Na margem da liberdade

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Eu estava enjoado, o mal-estar era um constante martelo de ferro em meu estômago, mas eu me esforçava para manter meu corpo firme, apesar de seu ritmo lento e vacilante. Minha mão repousava sobre a barriga, como se essa pequena ação pudesse de algum modo ajudar-me a sustentar o peso da minha própria existência. A neve ao redor, acumulada nas margens do rio, parecia um terreno traiçoeiro, escorregadio e ao mesmo tempo grudento, emanando um odor nauseante que se enredava nas minhas entranhas.

Era difícil encarar a realidade à minha frente, onde outros se moviam com uma graça e força que eu sentia faltar em mim. Suas pernas eram robustas e firmes, enquanto eu me sentia cada vez mais diminuído, minha fraqueza se tornando um peso constante. O campo carmesim, agora visível apenas pelo canto dos meus olhos, forçava-me a desviar o olhar para longe da calamidade que se desenrolava ao meu lado. O sol se escondia atrás das nuvens, lançando uma luz opaca que parecia apenas acentuar meu estado lamentável.

Em meio ao cansaço e à desesperança, eu lutava para me erguer, para construir uma força interior a partir dos fragmentos de minha determinação. Era uma tentativa de assimilar e transformar o que eu desprezava em uma força para minha própria sobrevivência. A visão do rapaz diante de mim, com a chama da vida ardendo em seus olhos, era como uma história contada por um bobo da corte em meu castelo — um conto de bravura que eu não queria mais ouvir. Contudo, a sensação de instabilidade permanecia, uma sombra constante ao meu lado, uma lembrança viva da minha própria falha.

Fechei os olhos e me forcei a ignorar a dor e o cansaço. Meu rosto encontrou o chão, o beijo gelado da terra me lembrava da minha fraqueza. O solo frio e lamacento parecia consumir minha força, e a escuridão que me envolvia era uma confirmação cruel de que eu não havia sido forte o suficiente.

Estava eu estendendo as mãos para alcançar algo que já não me pertencia?

Houve um momento de vazio absoluto, onde tudo ao meu redor se desfez em uma névoa indistinta. Então, de algum lugar profundo, uma pergunta perturbadora surgiu em minha mente: eu estava tentando alcançar algo que já não me pertencia? Era um pensamento amargo, uma mistura de desespero e resignação. Talvez a resposta estivesse no próprio vazio, naquele espaço entre querer permanecer e desejar escapar de tudo. Sentia falta das muralhas do meu castelo, da segurança e da estabilidade que elas proporcionavam. Mas, ao mesmo tempo, não conseguia entender por que deveria retornar a um lugar que me deixou ir tão facilmente.

Minha irmã... Ah, minha irmã. A guerreira destemida, imbatível no campo de batalha, com uma destreza que superava a de cinco homens juntos. Ela era o orgulho do reino. E, no entanto, falhou. Falhou em proteger o futuro de nossa linhagem, falhou em defender o trono que era meu por direito. Agora, enquanto eu caía, apontava para ela. A culpa era dela. Sempre seria. Ela havia condenado nosso reino e nossa linhagem. Wessex, uma vez uma fortaleza imponente, agora era uma sombra de sua antiga glória. Os bárbaros haviam rompido nossas defesas com machados simples, sem escudos, apenas com a força bruta de sua coragem. Esse pensamento enchia-me de uma raiva devastadora. Raiva suficiente para destruir Wessex e reconstruí-lo do zero, mais forte, mais puro, inquebrável. E talvez eu devesse.

O toque em meu ombro foi o que me trouxe de volta à realidade. Era suave, quase reconfortante, como o calor de uma chama distante. Abri os olhos lentamente, sentindo a textura úmida e fria da lama sob meu corpo. A neve havia desaparecido, substituída por um chão lamacento e frio. O abrigo improvisado sobre nossas cabeças era frágil, mal protegido contra o frio cortante. Havia um pequeno fogo ao nosso lado, uma chama bruxuleante que simbolizava o tempo que havíamos perdido. Tempo que, sem dúvida, eu havia desperdiçado ao desmaiar.

— Por que parou? — minha voz saiu rouca e fraca. Eu sabia que deveria soar mais firme, mas meu corpo estava traindo meus desejos.

— Você caiu. E não acordou. — ele respondeu, agachado ao meu lado, sua voz tranquila e quase indiferente ao meu estado. — Achei que estivesse morto. Mas, pelos deuses, você ainda respirava.

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