Descontrole

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Acordei com o som suave do despertador, mas, ao abrir os olhos, percebi que Beto já havia saído. O apartamento estava em silêncio, e a sensação de solidão era opressiva. Eu ainda me sentia exausta, mas sabia que precisava enfrentar o dia.

Levantei-me e fui para a cozinha preparar algo para o café da manhã, mesmo sabendo que minha fome era apenas um reflexo da preocupação e do medo que estavam me consumindo. Beto havia saído para mais uma operação, e o peso das responsabilidades e a pressão que eu sentia me atormentavam.

Com um suspiro, decidi ir para o voluntariado. O movimento da ONG e as pessoas ao meu redor ofereciam uma distração, embora eu soubesse que estava apenas fingindo que nada estava acontecendo. Mergulhei nas tarefas, tentando esconder a turbulência interna atrás de um sorriso forçado e uma atitude positiva.

Durante o dia, mantive a fachada. Falava com os colegas, ajudava a organizar doações e interagia com os beneficiários com um entusiasmo que não correspondia ao meu estado emocional. Era mais fácil agir como se tudo estivesse sob controle do que enfrentar a realidade que estava me esmagando.

Ao final do dia, fui informada de que o turno estava terminado e que eu poderia ir embora. Deixei a ONG com uma sensação de alívio misturada com esgotamento. Sabia que precisava encontrar Beto, mas a ideia de confrontar minhas emoções e a situação com ele me deixava ansiosa.

Quando cheguei ao pé do Morro dos Macacos, Beto estava lá, esperando por mim. Ele estava com um olhar preocupado e uma expressão de ansiedade que eu conhecia bem. O contraste entre o que eu via e o que sentia era marcante. Ele havia vindo até ali para me buscar, e isso fez meu coração se apertar.

— Oi — disse eu, tentando manter a voz calma, apesar da tensão interna.

— Oi. — Beto se aproximou e me envolveu em um abraço apertado. — Estava preocupado com você. Como foi o dia?

Senti-me protegida e sobrecarregada ao mesmo tempo. A presença dele, a preocupação e o cuidado eram intensos demais, e algo dentro de mim começou a se rebelar.

— Beto, por favor, você está agindo como se eu fosse uma criança — falei, a frustração evidente na minha voz. — Não sou uma "mimada" que precisa ser vigiada o tempo todo. Sinto como se estivesse sendo tratada como se eu não pudesse lidar com nada.

Beto olhou para mim com uma expressão de surpresa e confusão.

— Entra no carro — ordenou ele, sua voz carregada de um tom autoritário. — Não tenho tempo para discutir agora.

Eu hesitei, o sentimento de estar sufocada e controlada começando a se intensificar. Beto percebeu minha hesitação e, com um olhar firme, acrescentou:

— Quando eu tirei você de casa, prometi que cuidaria de você. É isso que estou tentando fazer a porra do tempo todo. Não entendo por que você está agindo assim. Você está me afastando e eu nem sei o motivo disso.

Senti um aperto no peito ao ouvir suas palavras. A frustração e a dor que eu estava sentindo explodiram.

— Eu não sou uma criança! — gritei. — Você está me tratando como se eu não pudesse tomar uma decisão por mim mesma. Sinto como se estivesse sendo sufocada, e isso está me matando!

Beto se aproximou ainda mais, a expressão dele misturando preocupação e irritação.

— Júlia, eu não estou entendendo esse seu comportamento. Eu só quero te apoiar e te proteger. O que eu estou fazendo de errado? A gente vai ter um filho juntos, caralho.

Sua pergunta me fez sentir uma onda de culpa e desespero. Eu sabia que ele estava tentando ajudar, mas a sensação de estar sobrecarregada pela proteção dele estava se tornando insuportável.

— Eu só preciso de espaço para lidar com tudo isso — falei, a voz embargada. — Não estou pedindo para ser abandonada, mas sinto que não posso respirar com essa intensidade toda.

A sensação de estar superprotegida se tornou insuportável, e eu explodi.

— Você é um psicopata! — gritei, a frustração e a sensação de ser sufocada dominando minha voz. — Está agindo como se eu fosse uma criança que precisa de controle o tempo todo.

Beto ficou em silêncio por um momento, claramente chocado com minha reação. Seus olhos se estreitaram, e ele deu um passo em minha direção, sua expressão misturando irritação e desespero.

— Então, sou um psicopata, é? — disse ele, o tom carregado de um sarcasmo amargo. — E você, Júlia, está fazendo um drama por causa de uma gravidez. Achou que transar sem camisinha com quem você vive ia resultar em quê? Uma viagem para o paraíso?

Ele se aproximou ainda mais, encostando-me contra o carro. Com um gesto decidido, pegou no meu pescoço, seu toque firme e dominador. O gesto inesperado e a força dele me fizeram ficar em silêncio, interrompendo a minha tentativa de responder.

— Você acha que pode simplesmente ignorar a realidade? Eu te tirei de casa porque me importo com você e com o que estamos passando. E agora, você está me tratando como se eu fosse o inimigo, enquanto você faz um drama por algo que é uma parte inevitável da vida!

Eu tentei falar, a voz embargada, mas Beto interrompeu meu discurso com uma intensidade implacável.

— Te amo, sua piranha mimada — murmurou ele contra meu pescoço, seu tom misturando raiva e afeto. — Não estou entendendo por que você está tão rebelde, mas isso não muda o fato de que estou aqui para te apoiar.

O beijo, combinado com suas palavras, era intenso e possessivo. Meu corpo reagiu ao toque dele, mas o sentimento de sufocamento e a mistura de emoções eram avassaladores. A força com que ele me segurava e a sinceridade do seu afeto me deixaram em um estado de confusão

Laços Invisíveis | capitão nascimentoOnde histórias criam vida. Descubra agora