sayin' nothing, that's enough for me

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Os dias que se seguiram depois daquela conversa sobre a mudança do Zero para Taubaté foram estranhos. Não tínhamos mais a mesma leveza de antes. Ele sempre voltava ao assunto, de maneira sutil, mas sempre sugerindo que, se eu fosse com ele, tudo ficaria perfeito. "Seria bom em todos os sentidos", ele dizia. "Estaríamos dando um passo importante." Mas eu não conseguia sequer considerar me mudar para um lugar tão longe. Ele tinha conhecidos lá, mas eu não. A verdade é que nada me prendia a São Paulo—meu trabalho podia ser feito de qualquer lugar. Isso era apenas uma desculpa. Eu não me sentia à vontade com a ideia de sair do lugar onde morei desde criança, a Maju e todas as outras coisas que conhecia.

Podia parecer bobo, mas esse apego se tornou o estopim para brigas silenciosas entre nós. Um desconforto que crescia e se instalava no ar, como uma tempestade se formando no horizonte. E então veio o dia em que o Zero assinou o contrato de locação da casa em Taubaté. 

A partir daí, as discussões começaram a ficar mais sérias, e logo se transformaram em verdadeiras batalhas verbais. Zero me acusava de não levá-lo a sério, de não querer dar o próximo passo. "Você não entende?" ele gritava, a voz tensa, carregada de frustração. "Eu estou tentando construir algo com você, mas parece que você está com os pés colados no chão, sem vontade de se mexer."

Eu tentava me defender, embora a sensação de estar pisando em terreno instável sempre me deixasse à beira das lágrimas. "Você mal dá tempo para eu me acostumar com a ideia! Quer que eu jogue tudo ao vento e só te siga? Eu também tenho uma vida aqui!"

Essas discussões sempre terminavam da pior forma possível, com a voz de um de nós ecoando pela casa e o silêncio pesado que vinha depois. Eu nunca pensei que seríamos o tipo de casal que grita um com o outro, mas ali estávamos nós, e o Zero já não dormia mais comigo. A intimidade, que antes parecia tão natural, tão fácil, evaporou. Não havia mais clima para isso. Às vezes, eu acordava no meio da noite e, ao estender a mão para o lado da cama onde ele costumava estar, só encontrava o vazio. Era um vazio que refletia a crescente distância entre nós.

Apesar de tudo, sempre acabávamos fazendo as pazes, como se aquele gesto de reconciliação pudesse apagar as cicatrizes das brigas anteriores. Mas eu sabia que isso era temporário, que a calmaria era apenas uma pausa até que o assunto voltasse à mente do Zero. E, quando voltava, as mesmas palavras eram ditas, as mesmas acusações, as mesmas justificativas.

A única pessoa que sabia do que estava acontecendo entre nós era a Maju. Ela era minha confidente, a única em quem eu sentia que podia confiar plenamente. Houve uma noite em que fui à casa dela, depois de mais uma dessas discussões com o Zero. Estava chovendo, e eu me lembro de como a água escorria pelo meu rosto, misturando-se às lágrimas que eu não conseguia mais segurar.

"Verônica, o que aconteceu?" ela perguntou, me puxando para dentro.

Eu desabei no sofá da sala dela, tentando encontrar as palavras. "Está tudo desmoronando, Maju", confessei, a voz fraca. "Eu não sei o que fazer. Ele quer que eu vá com ele, que eu largue tudo aqui... mas eu não consigo."

Ela me ouviu, pacientemente, como sempre fazia. "E por que você não quer ir? É só pelo trabalho?"

Balancei a cabeça. "Não... não é só isso. Eu... eu não quero deixar vocês para trás, e as coisas que eu conheço... Não é justo."

Maju ficou em silêncio por um momento, seu olhar fixo no meu. "Você tem que ser honesta com você mesma, Verônica. Não dá para fingir que está tudo bem quando não está. Se você não quer ir, ele precisa entender isso. E você também precisa entender por que não quer ir. De verdade."

Eu sabia que ela tinha razão, mas naquele momento, tudo o que eu conseguia sentir era a dor da escolha impossível que parecia se aproximar. Continuar ao lado do Zero significaria abrir mão de tudo o que me era familiar, e eu não estava pronta para isso. E, quanto mais eu tentava adiar essa decisão, mais as coisas entre nós desmoronavam.

Tão Perto | Lucas InutilismoOnde histórias criam vida. Descubra agora