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Padre Christopher

Toninho ficou sorridente quando eu o chamei para me acompanhar em uma festa que aconteceria na casa do prefeito naquele sábado, e que fui convidado não sabia direito o motivo, podendo levar um acompanhante. Não parava de falar sobre precisar alugar um terno, além de fazer milhões de suposições a respeito do convite. Ele era jovem e merecia se divertir mais, não apenas participar da organização das festividades da igreja.

O coroinha quase nunca se divertia porque trabalhava muito, servia a Deus com bastante esmero e sem reclamar. Quando surgiu com o envelope que tinha o selo do prefeito em mãos, curioso e mal esperando a última pessoa sair do confessionário naquela noite, aguardou que eu o abrisse na frente dele. Não pestanejei, porque confiava no meu braço direito. Depois da surpresa inicial, entendi que era melhor atender àquela solicitação, portanto frequentaria a tal festa para não fazer desfeita.

— Mas o senhor tem um terno? Vai precisar se vestir direito, padre, nada de batinas ou aquelas coisas enormes e surradas que o senhor usa. — Olhou-me com atenção. Às vezes Toninho dizia que eu precisava ter mais zelo com minhas vestimentas, mas ele não sabia que eu costumava usar roupas largas para não chamar muita atenção para o meu corpo.

— Tenho um bom terno guardado, ele basta.

— Acho que vou amanhã a uma loja de aluguéis. Minha mãe vai ficar contente. Festa na casa do prefeito? Muito chique, não é?

Assenti, feliz com a empolgação de Toninho. Era apenas um moleque, no fim das contas. Não deixei de notar que aquele foi o primeiro resquício de sorriso que consegui abrir dentro de quatro longos dias.

Estava sério, com o emocional em frangalhos, buscando uma redenção que me parecia longe e uma motivação que havia se escondido. Um período de trevas. Eu me encontrava num túnel escuro e ainda não tinha achado a saída.

Enquanto o coroinha continuava a deliberar sobre a festa, mantive-me com os olhos sobre ele, mas com os pensamentos muito distantes. Realizei cada uma das tarefas com empenho e dedicação, ainda que não me considerasse o suficiente para nenhuma delas. Segui em frente como pude. Entretanto, quando chegava ao silêncio dos meus aposentos e me lembrava de Dulce Maria, voltava ao limbo, à incerteza, ao fracasso. Falhava todas as vezes que tentava não recordar.

Sonhei com seu corpo no meu e imaginei milhões de situações vulgares em todos os cantos em que estive. Meus pensamentos estavam nebulosos demais, e nem mesmo rezar, meditar, orar e pedir socorro a Deus estava funcionando. Era o meu castigo, eu sabia. Precisava me confortar com o fato de que um dia teria fim. Nenhum sofrimento dura para sempre, sobretudo quando a força do amor divino nos ronda.

— Padre? — Toninho balançou a mão na minha frente. Aquela atitude já tinha se repetido algumas vezes ao longo daqueles dias. — Padre?

Pisquei os olhos, enfim, focando no seu rosto de novo.

— Hum... Sim?

Toninho mostrava um semblante carregado de preocupação.

— O senhor anda distraído. Dei de ombros.

— Muitos pensamentos. — Levantei-me de uma das cadeiras do confessionário.

A nossa igreja possuía uma pequena saleta lateral que servia para atribuir conforto nos momentos das confissões; um espaço pequeno, de uns quatro metros quadrados, em que só havia uma mesa e duas cadeiras uma na frente da outra, como num consultório. A única decoração era uma cruz na parede, nada mais. Não havia porta, apenas uma cortina vermelha com detalhes em dourado, garantindo certa privacidade.

A sombra do pecadoOnde histórias criam vida. Descubra agora