As batidas fortes na porta começaram há cerca de cinco minutos; entretanto, Skirah estava ignorando o som. Na entrada do dormitório, James berrava para entrar. Observando pela abertura na parede que dava para a sacada do quarto, a garota notou que estava ali há horas, sentada no chão, com as pernas formigando, os rins doendo pela falta das idas ao banheiro e a boca seca.
Talvez o estresse a tivesse apagado durante um turno. Não sabia se a voz em sua cabeça tinha submergido nesse meio tempo e não queria saber; só precisava se levantar. Tentou, mas seus músculos gritaram em dor e formigamento. Ignorando o desconforto, foi se apoiando aos poucos, dando leves tapas nas pernas até estar de pé afim de ir esvaziar a bexiga, e foi o que fez.
Do outro lado da porta, mais vozes se uniam à de James — provavelmente noaliens dos quartos vizinhos, irritados com o barulho. O Sol seguia forte lá fora, oferecendo um breve escape daquele turbilhão de pensamentos.
A sacada não era tão alta e existia apenas porque o corredor dos dormitórios seguia em uma grande rampa de subida. Quase não dava para perceber a singularidade da estrutura daquele lugar: sem escadas, apenas corredores que se interligavam para cima. Havia a possibilidade de que ela atingisse o solo consciente, já que os noalienígenas se recuperavam mais rápido do que humanos, além de serem mais resistentes à dor. Haviam sido feitos para isso. Seu ouvido direito, inclusive, já havia se recuperado quase que totalmente.
Silenciosamente, após sair do banheiro, Skirah destrancou a porta e se dirigiu até a abertura que a guiaria para fora daquele quarto. Não se preocupou em avisar a James de que ele já podia entrar; uma hora ele descobriria. Não tinha tempo nem vontade de falar com ele. Estava em pânico só de imaginar uma conversa com o colega naquele momento estressante. E então após chegar na sacada, pulou, talvez em um lapso de surto.
Esse surto a convenceu de que atingiria o solo em pé e sairia correndo. Porém, ao concluir a descida, uma dor tão aguda percorreu suas pernas até os dentes, que a incapacitou. Não teve ideia de quanto tempo levou para apagar. Deitada em posição fetal, agonizou até atingir a inconsciência.
***
— Skirah? Vadia, além de maluca, virou suicida agora? Se queria morrer, devia ter pulado da cobertura do prédio. Você não serve nem para se matar... — A voz era de Ynnori, reconheceu, mas seus olhos estavam pesados demais para se abrirem.
— Cale a boca... — respondeu com dificuldade. Buscou saliva para engolir e lubrificar a garganta, mas não achou.
— Nem tente se mover, idiota. Você está amarrada e detida como possível suicida.
— E como eu faço... pra sair daqui? — Sky perguntou, vendo tudo escuro e sentindo uma queimação intensa. Queria tocar o pescoço, mas estava imobilizada. Notou que estava deitada.
— Só assume que não é suicida pra ver se me convence.
— Mas eu não sou...
— Então tá. Excelentes argumentos. — A loira riu e começou a desamarrá-la.
— Preciso... de água.
Ynn ajudou-a a beber de um recipiente que, pelo formato, deveria ser uma garrafa, embora Skirah ainda estivesse vendada e não pudesse confirmar. O líquido lhe trazia uma sensação quase perigosa, como a perdição de linken.
— Não vão reclamar com você por fazer isso sem permissão? Amarrar uma colega? — Perguntou com mais facilidade, agora que a boca estava úmida.
— Não, e, infelizmente, você perdeu o movimento total das pernas.
As palavras soaram como um soco. Os olhos da glond arderam. Sentia-se uma estúpida. James era irritante, mas não valia suas pernas.
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Formação de Cinzas
Ficção CientíficaUm universo futurista que mistura romance, fantasia e ficção científica. Acompanhe Skirah em um mundo pós apocalíptico, onde humanos e híbridos lutam pra sobreviver.