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Padre Christopher

Conheci cada canto daquela cidade em poucas horas de minha chegada, há dois anos. Era um território pequeno e de poucos habitantes, não chegava nem a 20 mil, de forma que existia a sensação constante de que todo mundo se conhecia.

Não havia muito para se ver além de casas antigas justapostas e coloridas, como uma típica localidade interiorana e de recursos escassos. Um dos pontos turísticos era uma pedra em formato de anel logo na entrada do município, onde os visitantes paravam e tiravam uma foto como se aquilo fosse a coisa mais interessante do mundo. Além disso, um grande lago no leste da cidade era comumente utilizado para a pesca esportiva e atividades de recreação entre crianças, jovens e famílias.

Mais nada.

Eu achava São João do Paraíso maravilhosa pelas suas montanhas, extremo verde e pacatez. Os ares ali pareciam mais suaves, melhores de se respirar, livres da poluição das grandes metrópoles. Minha única dificuldade era compreender as pessoas, e eu tentava porque, mais do que querer, precisava, de alguma forma, atingir seus corações.

Por exemplo, naquele instante não compreendia como tanta gente poderia ir a um mesmo velório. O morto nem era famoso.

Infelizmente, não era apenas a morte, entidade tão natural aos reles mortais, que trazia o interesse daquela aglomeração, mas o assassinato brutal. Não entrava na minha cabeça como coisas ruins chamavam tanta atenção, mais até do que as boas. Fazia mais de vinte anos que nenhum crime parecido acontecia na cidade, segundo o delegado Herrera comentara, depois de bater no peito e avisar que eu deveria me despreocupar porque aquele caso seria solucionado em breve.

Bom, eu estava, sim, naturalmente preocupado com a existência de um assassino à solta, colocando em perigo a vida de inocentes. Ainda assim, demorei a entender por que ele me procurara para dizer tais palavras, especificamente. A mim cabia o dever de orar e vigiar, como sempre fazia. Mas após um curto raciocínio, compreendi que o delegado queria que eu lhe contasse caso alguém falasse qualquer coisa que pudesse servir para a solução do caso durante uma confissão.

Participei da oração do terço na companhia de umas trinta senhoras idosas; ajudei na cantoria ao lado de Jeremias, o músico voluntário da igreja; nunca tive um público tão vasto durante uma pregação desde que cheguei; acompanhei a chuva de pétalas que o prefeito encomendou para aquele dia e, por fim, falei as seguintes palavras, porque me pareceu prudente:

— Saudade, sim, tristeza, nunca.

A terra começou a ser jogada sobre o caixão de madeira entalhada, deixando-me com uma breve sensação de tontura. Nunca gostei de enterros. Demorei demais a compreender a morte e, assim que o fiz, decidi que não era o maior fã dela. Não pelos que se vão, porque encontrarão o Senhor, mas pelos que ficam e sempre sofrem.

Apesar de eu ter dito aquilo em alto e bom tom, poucas pessoas pareciam tristes, para ser sincero. Um ou outro gato pingado que provavelmente pertencia à família do falecido. Sua esposa, no entanto, mantinha um ar sério, de poucas palavras e semblante indecifrável. Não consegui encontrar sofrimento, tampouco havia sinais de choro, o que considerei incomum até me dar conta de que o parceiro, geralmente, é o primeiro suspeito em crimes como aquele.

Ela estava com medo, talvez. De ser acusada ou descoberta? Eu não sabia. Só entendia que ela era muito jovem para passar por tal trauma, e que seu olhar escuro sempre me deixava inquieto. Não era de aparecer nas missas, mas vez ou outra entrava na igreja em silêncio durante uma tarde qualquer, em seguida deixava algumas notas na caixinha de doações e partia.

Nunca me atrevi a puxar conversa. Em condições normais, teria a questionado, oferecido conforto nem que fosse com palavras, convidado para alguma celebração, mas eu conhecia os meus limites e os ultrapassar seria estupidez de minha parte.

A sombra do pecadoOnde histórias criam vida. Descubra agora