16/10/2018

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Acordei cedo hoje como de costume e como sempre há poucas pessoas acordadas além de mim. São 06h30m e Igor ainda não acordou, vou ter que esperar um pouco ainda pra poder procurar o açude. Estou confiante é quase certo eu achar o açude, só espero não demorar muito procurando.

Minha mãe está melhor, dormiu a noite toda e na verdade ela ainda está dormindo, estou aliviado com a melhora dela. Eu vou andar um pouco agora e ficar esperando Igor acordar, mas na rua, experimentando novamente a liberdade.

Igor emprestou a moto e eu fui à busca do açude perdido e achei sem muitas delongas. Cheguei ainda a pouco e já estou de saída junto com todos para lá. O grupo veio todo para o açude e eu trouxe o diário comigo. As pessoas estão se esbaldando e se divertindo como nunca vi antes, nós aproveitamos para encher as garrafas e lavar as roupas, além de tomarmos banho. Agora eu vou curtir um pouco esse açude.

São 17h43m e chegamos há pouco tempo. Nós passamos o dia todo no açude e almoçamos por lá mesmo, só não dormimos lá porque não existem casas nos arredores então decidimos retornar ao local onde estávamos. Já está escuro e a maior parte do grupo está dentro das casas, mas há ainda alguns poucos que estão andando pela rua e poucas pessoas conversando em uma praça perto de onde estamos. Novamente tenho a sensação de liberdade e de ter acordado de um pesadelo horrível. Agora vou dar uma volta lá na praça para ver quem tanto está por lá.

17/10/2018

É realmente tinham algumas pessoas ontem na praça, inclusive Izabel. Foi uma ótima escolha ter ido lá ontem, finalmente as coisas com Izabel passaram de simples conversas. Assim que cheguei à praça ela me viu e me chamou. Ela estava sozinha sentada em um banco na lateral da praça, sentei ao seu lado e começamos a conversar como de costume, só que dessa vez não paramos apenas na conversa. Ela pediu desculpas sobre a pergunta que fez sobre meu apelido, disse que notou o quão fiquei chateado pela pergunta e se sentiu mal depois. Após alguns minutos de conversa acabamos nos beijando em meio à praça.

Parece clichê de cinema, mas foi realmente como aconteceu. Nós dois sentados em um banco numa praça de uma pequena cidade, com a lua cheia sobre nossas cabeças e um clima de amor no ar. Admito que foi uma sensação da qual nunca desfrutei antes, nem meu primeiro beijo foi tão bom assim. Pena que Igor há chamou pouco tempo depois, mas já ta na hora dele cair na real. Vou contar sobre eu e Izabel hoje a ele e vamos ver qual será a sua reação.

Eu saí para correr hoje cedo e decidi passar pela praça e tinham algumas pessoas dentro de uma igreja que fica ao lado da praça. Parei minha corrida e decidi entrar na igreja e tinham unas 14 pessoas lá dentro. As pessoas estavam ajoelhadas orando. É evidente que mesmo o mundo beirando seu fim as pessoas não deixam suas crenças de lado e eu acho isso bom, de certa forma nos dá esperança para continuar nossa luta. Enfim, continuei minha corrida como de costume e quando voltei Izabel já estava acordada e me viu chegando.

Eu falei a ela que iria dizer a Igor sobre nós, mas ela me pediu para não fazer. Ela disse que precisa de tempo para falar isso pra ele e me fez prometer que eu não contaria nada antes dela e eu acabei aceitando. Pouco depois disso Wendell me chamou para decidir nossa nova parada. Edinho e Igor estavam com ele e já estavam com o mapa aberto e com um circulo em cima da cidade de Quixaba que vai ser a nossa nova casa durante dois ou três dias. A cidade é próxima daqui e de Patos. É uma cidadezinha minúscula com uma população que não ultrapassa os 2.000 habitantes. Eu acho que a situação de Quixaba é a mesma de São Mamede e Várzea, mas vamos pra lá. A cidade é perto daqui e só sairemos após o almoço, agora eu estou indo pro açude e acho que a maior parte do grupo vai vim comigo.

São 14h e chegamos a pouco a Quixaba. Saímos de São Mamede após o almoço e quando chegamos aqui não tivemos nenhuma surpresa, novamente uma cidade vazia. O grupo se dividiu para vasculhar a cidade e eu estou dentro de uma lojinha de conveniências de um pequeno posto. Ainda há alguns poucos produtos espalhados pela loja, alguns ainda nas prateleiras outros no chão, mas nada que seja tão útil. Consegui alguns poucos litros de gasolina e diesel no posto, mas não é muita coisa. Ainda não é preocupante, porém mais cedo ou mais tarde precisaremos arrumar mais combustível.

A cidade é muito pequena, estradas de barro, casas de chão batido, cidade com características sertanejas ao extremo. Eu não acho que vamos passar muito tempo aqui, não vejo nada de interessante e a única coisa que consegui foram alguns maços de cigarro e alguns biscoitos com o prazo de validade vencido. A cada dia que passa começo a sentir cada vez mais falta da minha antiga vida, essa história de viver de cidade em cidade fugindo de zumbis e procurando alimentos e gasolina já está me enchendo o saco.

As pessoas vão voltando aos poucos e trazem o de sempre, colchonetes velhos, panelas, algumas mudas de roupas, nada além do que já não temos. Acho difícil achar algo de especial aqui, até agora foi a menor cidade em que paramos. Eu vou passar um tempo com Izabel agora, quero saber se ela já falou com Igor ou se eu mesmo terei que fazer isso.

São 17h e eu estava com Izabel e como eu imaginava ela ainda não contou sobre nós a Igor. Namoramos escondidos e eu acho isso ridículo, não sou uma pessoa autoritária, mas odeio mentiras e omissões, então falei pra ela contar tudo ao irmão ou eu mesmo contarei.

Minha mãe sentiu novamente dores e está mal. Ela já teve pedras nos rins e eu espero que seja apenas isso e não algum problema com o bebe. Ela está deitada na cama agora e minha avó e Thamara estão lá com ela. Meu pai está se recuperando ainda, os ferimentos superficiais já cicatrizaram, mas a sua perna ainda custa a sarar. Ele só consegue andar com o auxilio de uma muleta improvisada e sente dores constantes na perna, espero que ele se recupere o quanto antes, nós precisamos muito dele, principalmente eu.

Falando de mim, estou um pouco mal também. Estou com o nariz irritado com secreção e um pouco de febre, acho que é uma crise alérgica por conta da poeira. Não tenho crises alérgicas com freqüência, mas também essa não é a primeira e muito menos a mais forte que tive e sei que daqui a uns dois dias já estarei melhor mesmo sem tomar nenhuma medicação.

18/10/2018

Acordei um pouco tarde hoje. Já são 08h40m e antes que o clima esquente muito vou correr. Como eu imaginava já estou bem melhor e acho que a corrida vai me ajudar ainda mais.

Voltei e hoje posso dizer que dei mais do que sorte na corrida, foi realmente um dádiva. Eu saí da casa e comecei a correr por uma parte da cidade por onde eu já tinha passado ontem, só que depois de certo tempo resolvi correr por mais partes da cidade. Sai da parte central e fui em direção a uma parte mais afastada da cidade e assim que fui deixando a cidade pra trás a paisagem começou a mudar. De pequenas casas e ruas de calçamento, para uma paisagem exclusivamente rural e estradas de barro.

Um pouco depois eu vi um pequeno rebanho bovino espalhado por um cercado, voltei logo em seguida para chamar alguém para me ajudar. Voltei correndo para o acampamento e chamei Edinho e Igor que levou a Strada para trazer o nosso almoço. Nós chegamos ao local em poucos minutos e Igor usou o rifle para matar o boi, nós três colocamos o boi na caçamba do carro e viemos embora. E hoje o nosso almoço está garantido, o boi não é tão grande, mas já está de bom tamanho.

Sei que vai dar um pouco de trabalho tirar a pele dele, mas vai valer à pena e sei que minha avó vai conseguir fazer isso muito bem. A felicidade no rosto das pessoas é evidente, a alegria das crianças é imensa e a minha também. Izabel me abraçou quando cheguei e me parabenizou pelo feito, a pergunta sobre se ela contou ou não ao seu irmão sobre nós ficou presa na garganta, mas eu não queria estragar o momento. E afinal eu suponho que ela não contou nada, porque não notei nenhuma diferença no tratamento dele em relação a mim.

Acho difícil sairmos daqui hoje, esse boi tomou todas as atenções para si e a única coisa que o grupo tem em mente hoje é o nosso almoço. E novamente a sensação de meu lar me atinge, essa cidade é perfeita pra um recomeço.

São 14h17m e o almoço foi ótimo, a carne estava um pouco dura e insossa, mas era carne. Há mais vacas naquele rebanho, mas assim como o açude de Sabugi, elas não nos garantem a sobrevivência e novamente o nosso objetivo se vê distante do nosso conforto.

Ainda pouco Igor veio falar comigo, Izabel contou a ele sobre nós. Era nítida a alteração dele e pensei que nós íamos sair "na mão", mas não aconteceu. Ele me disse que a escolha era dela, mas se eu a decepcionar a nossa conversa será outra. Não sou de acatar ameaças, principalmente de pessoas que eu mal conheço, mas relevei desta vez, foi por uma boa causa.

A noite está chegando e vamos dormir aqui hoje. Eu falei com Izabel depois da minha conversa com Igor e acho que agora o nosso namoro perdura. É bom, me ajuda a esquecer o que está acontecendo, me alivia, me acalma, é bom saber que tem alguém que ama você, não importando a ocasião.


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