XII. Chamas da vida.

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Não era algo que costumava fazer, mas... dessa vez, não conseguiu evitar.

Felix observava o corpo nu, cada mínimo detalhe de seu próprio reflexo, sentindo-se feliz, irritado, confuso e amado. Tudo aquilo de uma única vez.

Mal percebeu quando lágrimas finas desceram por suas bochechas, abraçou o próprio corpo, sentindo-se envergonhado pelas cicatrizes que ele mesmo tinha dado à si de presente.

As marcas roxas que foram feitas durante as demonstrações intensas de amor, aquilo o fazia sorrir entre as lágrimas. Gostava de se sentir amado, gostava dos toques quentes e apaixonados  de Changbin  e Hyunjin... de saber que mesmo apesar de todos aqueles retalhos espalhados por seu corpo, os garotos o amavam.

O corpo que se tornou delicado e magro por todas as vezes que se negava a comer, avaliando negativamente o próprio corpo, distorcendo de forma inconsciente a própria imagem. Aquilo tudo era sua história. Seu corpo, suas cicatrizes, o desenho imenso em suas costas cravado em sua pele... tudo aquilo era ele.

Secou as lágrimas, sem desviar o olhar. Sorriu fraco, se orgulhava de cada um de seus pequenos e fodidos detalhes, apesar de ser jovem, já tinha visto o inferno de perto, e teve coragem o suficiente para enfrenta-lo.

Suspirou, tratando de terminar de secar-se. Colocou uma boxer e vestiu a camisa branca que Hyunjin havia deixado separada para si, se recostou na batente da porta. Seu pequeno Seo e seu gigante Hyunjin dormiam calmamente, espalhados pela cama improvisada com o colchão que obrigou os meninos a colocarem na "sala".

Nunca imaginaria se sentir tão feliz só por ver duas pessoas. Sorrir só por saber que eles estavam bem.

Mas, agora, era isso que o mantinha em paz.

Seo Changbin e Hwang Hyunjin eram sua paz, sua estrada e seus amores.

"Changbin hyung vai contar... estamos fazendo coisas erradas pelo motivo certo. Vai ficar tudo bem quando falarmos a verdade. Hyunjin também gosta da gente."

Felix repetia para si mesmo essas quatro frases, como um mantra, tentando se convencer de que não estavam sendo cruéis, por mais que seu coraçãozinho lhe falasse o contrário.

Tudo que fazia era por Seo Changbin.

Devia isso à ele, não era apenas lealdade, era por honra e amor, as únicas duas coisas que conseguem iniciar e acabar guerras. E infelizmente, eles estavam parados em frente ao inicio de uma guerra.
Pela primeira vez desde que ouviu o nome Hwang Hyunjin, sentiu o peso de seus atos e remorso por ter feito tudo o que tinha feito, e por ter coragem de continuar o que pretendia.

Mas, agora era tarde demais para voltar atrás... mal-feito, feito.

[ . . . ]



Ainda era dia quando acordou de seu pequeno cochilo, dando de cara com um Felix perdido em seu sono, que parecia bem profundo ao julgar pela babinha fofa que escorria por sua bochecha rosada, e, ao seu lado esquerdo, um Changbin hiper concentrado em jogar Candy Crush.

-Nossa, que dark você...

-Chupa meu pau.- Resmungou, virando a tela do celular para o lado oposto.

-Já chupei, esqueceu?- Zombou, se revirando no colchão até ficar de frente para o Seo.

-Seu irmão volta hoje, né?- Changbin questionou.

-Na verdade, ele voltou ontem a noite.- Deu de ombros, mas, o Seo largou o celular e o fitou um pouco confuso.

-Achei que ia ser hoje.- Suspirou.

-Ele veio mais cedo...- Hyunjin agora se sentia incomodado pelo estranho e repentino interesse de Changbin em Minhyun. -Ei, por que essa cara?

-Nada... só não quero que ele pense que somos más influencias.- Changbin sorriu, voltando sua atenção à tela do aparelho, mas não sentia a menor vontade de continuar a partida.  -Ia ser bem ruim se ele não gostasse dos seus namorados, né?

-Minhyun não gosta de nada que venha de mim, hyung.- Riu. -Ele suporta.

-É o suficiente.

-E ninguém aceita muito bem e de primeira um irmão viado que tem dois namorados, uh?

-Tem razão.- Riu.

O Seo se ergueu, indo em direção ao pequeno frigobar do celeiro, e logo sentiu o moreno em seu encalço. Sua cintura foi envolvida, o Hwang inebriou-se com o cheirinho delicioso que os cabelos do mais velho tinham.

-Vai me contar a verdade ou vai ficar enrolando?- Changbin sentiu como se o coração tivesse acabado de pular, ou melhor, de tropeçar uma batida assim que ouviu o tom sério do Hwang.

Changbin virou-se para o maior, selando seus lábios em um gesto puro. Queria que Hyunjin soubesse que o carinho que passará a sentir por si era tão puro quanto aquilo.

-Antes do Felix...- Changbin sussurrou, escondendo  a vontade de chorar. Odiava falar sobre aquilo, odiava se sentir fraco e impotente. -Eu não tinha ninguém. Yongbok é tudo pra mim.- Sorriu fraco, falando baixo para que Felix sequer sonhasse em ouvir. -Eu... estava prestes à dar um fim à tudo quando o conheci, e ele parecia tão perfeito, tão real... Ele acha que eu o salvei, mas... foi ele que me salvou.

Foi então que a ficha caiu. Changbin não estava indo para um prédio abandonado por mera coincidência... Ele ia fazer exatamente a mesma coisa que o Lee.

-Ele sabe...?

-Não.- Suspirou. -Você é o primeiro à saber. Por que... querendo ou não...  você se tornou muito importante pra mim, Hyunjin.

-Eu também gosto muito de você, Changbin.- Abraçou o menor com força.

Foi nesse momento que se tocou de algo mais que importante, ele estava disposto a segurar uma granada por aqueles dois.

-Mas... você tem que saber o por que. O motivo de eu querer acabar com a minha própria vida, e logo em um lugar daqueles.

-Hyung, tudo bem se não quiser contar.- Já tinha notado o quão difícil era pro Seo se expressar.

-Hyunjin... a minha familia... Os Seo, bom, como eu falo isso sem parecer bobagem? Dizem que carregamos uma maldição.- Riu amargo da própria frase. -Que carregamos conosco o sangue de todos que entram em nosso caminho. É como se sempre queimassemos tudo que amamos, destruímos tudo aquilo que pode ser sinal de fraqueza... mas, eu não quero isso.

Hyunjin analisava a face desgostosa do mais velho, tentando distinguir se aquilo era uma piada idiota dele o não.

-Minha mãe matou meu pai. Eu sei disso, mesmo que não possa provar.- Bufou, fazendo a expressão do Hwang se tornar ainda mais assustada. -Park Jinyoung ferrou comigo a vida inteira. Convenceu ela a tirar meu pai de mim... tirou Minhye de mim, quer tirar todos os direitos que eu tenho sobre o que é meu por sangue, e... agora, quer tirar Felix de mim.

-Changbin, como assim?

-Ele está roubando a minha família... bom, na verdade, minha mãe está cega, está dando tudo que é nosso à ele.- Respirou profundamente, tentando ao máximo acalmar seus pensamentos, e depois de uma longa pausa, voltou a falar: -Eu só quero vingança, Hyunjin.

-Ei, nós podemos dar um jeito nisso...

Ficaram por longos segundos abraçados, em um silencio profundo que nem um dos dois ousou quebrar. Hyunjin tinha tantas perguntas para fazer, mas... podia segura-las por alguns minutos.

-Hyunjin, nós realmente gostamos de você...- O Seo disse constrangido. -Eu gosto de você. Quero que saiba disso, independente da merda que eu fizer ou falar...

O moreno não respondeu nada, apenas o abraçou mais forte. Naquele momento, Seo Changbin, o cara durão, com fama de quem poderia estragar uma vida escolar e social inteiras com apenas um estalar de dedos, parecia o ser mais frágil do mundo, abraçando-o como uma pelúcia.

Hyunjin entendia aquele garoto tatuado e revoltado em seus braços. Ele sentia aquela dor fantasma se espalhando em sua alma, sem lhe deixar dormir.

Seo Changbin não queria apenas vingança, ele queria lutar pela honra de quem amava. Queria apagar as chamas de sua vida, lavar todo aquele sangue para que talvez conseguisse dormir a noite...

Deixar que todos aqueles mortos finalmente achassem uma saída.

Os Garotos de Choker ❧𝕮𝖍𝖆𝖓𝖌𝖏𝖎𝖓𝖑𝖎𝖝Onde histórias criam vida. Descubra agora