Tão Perto | Lucas Inutilismo

we're dancing in the flames

4 de Dezembro de 2023

Eu me levantava da mesa, vendo Gabriel se ajeitar para sair. Ele mencionou que estava ansioso para as gravações de 2023 em uma música. Eu não pude evitar sorrir ao ver o entusiasmo dele. "Também estou animado", disse, sabendo que essa seria a última retrospectiva musical que eu faria. Ele se despediu com um aceno rápido, e eu saí do estúdio para encontrar Marcelo, que me esperava do lado de fora. Estávamos planejando sair para comer alguma coisa, e como estávamos no Ipiranga, acabamos decidindo por uma lanchonete ali perto, onde costumávamos ir de vez em quando.

Assim que nos sentamos, Marcelo se ofereceu para fazer o pedido, dizendo que eu podia relaxar um pouco. Aceitei sem pensar duas vezes e fiquei mexendo no celular, rolando distraidamente pelos stories do Instagram. Não demorou muito até eu sentir uma presença ao meu lado, e quando levantei a cabeça, dei de cara com Gabriela, minha ex. Ela estava ali, sorrindo para mim, como se não tivesse sido nada encontrar um fantasma do passado em uma lanchonete qualquer.

"Eu sabia que era você", ela disse, ainda com aquele sorriso de canto que eu conhecia tão bem.

Dei uma risadinha e me levantei para cumprimentá-la. "Pois é, eu mesmo", respondi, tentando manter o tom leve. "Como você está?"

Ela deu de ombros, com aquela expressão casual que sempre teve. "Eu deveria estar te perguntando isso. Soube do acidente de carro em setembro."

"Ah, tô bem", respondi, tentando minimizar a preocupação dela. "Foi só um susto."

Ela pareceu genuinamente aliviada, o que me pegou de surpresa. "Fico feliz em saber", disse, colocando uma mão de leve no meu braço antes de continuar. "Eu já estava indo embora, mas... a gente podia marcar de sair um dia, só pra relembrar os velhos tempos, né?"

Ri da cara de pau dela, mas por dentro, já sabia que isso não iria acontecer. "Claro, a gente combina."

Ela deu mais um sorriso, dessa vez com um toque de nostalgia, e foi embora, deixando um rastro de lembranças que eu preferia esquecer. Assim que ela saiu, Marcelo apareceu com os lanches, olhando para mim com aquela cara de quem já sabia de tudo.

"Era a Gabriela, né?", ele perguntou, sem nem precisar de resposta.

"Sim", suspirei, me jogando de volta na cadeira. "Em carne e osso."

Marcelo riu, entregando meu lanche. "Cara, você tá meio azarado ultimamente, hein?"

Soltei uma risada mais alta do que esperava, balançando a cabeça. "Eu devo ter tacado pedra em Jesus na cruz", brinquei, embora no fundo estivesse começando a me perguntar se não havia mesmo alguma verdade nisso.

Enquanto a gente comia, Marcelo começou a falar sobre coisas aleatórias, tentando manter o clima leve. Eu ia respondendo no automático, sem prestar muita atenção, até que ele soltou: "E aí, já separou a roupa pro casamento da Maju amanhã?"

De repente, o lanche na minha mão parecia mais pesado do que deveria. Suspirei e olhei para o lado, evitando o olhar dele. "Eu não vou no casamento."

Marcelo parou de mastigar e me olhou como se eu tivesse acabado de dizer que estava desistindo de viver. "Como assim, você não vai? A Maju fez questão de falar que queria todo mundo lá."

Eu já estava de saco cheio dessa conversa antes mesmo de começar. Senti a paciência se esgotando e tentei cortar o assunto de uma vez. "Eu não quero falar sobre isso, tá? Muda de assunto."

Marcelo franziu o cenho, parecendo incomodado. "Cara, não precisa se estressar desse jeito. Só tô perguntando. Não é pra tanto."

E foi aí que o silêncio caiu sobre a mesa. Um daqueles silêncios pesados, que a gente sente até no fundo do estômago. Eu sabia que estava sendo injusto com Marcelo, mas a simples menção do casamento da Maju me dava um nó no peito. Desde que Verônica se foi, tudo tinha ficado mais difícil. Eu tinha aprendido a conviver com a ausência dela, mas nunca tinha aceitado de verdade. A falta dela ainda era uma realidade, uma que eu tentava evitar pensar o máximo possível, mas a verdade é que eu não tinha mais esperança de que um dia ela pudesse se lembrar de mim, da gente, do que a gente tinha.