Eu não resisto.
Sinto o momento exato em que meu corpo desiste de lutar contra a náusea esmagadora que tomou conta de mim desde que meus olhos captaram aquela cena grotesca. O horror se arrasta pela minha garganta, queimando tudo em seu caminho. Quase peço desculpas, como se isso pudesse amenizar o vexame. Mas não há tempo. É muito para meu estômago, para meus olhos, para meus sentidos. Tudo ao meu redor parece se comprimir, e a única coisa que posso fazer é me virar abruptamente, antes que a vergonha e o nojo me engulam de vez.
O vômito vem rápido e forte, sem aviso, explodindo de mim com uma força que eu não sabia que tinha. Me agarro ao primeiro pedaço de neve que encontro, quase caindo de joelhos, enquanto meu corpo se contrai de maneira involuntária, expelindo tudo o que ainda restava dentro de mim. Sinto o impacto na minha garganta e no estômago, que parecem se contorcer ao máximo, forçando-se a esvaziar mesmo quando não há mais nada.
O som é humilhante. Um barulho áspero, vergonhoso, que ecoa pelo espaço vazio ao nosso redor. Queria desaparecer, me esconder em algum lugar onde ele não pudesse me ver assim, tão frágil e exposto. É a primeira vez que vomito diante de alguém que não seja um servo ou um médico, e a vergonha me atinge com a mesma intensidade da náusea. Minha barriga doi, o corpo todo treme enquanto luto para manter alguma dignidade em meio ao caos que é estar tão vulnerável.
Então, sinto a mão dele nas minhas costas. Não é um toque invasivo, mas um gesto firme, cheio de compreensão. Ele não diz nada, apenas fica ali, presente, apoiando-me com uma calma que me faz desejar que ele tivesse dado as costas. Eu preferia que ele ignorasse essa cena, que fingisse não estar vendo a minha humilhação se desenrolar diante dele. Mas, ao mesmo tempo, há algo reconfortante no fato de ele estar ali, de que, apesar de tudo, ele não me julgava. Ele compreendia.
Eu continuo com o rosto abaixado, os olhos apertados, tentando controlar a respiração que ainda está irregular. Meu corpo todo se recusa a se mover, como se cada músculo estivesse congelado pelo constrangimento e pelo esgotamento. Levo alguns momentos para reunir forças, até que finalmente me sinto estável o suficiente para me levantar lentamente, mas ainda sem conseguir olhar diretamente para ele. A vergonha é esmagadora.
Quando ergo a cabeça, tentando respirar fundo, Ivar já se afastou. Ele se move com aquela mesma calma controlada de sempre, pegando um punhado de neve fresca nas mãos. Eu observo em silêncio, esperando o que ele vai fazer, ainda me sentindo vulnerável demais para perguntar. Ele se aproxima de novo, estendendo a mão com a neve branca em minha direção.
— Esfregue na boca até derreter. — Sua voz é serena, como se a situação não o afetasse nem um pouco. — Vai ajudar a limpar, e tirar o gosto ruim.
Eu só consigo assentir. Não há mais palavras dentro de mim. Levanto a mão trêmula, e ele deposita a neve com cuidado na minha palma. O frio da neve contra meus lábios traz um alívio imediato, cortante, mas necessário. A limpeza é eficaz, o gosto amargo que estava impregnado na minha boca começa a desaparecer, lentamente, mas a sensação de desconforto no estômago ainda permanece, como uma lembrança persistente do que acabei de passar.
Ele me olha por um momento, avaliando meu estado, mas sem qualquer traço de julgamento. Seus olhos, sempre frios, agora parecem ser apenas... práticos. Como se estivesse esperando que eu me recuperasse para poder continuar.
— Essa reação… é o objetivo deles. — Ele diz de repente, quebrando o silêncio enquanto volta seu olhar para o riacho tingido de vermelho. — Mas você vai se acostumar.
Acostumar? A palavra reverbera na minha mente como uma sentença. Me acostumar com isso? Com a visão de corpos despedaçados, com o cheiro da morte impregnando o ar, com o sabor de vômito e terror na boca? A ideia de que eu poderia, de alguma forma, me adaptar a essa realidade me assusta mais do que o que vi. Eu não quero me acostumar. Não quero que essa seja a nova norma. Prefiro a tranquilidade do meu lar, longe de tudo isso, longe da morte, do desespero, da brutalidade.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Coração Forjado
RomanceREMAKE da primeira versão de Coração Forjado!!! O príncipe Mael vivia uma vida de privilégios e deveres, até ser arrancado brutalmente de sua corte e lançado ao coração gelado das terras vikings. Cativo de guerreiros selvagens, ele luta contra o fri...