Em pouco tempo, eu me vejo forçado a aceitar essa nova realidade — embora o termo “aceitar” seja um tanto exagerado. Se é possível chamar esse cubículo de lar, estou longe de fazê-lo. As paredes parecem mais próximas a cada hora que passa, e, com o tornozelo acorrentado e um braço praticamente inutilizado, a ideia de liberdade se torna algo tão distante quanto a memória de um lugar decente para se viver. Cada movimento é uma tortura; a dor me consome em ondas tão intensas que mal consigo respirar, e a falta de algo melhor para fazer só torna tudo isso ainda mais insuportável.
Três dias. Há três dias que estou trancado aqui, numa rotina que quase me mata de tédio: levanto da cama, arrasto-me até a mesa para engolir algo que chamam de comida, e passo o resto do tempo apenas... existindo. O quarto é uma visão deprimente, sem ornamentos ou qualquer sinal de vida. A cama encostada na parede é o único lugar de descanso, e a cômoda de madeira, de acabamento simples, parece ter sido feita às pressas por mãos nada habilidosas. No canto, um banco pequeno e de madeira rude, com uns panos coloridos dobrados. Eles me intrigam, talvez algum tipo de cobertura improvisada, mas são ásperos demais para servirem de cobertores. Na verdade, sequer consigo imaginar para que servem; talvez, assim como tudo aqui, sejam apenas uma provocação.
Mas o tédio é o pior dos meus castigos. Nem livros para ler. Nesse lugar, parece que o conceito de leitura é uma lenda — pergunto-me se já ouviram falar em papel ou tinta. Um toque de civilidade que, evidentemente, não têm a menor intenção de adotar. E por mais que a realeza acumule objetos preciosos, sou forçado a pensar que esses bárbaros têm uma certa habilidade em fazer as coisas sumirem sem deixar rastro. Afinal, se podem ter a audácia de me manterem acorrentado aqui, o que os impediria de roubar uma mísera caneta tinteiro?
Estou largado na cama, gastando cada segundo de silêncio para cultivar essa sensação de exaustão e me permitir sentir o peso de cada músculo inerte. Jamais pensei que fosse me ver assim, vegetando em cima de um colchão tão rude que parece uma pedra. E pensar que, tantas vezes, eu ri do meu avô por se recusar a usar as pernas depois de uma lesão. Sempre dizia que eu devia valorizar minha juventude enquanto os muros do reino ainda nos protegiam. E, claro, eu sempre descartava seus conselhos com um aceno impaciente. Mas agora… agora eu entendo. E o velho tinha razão. Estou mais cansado que ele jamais esteve, e o tédio se arrasta como uma corrente que me prende mais do que esse tornozelo machucado.
O som da porta se abrindo rompe meu devaneio, um rangido irritante que ecoa pelo quarto e me faz querer enfiar a cabeça no travesseiro. Me mantenho estirado, braços e pernas esparramados, fazendo questão de demorar para abrir os olhos. Sei exatamente quem entrou, sem precisar olhar. O cheiro dele já está impregnado em cada canto dessa cama, como um lembrete constante e arrogante de que ele tem controle sobre tudo ao meu redor.
— Trouxe comida — ele rosna, com o baque seco do prato sendo jogado sobre a mesa ao lado. — Espero que coma e não faça mais exigências. Não está no seu castelo de ouro. Da próxima vez, vai comer as migalhas dos porcos.
O tom dele é um sibilo quase ameaçador, e, com isso, acabo cedendo e abro os olhos, encarando-o com uma expressão de desdém. Minha voz sai carregada de sarcasmo.
— Chama de ‘exigência’ pedir algo que pareça comida de verdade agora? — Ergo uma sobrancelha, deixando bem claro o quanto acho ridículo o comentário. Quem, em sã consciência, iria querer comer pão duro como se fosse por escolha?
Ele me fuzila com um olhar ameaçador, aqueles olhos frios estreitando-se, sem que ele precise mover um músculo. Ainda bem que ficou no lugar, porque a última coisa que quero é ele se aproximando mais. Mas o olhar é o suficiente: é um aviso claro, como se tentasse reforçar a ideia de que não tenho o direito de reclamar ou exigir nada aqui.
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Coração Forjado
Storie d'amoreREMAKE da primeira versão de Coração Forjado!!! O príncipe Mael vivia uma vida de privilégios e deveres, até ser arrancado brutalmente de sua corte e lançado ao coração gelado das terras vikings. Cativo de guerreiros selvagens, ele luta contra o fri...