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03:30 PM

Os saltos pretos exageradamente altos magoam-me os pés de uma forma incomodativa o suficiente para que caminhe de maneira estranha na rua. A saia lápis, também preta, dificulta o meu movimento e a camisa branca de linho que, por ser de uma marca barata, arranha a minha pele que está decerto agora vermelha. O cabelo castanho, que no princípio da tarde estava apanhado e perfeitamente enrolado sobre si mesmo, está agora despenteado e esvoaçante com a brisa fria que Nova Iorque oferece durante o seu mês de Janeiro rigoroso. Amaldiçoo-me por ter deixado o meu casaco na revista, agora estou sujeita às fracas pingas de chuva fria que gelam cada centímetro da minha pele sensível e demasiado branca. Faço um equilíbrio extraordinário com seis copos de bebidas na grande base que me disponibilizaram, e dois sacos completamente cheios de queques de chocolate vindos diretamente de uma das pastelarias mais conceituadas de Nova Iorque. Tento manter-me estável na minha condição frágil, as pessoas passam dando-me leves encontrões e faço uma força sobrenatural para me manter no lugar, saber que ainda tenho que andar dois quarteirões desta forma faz-me suspirar.

O meu telemóvel toca uma música que, com o tempo, vim a achar extremamente irritante por estar constantemente a tocar. A fotografia de Emma brilha no ecrã e, pela centésima vez hoje, faço mais uma posição de equilibrismo tentando segurar tudo numa mão, mas como é demasiado complicado para mim, acabo por segurar o telemóvel com o ombro contra a minha orelha enquanto contínuo o meu caminho.

- Por favor diz-me que é urgente. – Suspiro exausta.

- Não é urgente, mas acho que não ias gostar de chegar a casa e saber que ela ardeu.

- O quê?! – Paro no meio da rua sobressaltada, mas logo me lembro de que não posso mexer-me demasiado. – Como é que isso aconteceu? Estás bem?

- Eu estou ótima, mas o mesmo não se pode dizer da cozinha que está praticamente reduzida a cinzas. O Dean estava a experimentar uma nova receita, mas ele distraiu-se durante mais uns minutos do que o suposto e quando voltou já estava tudo a arder. Sempre te disse que aquele fogão tradicional não era boa ideia.

- Nem tentes culpar-me Emma. A responsabilidade é vossa. – Franzo a testa. – Bem, agora já ardeu, não podemos fazer nada. E agora?

- O Dean diz que vai pagar-nos uma nova cozinha com tudo o que quisermos. Devias ter visto a expressão dele quando os bombeiros apagaram o fogo, parecia um cachorrinho abandonado, não podia sequer ficar chateada com ele.

- Certo. Mais tarde falamos melhor sobre isso quando eu chegar a casa. Estou no meio de uma situação bicuda. – Volto a caminhar.

- Vai ter que ser amanhã. – Solta risinhos de adolescente. – Como forma de se redimir por ter destruído a cozinha, o Dean vamos jantar e ficar num hotel maravilhoso aqui em Nova Iorque. – Consigo vê-la a sorrir do outro lado da linha e abano a cabeça em reprovação. – Devias sair esta noite e distrair-te um pouco. Desde que acabaste as aulas e começaste a estagiar na revista ainda não saíste. Pode ser que conheças algum rapaz para ti.

- Emma, eu disse-te que estava ocupada. Não posso falar agora.

- Acho incrível desviares sempre o assunto. Mas vou acreditar em ti. Até amanhã, beijinhos.

- Adeus. – Movo tudo para uma única mão para guardar o telemóvel, antes que o possa fazer, o mesmo volta a tocar. Desta vez Victoria é quem me telefona.

- Victoria. – Volto à minha habilidade de equilíbrio.

- Onde estás? Queremos os cafés! – O seu tom rude de habitualmente faz-me franzir todo o rosto. – Tens que passar na lavandaria para trazer o vestido emprestado que tu sujaste. – Dá enfase ao 'tu', fazendo-me sentir culpada, mais uma vez.

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