Fuga

O Cliente

A semana havia começado ótima para Cristine. Mesmo com o que vinha acontecendo no país, ela mesmo assim havia ido de segunda à quinta na academia malhar. Foi ao salão, como semanalmente fazia, para unhas, mãos, cabelo, depilação. Fez a sua tradicional meditação de fim de tarde, e procurou se alimentar de forma saudável. Sem cigarros, sem álcool. E com Jeff. Mesmo que online, seus papos giravam por horas às vezes, atingindo o início da madrugada aqui no Brasil. O que Cristine constatou, para curiosidade de Jeff (que até pouco tempo, queria muito visitar o Brasil) é que seu dia-a-dia não havia mudado em nada, mesmo com as notícias correndo o mundo.

Cristine estava ligada em tudo, só não tinha deixado de viver. E nem o resto dos brasileiros. O que estava pegando, era do lado dos políticos e de seus colaboradores. Alguém queria uma resposta, achar um culpado por todo aquele caos. Mas, não havia nenhuma prova concreta de quem era o inimigo claramente. Vagas acusações, apenas. Pedido de ajuda aos Estados Unidos, diálogos com a Bolívia e a Venezuela, tudo acerca de como fazer para coibir tal violência contra eles, políticos. O exército estava rachado: enquanto algumas tropas cercavam o Palácio do Planalto, uma imensa parte do Brasil estava despreparada para ataques terroristas, sem a devida proteção. Um claro exemplo disto era o que havia acontecido no início da semana: uma bomba mandou pros ares a sede do partido político do governo. No atentado, 30 mortos e 20 feridos, alguns ainda correndo risco de vida. Gente pequena havia sido sacrificada neste atentado, mas havia políticos no meio, o que causou a baixa de mais gente do poder.

Esse fuzuê fez com Cristine agilizasse, por conta própria, o seu visto para os Estados Unidos. Por se tratar de um "governo amigo" do Brasil, grande parte dos vistos para brasileiros estavam sendo concedidos até em tempo menor do que o habitual. Cristine já tinha sua entrevista presencial marcada para o início da próxima semana, para alegria de Jeff, e como não deixava de ser, dela também. Ela só não havia comprado suas passagens, mesmo com toda a insistência do americano pelo Skype...

Na quinta, a realidade bateu à porta de Cristine mais uma vez. Após sua meditação ao entardecer, ela desceu de seu prédio com sua bolsa e seu nécessaire, e dirigiu até a casa noturna onde trabalhava, entrando pelos fundos, pela entrada de funcionários. Lá dentro, a vida mudava totalmente de figura. Cristine virava Paloma, e seu figurino era o de uma prostituta. Mesmo que "de luxo", o cheiro no ar, as drogas correndo soltas pelos cantos, tudo fazia ela mudar de caráter, de persona. Ali, ela tinha de representar um papel que não lembrava em nada Cristine. E isso era algo impactante demais para ela, especialmente nas primeiras horas do turno. Após o domingo de madrugada, hora que o trabalho na noite terminava, Paloma também sentia o impacto contrário, o de ser por alguns dias, uma pessoa mais, mais... Cristine, de novo.

Mas àquela noite havia um cliente que desejava seus serviços fora dali. Cada um que quisesse tirar uma das meninas da casa, deveria pagar o valor dobrado pelo mesmo tempo da acompanhante, além de o transporte, que era sempre por conta do interessado. Paloma as vezes relutava quando era chamada para esse tipo de programa, por receio das esquisitices que poderia encontrar: algum fetichista, ou caras altamente drogados, ou velhos corocas com Viagra até os dentes... e por aí afora. Mas nesta quinta ela aceitou o convite. Ao menos, ficaria algumas horas fora daquele ambiente nefasto, sem precisar encher sua cara de champanhe, ou fumar cigarrinhos mentolados enquanto era bolinada por homens famintos por sexo. O táxi a esperava na porta do nightclub.

Após alguns minutos rodando, o táxi adentrou um motel, "um dos melhorzinhos da cidade" na ideia de Paloma. O taxista deu as coordenadas:

- Esse é o quarto, número 12. Só bater na porta que ela abre-se automática, moça. Os caras daqui não são fracos...

- Tá tudo pago?

- Sim senhorita. Só descer do carro, madame.

Paloma fez como combinado, e chegou até a porta, vestindo seu short minúsculo, com suas pernas um tanto finas e compridas envoltas em uma meia fina, a barriguinha chapada com seu piercing à mostra, e um top um tanto grande, realçando por baixo o volume de seus grandes seios, mas sem deixá-los tão à mostra (o que sempre despertava a curiosidade em qualquer um que fosse chegado a mulher).