MEIOS DE SUPORTAR A DOR (MEADOS DE 2150 - 2160) PASSADO PÓS INVASÃO

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Akumi olhou de dentro do prédio para o local distante em chamas, além do mar.

Tinham evacuado sua cidade pouco antes de quase tudo ser varrido. Ela e alguns ficaram para trás por não terem interesse em sobreviver. E, infelizmente para ela e esses, seu pequeno país rodeado por água agora estava quase vazio. Aqueles que queriam viver, mortos.

Apesar do país ter ficado espaçoso para o baixo número de moradores atuais, do outro lado, metade dele havia virado cinzas, assim como o lugar além do mar.

Era a ironia do destino. Mais irônico ainda era o fato de que, depois de tanta dieta, a menina de pele amarelada perdia peso só de olhar para o oceano. Seu cabelo preto e ralo estava comprido demais, com a franja cobrindo os olhos escuros como carvão. Mais uma coisa para sua versão ideal do futuro resolver.

Ela tragou o cigarro, sentada no sofá bege dentro do pequeno apartamento térreo e genérico, cheio de cores pastéis deprimentes que a ajudavam a devanear.

Nos últimos anos, as geleiras derretiam cada vez mais, e o mar reivindicava para si grande parte daquele lugar. Tudo bem, ela pensou. No fim, quando aquele calor infernal das queimadas pela encosta passasse, morreria de bom grado.

— "Drogados não são muito inteligentes", minha mãe dizia. Mas aqui estou eu, chapada, pensando nos próximos dias — ela comentou, voltando-se para o homem tatuado, muito magro, de cabelo curto descolorido, que aguardava o repasse do cigarro ao seu lado. — Quando formos asfixiados aqui. Ou quando as plantas morrerem. Questões para os inteligentes.

— Sua mãe morreu.

— Sorte a dela. — Akumi respondeu, e os dois riram.

— Temos mercados, bebidas, drogas e alguns amigos. Que tal sairmos, pegarmos uns instantâneos e ficarmos loucos até o dia em que resolvam nos queimar também?

— Parece incrível, Totsuya. — Ela disse, sorrindo mais uma vez, exibindo dentes amarelados que não eram apenas devido às substâncias no corpo. Sempre esperara por isso: um fim. Um descanso da tortura de estar viva. Ela nunca imaginaria que o fim do mundo seria a chave para sua felicidade enquanto tudo além do mar e grande parte do seu país pegava fogo.

Nas ruas, o ar era difícil de respirar. A anestesia das substâncias ajudava a relaxar, mas não abria sua glote, que ameaçava se fechar. "Quantos dias vai ficar queimando lá?", certa vez, ela perguntou a Totsuya. Ele respondeu que ela estava sóbria demais ou perto de uma overdose para acreditar que ele teria uma resposta.

Entraram em um mercado. O cheiro era desagradável do lado de fora, mas tinham a impressão de que diminuíra comparado aos dias anteriores. Ainda havia energia — solar —, embora não soubessem até quando, já que o Sol estava cada vez mais encoberto pelas nuvens escuras.

***

Akumi acordou vomitando, e ela odiava vomitar.

Perguntava-se se finalmente as orações de sua mãe tinham surtido efeito, fazendo seu corpo rejeitar as substâncias que usava diariamente, ou se era apenas o ar venenoso que respirava todos os dias.

— Amiga! — Era a voz de Sayuri. Talvez estivesse mesmo morrendo. Da última vez que vira Sayuri, ela estava rindo, suja, mas, em sua opinião, com o cabelo castanho ondulado e a palidez impecáveis, jogada em uma calçada. O Sol escondido por nuvens negras, e ela, deitada como uma indigente, ria e engasgava com a própria risada.

— Meus cigarros acabaram. Tudo que eu tinha para dividir, pra gente usar, também está acabando. As queimadas continuam, então se prepare. Nosso maior medo vai se concretizar porque vamos morrer sóbrias. — Akumi disse, sabendo que Sayuri não estava ali para se preocupar com sua saúde.

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