Jonas

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Um mês depois que estava conversando por mensagem com a Luiza, senti a necessidade de dar um passo além, eu queria ouvir a voz dela. Temia retroceder com a confiança que tinha conquistado, precisava ir com calma. Eu não sabia qual era o impedimento dela em ser vista e se isso incluía ser ouvida também. Então, ao invés de perguntar e gerar um climão, decidi que eu iria passar a enviar áudios e se ela respondesse, eu saberia que ouvir a voz era permitido e então poderia pedir que nos falássemos por telefone. Assim, na primeira oportunidade, ao sair da escola, enviei um áudio e esperei para ver no que dava. Não tive sucesso uma vez que a resposta de Luiza foi por escrito. Fiquei um pouco decepcionado, esperava poder ouvir a voz dela. Mas nos dias que seguiram eu mandei novos áudios sem expectativas e um dia ela também enviou um áudio em resposta. Eu mal podia acreditar. Ouvi várias e várias vezes para memorizar sua voz. Em nossas conversas, Luiza falava dos pais com carinho, falava da infância, dos lugares que foi e das coisas que fez, mas percebi que ela não falava de coisas recentes, sempre no passado. Ainda assim, ela contava com felicidade em suas palavras. Eu estava encantado com a doçura e a serenidade dela, o jeitinho dela acalmava o meu coração e pela primeira vez eu me sentia em casa. Ela era a calmaria da minha vida. Nós riamos juntos, falávamos bobagens, tínhamos pontos de vista em comum sobre muitas coisas e também fazíamos desafios e charadas um ao outro o tempo todo, assim como no começo quando nos conhecemos.

Estávamos nos envolvendo sem nunca termos tido contato físico. Os áudios me motivaram a pedir que pudéssemos nos falar por ligação antes de dormir e Luiza concordou. O assunto não tinha fim, como dois adolescentes se conhecendo. Eu não me acostumava, cada vez que ouvia a voz de Luiza, meu coração batia forte e eu vivia suspirando pelos cantos. Outra coisa em comum, não tínhamos redes sociais e por isso, as ligações e mensagens eram tudo que tínhamos. Meu coração nunca estava satisfeito e sempre pedia um pouco mais dela. Eu tinha consciência que o contato físico estava fora dos limites para Luiza, então decidi arriscar mais uma vez.

“Lu, eu queria te pedir uma coisa”

“Não vou fazer seu trabalho de novo Jonas”

“Não é isso. Você sabe o quanto eu gosto de você, não sabe?”

“Na verdade não, mas porque você está enrolando? Somos amigos, pode me falar o que for. Se eu puder eu vou fazer por você.”

“Eu só não quero que você fique chateada se eu te pedir algo que você não queira”

“Eu não vou, prometo.”

Escrevi e apaguei…
Escrevi e apaguei…

“Anda Jonas, para de enrolar”

“Eu quero uma foto”

Ela demorou para responder e eu fiquei nervoso. Lembrei quando pedi para nos conhecermos pessoalmente e logo me arrependi de ter pedido uma foto.

“Me desculpa Lu. Finge que eu não falei nada tá? Eu sou um idiota, eu respeito seus limites e tá tudo bem pra mim como está”

E ela mandou uma foto fazendo careta.

“Assim tá bom, ou você queria algo mais formal?”

Eu fiquei em choque. Ela era linda demais, e na foto obviamente eu conseguia reparar muito mais do que pela janela. Qualquer outra garota mandaria uma foto sensual ou produzida, mas a Luiza não, ela mandou uma foto espontânea e fazendo careta, bem o jeitinho dela que eu gostava cada dia mais e mais.

“Você é tão linda”

“Então vai me mandar uma foto também ou vou ter que pedir? ;)”

Eu mandei também e a partir daí, sempre mandavamos fotos um para o outro. Fotos antigas, fotos bobas, fotos antes de dormir. Eu nunca me senti tão feliz antes, esse passo de trocarmos fotos, me fez sonhar ainda mais. Senti até uma ponta de esperança de que poderia ter uma vida normal.

Com oito meses desse relacionamento e mais ou menos dez meses em que minha mãe e eu estávamos morando ali, veio a notícia que mudaria tudo. Quando cheguei do colégio naquele dia, encontrei minha mãe embalando as coisas e meu coração disparou porque já sabia o que aquilo significava.

- Ele nos achou.
- Mas não tem nem um ano que estamos aqui
- Dessa vez ele conseguiu mais rápido e por isso precisamos sair o quanto antes. Já providenciei a baixa do trabalho e a sua transferência de colégio, veremos quando chegarmos em um novo lugar. A mudança chega amanhã, você já sabe como funciona Jonas, se apresse.

Eu quase acreditei que dessa vez as coisas podiam ser diferentes. O que eu ia fazer sem a Luiza? Estava apaixonado. Não estava preparado para me separar dela e nem havia dito a ela que eu poderia partir assim, como iria explicar? Nunca foi preciso me explicar para alguém antes. Fiquei nervoso, minha mãe chamou minha atenção para a necessidade de fazer o que precisava ser feito. Eu fiz tudo que já conhecia de cor totalmente no automático quando de repente, por impulso me vi correndo até a casa de Luiza e batendo na porta. Era começo da noite e o pai dela que atendeu. Não pensei direito, tentei ser o mais educado possível mesmo estando nervoso. Eu estava indo embora, iria perder a Luiza, e principalmente estava ultrapassando o limite que ela impôs desde o começo: não nos vermos pessoalmente. Porém, naquele momento eu não raciocinava direito, eu estava totalmente movido pela emoção e o desespero.

- Boa noite, senhor! Eu gostaria de falar com a sua filha Luiza. Ela está?
- Sim, está. Mas eu não te conheço, rapaz e vou perguntar se ela quer falar com você. Espera aqui.

Ele estava bastante sério e eu esperei o senhor entrar e retornar. Esperava que Luiza entendesse que era uma emergência, já que eu nunca tinha descumprido nosso acordo, e por isso descesse para falar comigo. Mas não foi isso que aconteceu, o pai voltou dizendo que ela não queria me ver. Parecia que o chão tinha se aberto sob meus pés, eu não acreditava que ela realmente estava se negando a me ver depois de quase nove meses que estávamos juntos. Sim, porque mesmo que de uma forma diferente, estávamos juntos, conectados na afinidade, no sentimento, no carinho, isso para mim era algo muito especial. Será que ela não se sentia da mesma forma? Será que eu não passava de um colega que ela jogava conversa fora? Não é possível que eu estivesse tão enganado e sentia tudo aquilo sozinho. Não tinha tempo a perder. Comecei a gritar como um louco.

- Luiza! Luiza! É o Jonas, Luiza! Eu preciso muito te ver, é uma emergência! Eu não viria se não fosse urgente

Gritava tentando entrar, mas fui barrado pelo pai.

- Rapaz, ela já disse que não quer ver você, é melhor você ir embora. Você está na minha casa e eu estou dizendo para você ir embora, entendeu bem ou prefere que eu chame a polícia?

Deixei a casa com as lágrimas escorrendo. Me sentia perdido, e só desejava estar feliz como ontem.

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