Capítulo 27

21 3 2
                                    

07 de maio de 2010

Thayse

Desde muito nova, talvez por ser uma garota trans, fui forçada a aprender a criar armaduras emocionais para me proteger do mundo ao meu redor. Cada insulto, cada olhar de desdém, cada comentário maldoso foram tijolos que fui acumulando e empilhando, construindo barreiras que me mantinham segura, mas também solitária. Aprendi a ser forte e a não mostrar fraqueza, porque percebi que qualquer sinal de vulnerabilidade poderia ser usado contra mim. Uma das lições mais difíceis e importantes que aprendi é a de não dar segundas chances. Não me permito esquecer ou perdoar facilmente, porque já me machuquei demais tentando acreditar que as pessoas podem mudar. Ao invés disso, escolho seguir em frente, deixando para trás aqueles que não me valorizam ou respeitam.

Não foi fácil chegar até aqui onde estou. Foram muitas conversas, tanto com meu pai quanto com Jean e Mayra. Eles me mostraram que, talvez, abrir uma brecha para ouvir o outro lado das pessoas possa ser benéfico para mim. Então, aqui estou eu, sentada em uma mesa de restaurante, esperando pela minha mãe. Vamos almoçar juntas e tentar conversar. Esta reunião é um passo gigantesco para mim, algo que eu jamais pensei que seria possível. Enquanto espero, meu coração bate acelerado e minha mente está cheia de lembranças e incertezas. As palavras de incentivo e os conselhos que recebi ecoam em minha cabeça, lembrando-me de que este encontro pode ser uma oportunidade de cura e reconciliação. Tento controlar a ansiedade e me preparo para o que está por vir, esperando que esta conversa possa abrir novos caminhos e, quem sabe, reconstruir pontes que foram quebradas há muito tempo.

E lá vem ela! Amanda Reis, uma mulher jovem e bonita, mora em São Paulo e é uma cantora sertaneja de sucesso. Sua presença é imponente, e mesmo em meio ao nervosismo, é impossível não notar a confiança com que ela caminha até a mesa. Ela tem uma aura de elegância natural, veste um vestido midi floral que realça sua figura esbelta, acompanhado de sandálias de salto alto que ecoam a cada passo. Seus longos cabelos castanhos estão perfeitamente arrumados, caindo em ondas suaves sobre os ombros. Os olhos castanhos, marcados por uma maquiagem impecável, parecem irradiar uma mistura de determinação e ternura. 

Amanda Reis não é apenas uma cantora famosa — ela é um ícone do sertanejo atual, conhecida por sua voz poderosa e suas letras emocionantes que falam de amor, perda e resiliência. Com um álbum de platina e alguns prêmios na indústria musical, ela conquistou um lugar especial no coração dos fãs. Sua carreira meteórica a levou a se apresentar em grandes palcos e a participar de programas de televisão, mas hoje, sua atenção está voltada para este pequeno restaurante, onde uma conversa crucial está prestes a acontecer.

Para mim, a situação é ainda mais complicada. Eu estou profundamente decepcionada por ela ter me abandonado assim que iniciei a transição de gênero. Eu não sei se realmente quero perdoá-la. O abandono deixou cicatrizes profundas e a dor de ter sido rejeitada pela própria mãe ainda é algo que carrego todos os dias. Apesar de todas as conquistas de Amanda como cantora, não consigo deixar de lembrar da mãe que não esteve presente nos momentos mais difíceis da minha vida.

Sinto uma mistura de emoções ao vê-la se aproximar — amor, saudade, e uma ponta de esperança de que, talvez, possamos encontrar um caminho de volta uma para a outra. Ao mesmo tempo, há um medo constante e uma raiva latente pelo abandono que sofri. Não sei se estou pronta para perdoar ou se quero permitir que ela volte à minha vida.

"Oi, Thayse", murmura ela, se aproximando, a voz suave e carregada de nervosismo.

Eu me levanto, tentando controlar o turbilhão de emoções dentro de mim, e forço um sorriso. "Oi!"

Ela me olha de cima a baixo, com um brilho nos olhos que mistura orgulho e tristeza. "Você está tão linda."

Essas palavras, simples e sinceras, fazem meu coração bater ainda mais rápido. É a primeira vez que ouço um elogio dela me tratando pelo pronome correto, e, embora eu queira me manter firme e distante, não posso negar o impacto que suas palavras têm sobre mim. Tento segurar as lágrimas que ameaçam cair e respondo apenas acenando com a cabeça.

SCHOOL FLAMES - TURMA DE 2010Onde histórias criam vida. Descubra agora