- Pois não, em que posso ajuda-lo?
- Ah... eu queria saber o preço para fazer um intercâmbio... quanto iria me custar?
- Hum... temos muitas opções aqui para intercâmbio... No caso, inglês, certo?
- Sim.
- Você tem alguma preferência? Aqui temos intercâmbio com os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália, Inglaterra...
- O que estiver mais em conta, por favor...
- Bem, deixa eu te perguntar, qual o seu nome?
- Daniel.
- Bem Daniel, eu sou Susana, vou estar te passando as melhores opções de preço que tenho... mais uma perguntinha Daniel, você fala inglês fluente, ou busca fluência no seu intercâmbio?
- Olha, eu acho que sou fluente... Na real, na real, não tenho tido oportunidades de falar muito aqui, mas todo filme que eu vejo eu nem coloco legendas, pois já entendo, tá ligada?
- Sim, estou ligada... – Susana se divertia com as gírias, com o jeito moleque de alguns de seus clientes. Apesar de que, no caso de Daniel, a primeira impressão que ela teve dele era tratar-se de um nerd: os óculos grandes, o cabelo desajeitado, a camisa de botões amassada, o tipo franzino e alto dele suscitava uma certa fragilidade... mas ao falar, Daniel não soava nada como nerd. Susana não conseguira ainda "sacar" muito bem qual era a dele.
- ... você fez algum cursinho para aprender inglês, Daniel?
- Sim, fiz por uns três anos... A minha irmã chegou a se formar, mas eu tive que trancar o curso depois que minha mãe faleceu. Aí, meu pai decidiu por cortar despesas, e eu me fu... ah, desculpa meu jeito de falar.
- Não se incomode por isso. Meus pêsames por sua perda...
- Ah, eu tinha treze anos. Tá tudo bem.
- Bem Daniel, eu tenho aqui Canadá com o melhor preço... custo-benefício ótimo para você... um país amigável, civilizado, primeiríssimo mundo lá, Dani... e quanto aos cursos e intercâmbios, deixa eu te mostrar aqui na tela...
Susana virou o monitor de seu computador na direção de Daniel. Que, gostou de cara do menor preço que viu: mas, tratava-se de um mês apenas, entre estudos e a estadia na casa de uma família local. "Acho que num mês arranjo um trampo por lá... e aí não volto mais. Mas, tenho que arrumar em um mês, isso que é foda..."
- E aí Daniel, o que te agrada mais? Um mês? Três? Ou seis, em que você ganha as certificações de...
- Eu não sei ao certo... e para quando seria o primeiro curso? Eu digo, o mais próximo.
- Os cursos mensais são os que tem encaixe mais próximo, pois são os que mais acontecem ao longo do ano, Daniel. Basta fecharmos um contrato, definirmos o pagamento – a agência faz três vezes no cartão o curso de um mês, e a passagem até em seis – e também o visto necessário, no caso o de estudante, que vai te sair por...
Daniel via os valores aumentando à sua frente. Lembrava de dona Eleonora estaqueada em frente à porta, cobrando dois aluguéis duma só vez. Lembrou do pai, dia após dia chegando com uma bebida em baixo do braço, num emprego sem futuro, repetitivo, dentro de um chão de fábrica. Essa hora Daniel pensava porque diabos não tinha um emprego seu, e bom, para pagar tudo isso de uma vez. Talvez porque ele não quisesse um emprego sem futuro para si; ao menos não aqui no Brasil. A sua experiência de cerca de dois anos num posto de gasolina lhe mostrara um caminho que parecia sem volta, sem oportunidades de digamos, um crescimento substancial. Mas no exterior o papo era outro. Lá se ganhava dinheiro, podia-se comprar uma bela casa, um carro do ano, apenas varrendo neve da frente das casas, por exemplo. Aí sim Daniel via uma luz no fim do túnel. Mas a quem recorrer nesta hora, se não à sua irmã? E, não apenas isso, será que ela teria a quantia imaginada por Daniel? Será que ela ajudaria o irmão assim, mesmo que os dois quase não tivessem mais contato?
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Fuga
Mystery / ThrillerO destino de quatro pessoas vai mudando drasticamente, ao mesmo tempo em que o país onde vivem sofre uma inédita onda de ataques terroristas.