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O quarto estava silencioso, exceto pelo som suave da respiração de Pete enquanto ele cuidava do meu ferimento. Eu o observava deitado na cama, cada movimento dele meticuloso e cuidadoso. Ele mantinha os olhos fixos na tarefa, mas eu sabia que a mente dele estava longe, em outro lugar. Pete estava tentando se manter forte, mas algo dentro de mim gritava que ele estava desmoronando aos poucos.

- Você tá bem? – Perguntei.

Ele congelou por um momento, a mão parando no meio do movimento, como se a minha pergunta tivesse atingido algo profundo. Ficou em silêncio por um tempo, o suficiente pra me deixar inquieto. Eu me inclinei um pouco, tentando enxergar o rosto dele, mas ele ainda não me olhou. Pete suspirou, voltando a mexer no curativo, mas dava pra ver que agora ele estava hesitante, como se as mãos tremessem.

- Tô tentando ficar. – Ele murmurou, quase sem vida, como se as palavras fossem um esforço.

Cada palavra dele me atingia como um soco. Ver Pete tão quebrado, tão vulnerável, me destruía por dentro. Ele sempre tentava ser forte, esconder o que sentia, mas agora, era como se a máscara dele estivesse caindo de vez. Eu queria fazer algo, qualquer coisa, pra tirá-lo daquele estado, mas, porra, eu tava ali, deitado, ferido, incapaz de protegê-lo como deveria.

- Pete... – Comecei, mas as palavras morreram na minha garganta.

Eu o vi se esforçar tanto pra segurar as lágrimas, mas agora parecia que todo o peso do mundo tava nas costas dele.

- Pete... – Repeti, tentando chamar a atenção dele de novo. – Olha pra mim, por favor.

Ele finalmente parou o que estava fazendo e levantou os olhos, com o rosto cansado, os olhos vermelhos de tanto segurar o choro. Ele parecia tão frágil naquele momento que eu quis me levantar da cama e abraçar ele, mas o meu corpo não ajudava.

- Eu não sei como lidar com isso, Vegas. – Ele sussurrou, a voz trêmula. – Cada vez que eu tento esquecer... tentar seguir em frente... parece que algo me puxa de volta pra aquele pesadelo.

Eu fechei os olhos por um segundo, sentindo um nó na garganta. Eu odiava ver Pete assim, tão perdido e machucado.

- Eu queria ter te protegido de tudo isso desde o começo, Pete. – Minha voz saiu pesada de culpa. – Eu deveria ter feito mais.

- Não é culpa sua. – Ele falou. - Eu só... – Ele respirou fundo. – Só não consigo parar de pensar no Alejandro, no que ele fez comigo. Saber que ele era meu pai biológico me destrói. Eu odeio isso.

- Ele pode ter sido seu pai biológico, Pete, mas ele nunca foi seu pai de verdade. Ele nunca teve o direito de te tratar assim, nunca. Você tem uma família, e eu tô aqui. Eu sempre vou estar.

Ele assentiu, mas o olhar dele ainda tava perdido.

- Eu só queria que isso acabasse, Vegas. Eu só queria esquecer tudo.

- E vai acabar, amor. Vai

- Eu nunca esqueci daquelas mãos nojentas... – Ele murmurou entre soluços. – Tocando em mim quando eu era só uma criança. E depois... como adolescente... Eu cresci nesse inferno, Vegas. Eu cresci achando que isso era normal, achando que não tinha saída.

- Pete... - Eu sussurrei, mas ele continuou, como se precisasse tirar tudo aquilo pra fora.

- E eu tentei esquecer, sabe? Eu tentei por tanto tempo. Mas eu nunca consegui. - As lágrimas dele caíam sem parar. - Toda vez que ele tocava em mim, eu queria morrer. E agora mesmo depois de morto, ele ainda me assombra. Eu não sei se um dia vou conseguir escapar disso, Vegas.

Eu queria tanto fazer alguma coisa, qualquer coisa, pra aliviar aquela dor. Queria tirar ele dali, arrancar aquele sofrimento com as minhas próprias mãos. Mas o que eu podia fazer? O passado não podia ser apagado, e eu não tinha o poder de fazer isso desaparecer.

Corazón de niño, alma de hombre - VEGASPETE Onde histórias criam vida. Descubra agora