Jonas

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Quando nossos caminhos se encontraram novamente, já éramos adultos. Me tornei um advogado muito procurado, montei um escritório e convidei alguns colegas da faculdade para trabalhar comigo, os negócios prosperavam e no campo profissional eu podia dizer que era realizado. Recentemente havia sido contratado por Frederico, um jovem que desejava reivindicar a autoria de um quadro. Segundo meu cliente, ele havia pintado, tinha as provas dos esboços mas a outra parte alega autoria sem nenhuma prova. Parecia um caso tranquilo, ele havia conseguido vender o quadro em uma galeria e esse impasse estava impedindo a venda. Estávamos indo para a primeira reunião de conciliação para ouvir a outra parte, parecia um caso bem simples.
Ao chegar na reunião, quase parei de respirar ao ver a  parte reclamante com a sua advogada. Meu coração batia tão forte que senti que poderia ter um infarto. Na minha profissão, aprendi a ser observador, e rapidamente percebi tudo ao meu redor. Mantive a postura profissional, mesmo estando uma bagunça por dentro. Um nó se formou na minha garganta ao perceber um homem sentado ao lado dela com as mãos entrelaçadas. Era Luiza e ela já tinha alguém. Não precisei de dois minutos para ver o quadro exposto no cavalete e o ar de vitória de meu cliente. Ele sabia que tinha um advogado caro e com histórico de vitórias, por isso sentia a causa ganha.

- O quadro é dela. - disse sem sequer um boa tarde. Todos me olharam estarrecidos
- Como assim? - disse meu cliente
- O que é isso Dr. Está achando que só porque a minha cliente é cadeirante precisa de caridade? - disse a advogada.

Mantive a aparência fria, mas o coração estava partido. “Ela tinha alguém”, “ela me esqueceu”

- É claro que essa inválida não é capaz de pintar uma obra de arte, esse quadro é meu, eu tenho os esboços.
- Você roubou os esboços - Disse o homem de mãos dadas com Luiza.
- Senhor Frederico, não nos faça perder mais do nosso tempo. Eu tenho absoluta certeza que o quadro é dela, mas vamos aos fatos: o senhor ter os esboços não significa que fez a pintura. Se o juiz pedir uma perícia, encontraremos outras pinturas na sua casa ou na dela? Encontraremos esboços de outras pinturas na sua casa ou na dela? Se solicitarmos que o senhor faça um desenho eu aposto que não desenha nem uma casinha de criança, enquanto ela é capaz de desenhar a todos nós de olhos fechados. Nas mãos dela tem tinta e nas suas no máximo creme hidratante. Mas veja bem, o senhor está revogando um quadro e chamando uma cadeirante de inválida em uma sala cheia de testemunhas. Quer mesmo levar isso adiante? Perder e ainda correr o risco de ganhar um processo por calúnia e difamação?
- Mas de que lado você está? Fui eu que te contratei!
- Do meu. Não entro em casos para perder e obviamente estou perdendo meu tempo aqui quando todos sabemos muito bem quem pintou aquele quadro. Com licença.

Sai da sala aparentemente calmo e frio, mas por dentro precisava de ar. As mãos daquele homem segurando as mãos da Luiza estavam me fazendo perder a cabeça.

- Jonas espera! - Luiza gritou e eu parei. Não seria justo correr quando ela não poderia fazer o mesmo.
- Oi Luiza
- Oi, obrigada por me defender. Mesmo não sendo o meu advogado - ela riu e que saudade eu tinha daquele sorriso. Mas não consegui retribuir.
- Era justo, e eu não defendo aquilo que eu não considero justo.
- Você está diferente
- Você também
- Pensei que a gente nunca mais fosse se ver
- Pois é, o destino gosta de brincar comigo.
- Como assim?

Mas antes que eu pudesse responder, o namorado apareceu.

- Querida, vamos? A Nina ligou, está preocupada.
- Sim, vamos. - Ele colocou as mãos sobre os ombros de Luiza e aquela ação não passou despercebido pelos meus olhos
- Jonas, podemos..
- Eu tenho que ir. Tenho outro cliente me esperando.

Sai apressado, mas se eu pudesse teria saído correndo dali feito uma criança.
Quando cheguei em casa, troquei de roupa e fui direto para a academia que tinha em casa, precisava descontar os sentimentos. Depois de horas, eu deitei no chão exausto. Mal conseguia respirar. Minha mãe, entrou trazendo um lanche mas quando viu o meu estado se preocupou

- Filho! O que houve?
- Eu a vi mãe
- Nem preciso perguntar quem, nesse estado, você viu a Luiza. Mas isso não era pra ser bom? Depois de tanto tempo.
- Ela estava de mãos dadas com outro cara. Estava mais linda que nunca, sorridente, confiante… Ela veio atrás de mim na rua, sem ter medo…
- Se ela foi atrás de você não é um bom sinal?
- Ela foi me agradecer porque meu cliente estava acusando justamente ela, acredita? Mas quando eu cheguei lá e vi o quadro eu não tive dúvidas que o meu cliente é quem estava mentindo, eu reconheço a arte da Luiza. Não podia defender ele e obviamente acabei com a palhaçada daquele caso.
- Mas meu filho, eu não estou te reconhecendo. Quando deixamos aquela cidade você estava disposto a enfrentar o monstro do seu pai pela sua liberdade. Estava disposto a estudar e ser bem sucedido para ser alguém na vida mesmo sem termos um tostão. E se não estou enganada tudo isso era por ela. Era para um dia você voltar e trazer ela de volta para sua vida. Sim ou não filho?
- Sim, mas agora ela já tem outra pessoa.
- E você vai desistir? Nunca vi você desistindo de nada. Você ficou fechado e perdeu o brilho desde que descobriu que ela se mudou. Agora a encontrou novamente, você é ou não é um homem inteligente? Lute por ela! Reconquista o amor dela! Você não pode se entregar sem lutar filho.
- Obrigado mãe.
- Vai tomar um banho e descansar filho. Eu levo o lanche no seu quarto.

As palavras da minha mãe ficaram remoendo na minha cabeça a noite toda.

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