Continuação do capítulo anterior
Alcancei o limite de escrita 🥸
— Não sei exatamente de onde vem o veneno, mas tenho minhas suspeitas. — Ele me observou por um longo momento, como se estivesse ponderando o quanto deveria revelar. — Corpos. — A palavra saiu como um golpe, seca, brutal. — Sem recursos, sobrevivência exige medidas extremas. Talvez eles tenham matado alguns e jogado os corpos no riacho.Meu estômago revirou violentamente. Crianças seriam capazes disso? Eu não queria acreditar, mas algo no tom dele me dizia que sim. As crianças que estávamos enfrentando, criadas neste ambiente cruel, faziam o que fosse necessário para sobreviver. Era horrível. Macabro.
— Espero que esteja errado. — murmurei, a voz carregada de angústia. A simples ideia de encontrar corpos jogados no rio me causava um medo paralisante.
Seria uma cena terrível de presenciar.
Ele assentiu, o rosto impassível, mas algo em seu olhar me dizia que ele já havia visto coisas piores. Lentamente, ele se levantou, seus movimentos calculados, cada gesto carregado de propósito.
— Vamos. — A única palavra saiu como uma ordem, e, apesar do medo que me consumia, segui seus passos, sabendo que não havia mais tempo para hesitações.
...
A cena diante dos meus olhos era algo que ultrapassava os limites da compreensão humana. O estômago deu uma volta completa, como se alguém o tivesse torcido com as próprias mãos. Tudo dentro de mim parecia se contorcer em repulsa pura e imediata.
O cheiro? Era inigualável. Forte, amargo, carregado de podridão, como se a própria terra estivesse tentando expulsar os horrores que agora infectavam o riacho. Era um odor que parecia invadir meus sentidos, penetrando minha pele, se agarrando a tudo que eu era. Podre. Não havia outra palavra para descrever. Um cheiro que trazia consigo a marca da morte, do abandono, e da crueldade. E os corpos... em pedaços.
O riacho, que deveria ser uma passagem serena pela natureza, entre árvores que se estendiam como guardiãs do local, estava completamente maculado. A água, que em algum momento fora clara e fluida, agora corria turva, manchada de sangue, misturada com a carne apodrecida das vítimas. As margens, onde as folhas deveriam estar flutuando suavemente, estavam agora preenchidas com partes de corpos, espalhadas de maneira grotesca. Irreconhecíveis.
Levei a mão ao rosto, quase instintivamente, em uma tentativa desesperada de bloquear o cheiro. Meus dedos tremiam ao apertar meu nariz, tentando conter o horror que vinha de todas as direções. O gosto amargo de bile já estava subindo na minha garganta, e o pavor que crescia dentro de mim ameaçava me sufocar. Feição de completo horror. Meu corpo inteiro estava rígido, como se qualquer movimento me forçasse a vomitar tudo o que ainda restava dentro de mim.
Não era só o cheiro que me fazia mal, era a visão do massacre. As vítimas estavam repartidas, mutiladas de uma forma que fazia meu coração afundar em um poço escuro e profundo. Algumas partes de corpos estavam flutuando nas águas, enquanto outras estavam presas entre as pedras, como se até mesmo a natureza estivesse tentando segurá-las, incapaz de deixá-las ir.
O que eu havia comido antes? Eu não conseguia nem lembrar. A única coisa que conseguia pensar era que queria tudo fora de mim, queria vomitar até que não restasse mais nada. Meu estômago se contraía violentamente, mas eu lutava para me manter no controle. Meus olhos ardiam, não só pelas lágrimas que tentavam brotar, mas pela intensidade do cheiro, que parecia queimar minhas narinas, como ácido.
Ivar, no entanto, estava parado, imperturbável. Seus olhos observavam a cena diante dele com uma frieza que eu não conseguia compreender. Ele não estava enojado, nem abalado. Na verdade, havia algo na maneira como ele observava que me fez questionar se ele já tinha visto algo pior. Talvez tivesse. Ele apenas encarava tudo como se fosse um obstáculo, um desafio que precisávamos superar.
Quando ele finalmente se virou para mim, não havia uma única expressão de tristeza ou horror em seu rosto. Nem um traço de emoção. Ele parecia... indiferente. O que estávamos presenciando era apenas mais uma coisa a ser resolvida.
— É... — Ele começou a andar em minha direção, com os passos firmes, mas sem pressa, como se o tempo ali não fosse uma questão. Antes, ele havia se aproximado do rio, inspecionando as águas, talvez buscando alguma explicação ou uma pista do que havia acontecido. Eu nem ousei me aproximar. A mera ideia de chegar perto do riacho, de sentir o cheiro ainda mais forte, de ver de perto aqueles corpos despedaçados... Não, meu corpo não aguentaria.
Ele parou diante de mim, suas mãos foram para a cintura, e seu olhar encontrou o meu com uma calma quase perturbadora.
— Isso é um problema. — A maneira como ele disse isso, com uma simplicidade que me deixou ainda mais desnorteado, como se estivéssemos lidando com algo mundano, uma pequena complicação em nossos planos, me fez querer gritar. Era muito mais do que um problema.
Continuei com a mão pressionada contra o rosto, segurando o fôlego, tentando evitar a sensação de que tudo dentro de mim estava prestes a desmoronar. O cheiro parecia entrar em cada poro do meu corpo, como se estivesse se infiltrando até nos meus ossos.
Eu não conseguia entender como ele conseguia falar tão calmamente, como ele conseguia sequer respirar sem ser engolido por aquele odor pútrido. Tentei falar, mas a única coisa que saiu de mim foi um som baixo, rouco, um grunhido.
Minha garganta queimava, e quase me engasguei ao tentar articular uma palavra. Mas não havia o que dizer. A cena diante de nós falava por si só, e tudo o que eu queria era fugir, deixar aquilo para trás, mas sabia que não havia para onde correr.
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Coração Forjado
RomanceREMAKE da primeira versão de Coração Forjado!!! O príncipe Mael vivia uma vida de privilégios e deveres, até ser arrancado brutalmente de sua corte e lançado ao coração gelado das terras vikings. Cativo de guerreiros selvagens, ele luta contra o fri...