Não demorou muito. Assim que meu expediente começou e que o senhor Calaham foi embora, o conversível preto parou. E, dessa vez, de frente a entrada da loja. Esfreguei o rosto com as duas mãos e pedi por paciência... e força.
A porta abriu e quem saiu de lá foi apenas Calum. As calças escuras e justas de sempre agora eram acompanhadas por uma camisa cinza e jaqueta de couro. Ele entrou e pegou apenas salgadinhos e uns copos de água de coco industrializada. Olhou pela porta de vidro pra dentro do carro apontando o que pegara e levou para o balcão.
- Se converteu?
- Não enche! - respondeu depressa e com a voz presa à garganta como um animal feroz arranhando o interior, querendo sair.
Senti vontade de rir, mas não estava afim de sentir o mal humor dele em mim. A buzina soou e ele tirou do bolso o dinheiro e, do balcão, um pacote de chicletes. Pegou tudo e foi embora.
Luke estava no carro. Mas não desceu.
Como eu sei disso? Chicletes.
Isso me atormentou durante toda a noite. E o dia seguinte. E todos os outros dias aos quais eles não voltaram a aparecer no posto ou na loja. Pelo menos não durante meu turno.
Na manhã de sexta-feira eu não dormi. Fiquei virando e revirando aquela cena em Brunett Heads na minha cabeça. Se ele tivesse atravessado instantes antes, o que ele teria tempo de fazer ou dizer? O que significou aquela troca de olhares mistos entre Michael e ele? Porque não me impediu de ir?
Sentada na beira da cama passei a mão pela nuca, sentindo os seus dedos cravados ali, sua respiração quente perto demais. Escorreguei pelo edredom até estar sentada no chão e abracei os joelhos.
"Assim!", ouvi sua voz no meu ouvido e quase saltei quando o celular vibrou ao meu lado. Droga! Como uma palavra podia mexer tanto com alguém? Mexer tanto comigo?
- Alô? - atendi num gemido.
- Buenos dias! - meus pais falaram ao telefone. - Como vai nossa princesa?
Louca.
- Bem. - forcei empolgação - Como está o cruzeiro?
- Estamos atracados agora, por isso mamãe tá ligando porque se não ligo, não fico sabendo de você.
- Desculpa, dias conturbados. Consegui um emprego.
- Ah, que maravilha, meu bem! Olhe, eu tenho que ir agora, vamos conhecer alguns lugares históricos. Depois nos falamos, tudo bem? Mamãe te ama.
E desligou.
Olhei para a tela e a vi escurecer com o número de Luke digitado na minha frente. Minha mão estremeceu e eu larguei o celular no chão. Esfreguei os olhos e voltei ao chuveiro, eu precisava esfriar a cabeça e superar.
Quando desci da pousada, pela vitrine do Extrangeiro, Michael me viu e mandou que eu entrasse com um movimento rápido com a mão. Assim que sentei ao balcão, encostei a cabeça virada de lado no mesmo e fiquei olhando para os bolinhos.
Mike chegou com uma xícara de café e cubinhos de açúcar.
- Você parece morta.
- Eu sei. - choraminguei. O cheiro do café me fez erguer a cabeça - Obrigada!
- Queijo quente?
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Drowning
FanfictionUm afogamento não é uma morte calma, indolor, súbita. Um afogamento é gradual, tortuoso e silencioso. A vítima sofre cada segundo e, por serem estes seus últimos, parece infinito. Infinito é um tempo muito longo para ser vivido. Eu não sei muito bem...