28

4 2 0
                                    

A biblioteca Sulfuric, uma das mais antigas do reino, era um santuário para aqueles que buscavam conhecimento, mas para Elara, era mais que isso - era um refúgio de poder, um local onde ela podia sentir o pulso de sua herança vibrando em cada partícula de ar. As estantes, altas e majestosas, quase tocavam o teto abobadado, e cada prateleira parecia guardar não apenas livros, mas segredos há muito esquecidos. O chão de mármore, polido ao longo dos séculos, refletia o brilho suave das luzes mágicas que pairavam no ar, iluminando o espaço com uma luz tênue e encantadora.

Elara adentrava aquele espaço com uma sensação de familiaridade, como se estivesse voltando para o lugar que verdadeiramente a acolhia. Era uma sensação que ela não experimentava em outro lugar, nem mesmo em seus aposentos na Academia. Ali, sozinha, cada passo era absorvido pelo silêncio e pelo poder que emanava das páginas e dos grimórios ancestrais. Sentia uma conexão profunda com aquela biblioteca, como se as paredes guardassem os ecos de sua própria alma.

Ela caminhou lentamente até o centro do salão, onde um lustre colossal de cristal pendia do teto, emanando uma leve cintilação mágica. Seus dedos delicados percorriam as prateleiras, sentindo a energia fluir dos livros. O cheiro de pergaminho antigo, misturado à fragrância suave de incenso mágico, preenchia o ar, acentuando a atmosfera mística do lugar.

Era ali que Elara se sentia mais viva, mais conectada a tudo o que ela sabia que era - e ainda mais ao que desejava se tornar.

Ao subir para o andar superior, seus olhos se fixaram em uma figura familiar. Seu pai, Ivor Sulfuric, estava sentado em uma das poltronas de couro escuro, com um livro aberto em seu colo. A luz suave iluminava seu rosto, destacando suas feições sérias e pensativas. Ele parecia imerso em algo, um texto de grande importância.

Elara se aproximou silenciosamente, quase sem fazer ruído, mas Ivor ergueu os olhos assim que a sentiu por perto. Ele fechou o livro suavemente, como se guardasse um segredo precioso.

"Pai," a voz de Elara foi baixa, respeitosa, mas cheia de curiosidade. "O que você está lendo?"

Ele a observou por um instante, como se estivesse avaliando se deveria compartilhar o conteúdo daquele livro com ela. Sua expressão era calma, mas seus olhos carregavam uma profundidade que sugeria que o que estava prestes a revelar era algo muito além do que qualquer conversa casual de pai e filha.

"Este é um livro que muitos acreditam ser apenas lenda," disse ele finalmente, tocando a capa com reverência. "Mas nós, Sulfuric, sabemos que há verdades escondidas nas histórias mais antigas." Ele abriu o livro, expondo páginas cheias de símbolos intricados e desenhos detalhados de seres majestosos e assustadores. "Ele fala de tempos antigos, de reinos passados, onde os dominantes não eram simples humanos. Eles eram... algo mais."

Elara inclinou-se para olhar melhor. As imagens retratavam figuras poderosas, seres com asas magníficas, envoltos por auras brilhantes, ao lado de criaturas envoltas em sombras, com olhares ferozes. Cada traço daqueles desenhos parecia conter uma força própria, como se tentassem contar uma história há muito esquecida.

"Quem são eles?" Elara perguntou, sua curiosidade crescente.

"Anjos, arcanjos... demônios. Esta é a história de uma linhagem antiga, Elara. Uma linhagem que se perdeu nas dobras do tempo. E... é também a história de nossa família."

Ela franziu o cenho, tentando compreender o que ele estava insinuando. "Nossa família?"

Ivor assentiu lentamente. "Os Sulfuric descendem dos Nephilim, Elara. Somos o produto da união entre arcanjos e demônios. Esse sangue corre em nossas veias. É por isso que nossa magia é diferente. Mais poderosa. Mas também mais perigosa."

Elara ficou em silêncio por um momento, permitindo que aquelas palavras ecoassem em sua mente. Descendentes de Nephilim. Aquilo explicava tanto, e ao mesmo tempo, abria novas questões. Sempre sentira que havia algo de único em sua família, mas essa revelação era maior do que qualquer coisa que ela imaginara.

"Mas por que isso foi escondido de nós?" Ela perguntou, finalmente, tentando entender a razão por trás do silêncio em torno desse segredo.

Ivor fechou o livro e suspirou, olhando para o horizonte além da grande janela da biblioteca, onde o sol começava a desaparecer, lançando longas sombras sobre o castelo. "Porque esse poder, Elara, é uma faca de dois gumes. Ele não apenas nos fortalece, mas também nos coloca no centro de atenções indesejadas. Ao longo dos séculos, a nossa linhagem tentou esconder essa verdade para nos proteger, para evitar que outros percebessem o que realmente somos capazes de fazer."

Elara permaneceu em silêncio, absorvendo tudo aquilo. Algo dentro dela, porém, reagia de forma diferente. Ela sentia que esse poder era algo a ser reivindicado, não escondido. Algo a ser usado para seus próprios propósitos.

Ivor olhou para a filha por um longo momento antes de continuar, a voz agora mais grave e pessoal. "Desde o dia em que você despertou daquele sono... eu soube que algo estava diferente em você."

O ar ao redor deles pareceu ficar mais denso, como se as paredes da própria biblioteca estivessem prestando atenção. O coração de Elara bateu um pouco mais rápido, mas ela manteve seu olhar firme, encarando o pai enquanto ele falava.

"A Elara que eu conhecia... não era mais a mesma. Havia algo... ou alguém diferente habitando seu corpo. Eu tentei ignorar isso, tentei convencer a mim mesmo de que estava apenas imaginando, mas a energia ao seu redor mudou. Agora, finalmente, preciso saber a verdade."

Ele deu um passo à frente, sua expressão hesitante, mas determinada. "Quem está no corpo da minha filha?"

Elara observou seu pai em silêncio por alguns segundos, antes de finalmente falar, sua voz fria e controlada. "Você sempre soube, pai. Desde o momento em que abri os olhos, você sentiu isso. E não há razão para negar mais. A Elara que você conhecia realmente se foi."

Ela fez uma pausa, seus olhos vermelhos brilhando à luz suave da biblioteca. "Mas o que você vê agora... é muito mais do que qualquer Elara poderia ter sido. Eu sou Hinylle, de um tempo e lugar além do seu conhecimento. Eu reencarnei neste corpo, mas meus objetivos vão muito além do que você pode imaginar."

Ivor ficou quieto por um momento, absorvendo as palavras de sua filha. Ele havia suspeitado, mas ouvir a confirmação ainda o abalava de uma forma profunda.

"O que você quer?" Ele perguntou, finalmente, a voz mais suave.

"O que eu quero, pai, é domínio. Não apenas sobre este reino, mas sobre muito mais. Minha ambição é sem limites, e essa é a diferença entre nós e os outros. Eu vou usar o poder dos Sulfuric para isso, mas o objetivo final será meu. A glória que você e a mãe desejam para o nome Sulfuric será apenas um reflexo do que eu realmente almejo."

Ivor respirou fundo, observando sua filha com uma mistura de orgulho e preocupação. Ele finalmente viu quem ela realmente era - uma força imparável, uma entidade que transcendia o tempo e o espaço.

Elara Sulfuric [  O Legado ]Onde histórias criam vida. Descubra agora