algo do tipo no passado?

Foi Yahya? Não, estou pensando demais, são palavras comuns para quem gosta de ajudar os outros. É isso que Archie faz nesse momento. Cuida de alguém que não demonstra a capacidade de lidar com seus problemas sozinha.

— Tudo o que quero é que me permita ajudar, assim não vou ter que arrombar a porta em uma próxima vez que precisar de mim — discorre, de novo, com muita facilidade, ignorando a parte de que fazer isso seria um crime, ainda que menos agravante, considerando que ajudaria alguém fora de si.

— Suas palavras são estranhas — murmuro e ele ignora completamente o fato de que talvez eu precise comer mais devagar. Preocupa-se tanto assim com a minha alimentação? — Mas acho que sou mais esquisita, já que não estou ligando para polícia.

— Você me deixou entrar — replica, e sim, eu me lembrei minimamente do que aconteceu. Sinto minhas bochechas queimarem somente pela lembrança passando correndo por minha mente, já que o fiz dar banho em mim.

Contudo, pela sua expressão, não parece sentir nada pelo que aconteceu.

Considerando a situação, seria ainda mais estranho se ele sentisse, certo?

— Eu sei — balbucio, vejo em seus olhos que quer que eu explique o que acabei de dizer. — Me lembro um pouco do que aconteceu — conto.

— Que bom — pede e parece satisfeito com a resposta, muito diferente de quando notou que eu não me recordava do acontecido. — Uma mulher continua ligando sem parar para você — diz.

Mesmo que eu não diga nada, sei que a minha pausa repentina, impedindo que a colher chegue à boca, dará a ele muitos motivos para questionar quem é a pessoa ligando. Por que ela continua ligando depois de ter sido tão escrota?

Se eu... merda! Eu não disse todas aquelas palavras para ela, quem as escutou foi Archie. Tenho certeza de que pondera muito sobre o que está por trás delas. Os motivos que fizeram com que as cuspisse tão rispidamente.

Ainda que não quisesse, foi banhado com a minha raiva.

— Não é ninguém importante — respondo, mas a demora para as palavras saírem da minha boca já é motivo para que entenda que tem algo de errado. Considerando como me encontrou, seria fácil unir as informações.

— Tem razão, nada é mais importante do que você nesse momento — afirma, erguendo-se para ir até Melissa quando ela decide que brincar sozinha não é mais o que quer e demanda atenção. — Quero que se lembre disso — fala, acocorado perto do cercadinho, eu só posso ver suas costas.

A rigidez em seu corpo faz com que entenda que as palavras são complicadas para que as diga sem ponderar sobre elas antes. Talvez tema que eu volte àquele estado fragilizado.

— Nada é mais importante do que a Chelsea, e quem te tratar como se não fosse precisará pagar — atesta e eu de novo sei que minhas palavras seriam apenas murmúrios estranhos se eu as expusesse aqui.

Não tem como ignorar o que disse, assim como não tem como deixar de lado todos os problemas que me perseguem, porque eles vão continuar comigo até que dê um jeito de resolvê-los.

O que houve ontem não pode acontecer de novo, é um perigo.

Para mim, para Melissa, para os bebês.

Se eu permitir que ocorra de novo, serei somente uma ignorante que não consegue compreender que não pode lidar com tudo como quer. E quando os riscos perpassam o que ocorrerá comigo, é inevitável se agarrar aquilo que pode me ajudar.

— Como não quer que eu agradeça, vou deixar que me ajude — digo. Archie fica de pé, mostrando que Melissa ama estar nos braços dele, que é familiar para ela, mesmo que tenha sido segurada poucas vezes.

A expressão em seu rosto é muito desconcertante. Toda aquela raiva que estava exalando desde a primeira vez que coloquei os meus olhos nele se dispersa com facilidade enquanto me olha.

— Seria estranho sermos pessoas desconhecidas depois de tudo o que viu ontem — professo e fica em silêncio, parece preferir que eu diga tudo o que quero antes que fale sobre suas intenções. — Então, amigos?

Me pergunto se passei de algum limite, já que ele continua em silêncio pelo que parece ser um século. O tempo congelou sem eu notar? Preciso ser mais cuidadosa com o que deixo sair pela minha boca.

— Por enquanto, é bom o bastante — diz, me tornando aquela que não sabe o que dizer, visto que suas palavras certamente não são o que eu esperava. Pensei que ele me criticaria por oferecer somente a minha amizade depois de tudo o que fez.

Mas duvido que precise de qualquer outra coisa que eu possa dar.

Tem muito dinheiro, uma boa família. O que está nas minhas mãos que pode ser seu é a minha amizade. Esse é o motivo para tê-la oferecido. Então, por que as suas palavras têm nuances desnecessárias para um relacionamento com um rótulo desse?

Quer que eu perca tanto tempo pensando em suas palavras que será possível ignorar os meus problemas? Porque é impossível. Mesmo que tente, eles sempre voltam para mim e me sugam por completo.

É incontrolável, e eu só quero ter o controle de uma única coisa.

— Eu deveria pensar melhor sobre o que acabei de dizer? — Pergunto, mas tudo o que recebo é um sorriso sorrateiro dele.

— Não, não pense muito, apenas me deixe agir — pede, e uma parte minha me diz que eu deveria recusar enquanto ainda posso, mas eu a ignoro.

Um ceo em minha vida | EM ANDAMENTOOnde histórias criam vida. Descubra agora