O Sono dos Que Não Veem

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Adormece enquanto o mundo é destruído.
Há um silêncio, quase sagrado,
onde o tempo não alcança.
Mas o que o tempo é,
senão o vazio entre uma ruína e outra?
A terra, aquela terra que foi prometida,
não mais pertence aos que a esperavam.
Ela, agora, está lavada.
Mas o que lava mais fundo que o sangue?
O sangue deles. Ou seu.
Mas quem conta?

O que foi prometido,
se não um reflexo incerto?
Dizem que o chão já não acolhe sementes,
que o solo se fechou como os olhos dos que dormem.
Mas o sono é tão tranquilo,
e os que dormem não sabem das cicatrizes
marcadas sobre o solo que uma vez foi deles.
Ou será que sabem,
e preferem não se lembrar?

Não se vê o que se destrói,
nem se ouve o som das raízes que se rompem,
como ossos que não mais sustentam corpos.
Quem vigia a noite?
Não quem dorme, certamente.
Nem quem sonha, pois os sonhos são apenas ecos
do que nunca foi,
do que poderia ter sido.

Adormece,
enquanto eles pisam sobre a terra úmida,
enquanto o sangue seca em cicatrizes que não são suas.
Há conforto na ignorância,
um abrigo na destruição,
quando não é você que sente o calor do fogo,
mas apenas o calor de um corpo que não mais se levanta.
E quando acordar,
se acordar,
a terra será outra.
Mas o sangue ainda será o mesmo.

O Enigma do SerOnde histórias criam vida. Descubra agora