Sete - Faça Um Luau

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— Sete.

— Nove. Ganhei.

Júlia e Matheus brincam do jogo mais sem graça existente na face da Terra. Estamos deitados na grama do colégio, o sol apenas nos aquece. Nunca estive com tanto tédio em toda a minha vida. Estamos em junho e faz tanto frio que penso se Deus não trocou os continentes. Talvez agora mesmo na Europa esteja um calor escaldante, o calor que deveria estar aqui. Apesar de ser outono, aqui é sempre quente, mas hoje resolveu brincar de frio mesmo com sol.

Um dos maiores prazeres que sinto é pisar em folha seca e a grama está repleta delas. É o mesmo prazer que sinto quando estouro aqueles plásticos bolha. Levantaria agora mesmo e as esmagaria, caso não estivesse com tanta preguiça.

É o tempo livre mais longo que já tivemos: dois tempos seguidos de Inglês. Apoio em meus cotovelos e observo os alunos ao redor. Apolo está no canto perto do portão de mãos dadas com Samanta, desvio o olhar para o nerd da nossa turma que ama a namorada do meu amigo (ouvi dizer que todos os garotos a amam). Ele está a observando. Sinto uma pontada de pena dele. Por um segundo, ele desvia o olhar e me pega no flagra. Balanço os ombros em sinal de solidariedade e ela faz um gesto com a mão na testa, como continência. Acho que está agradecendo.

Nunca tive uma conversa digna com ele, nem com ninguém da turma que não fosse Júlia, Apolo e Matheus. Ele está sozinho e sofrendo de amor. Talvez precise de uma amiga. Ele parece ser legal, certo? Eu sei ser sociável, certo? Levanto-me da grama e vou cambaleando até lá. Tampo o sol da frente dele e ele reclama, fazendo sinal para que eu deixe que o aqueça.

— Olá. — digo. Não sei o que falar, mas é muito ruim ficar sozinho. Ele olha para meus pés, evitando meus olhos. Seus cabelos são loiros e os olhos são meio claros, mas mal se pode ver, porque usa óculos com armadura preta. Depois de alguns segundos ele olha para cima.

— Oi. — diz nervoso. Dá pra ver que ele já faz a barba.

— Vem ficar com a gente... – o chamo para meu grupo nem-um-pouco-animado de amigos. Ele não diz nada. – É melhor do que ficar babando. – aponto para o casal no portão. Ele concorda e me segue. Seu andar é vacilante.

Matheus e Júlia se apóiam no cotovelo olhando para Carlos e eu, mas ao invés de pedirem uma explicação, apenas sorriem e o cumprimentam. Sentamos com pernas de xadrez e ficamos olhando um para a cara do outro. Vasculho pela minha mente em busca de um assunto, só que nada vem.

— E que tal marcarmos logo o luau? — minha amiga japonesa pergunta.

— Oh... Carlos, iremos fazer um luau.

— E você está convidado! — assim que Júlia o diz, seus olhos brilham. — Só precisamos saber quando será.

— Dias dos namorados. Dia doze. — diz Matheus. Todos estão de acordo, afinal, ninguém namora. A não ser Apolo. Provavelmente ele irá passar com Samanta e dará um presente bonito para ela, e ela irá o beijar e levantar sua blusa. A boca dele ficará repleta de brilho labial e com certeza ele irá limpar segundos depois. Afasto o pensamento e volto para minha realidade.

— Dia doze. — digo.

— Dia doze. — Júlia bate palmas, animada. Olhamos para Carlos e ele dá um sorriso meio tímido, mas diz:

— Dia doze.

***

Novamente sou a primeira a chegar na casa de Fernando — talvez mudar de colégio tenha me tornado pontual. Estamos deitados um do lado do outro em sua cama, e sinto seu cheiro de eucalipto. Olhamos para o teto há aproximadamente dez minutos. Acho que é o dia menos empolgante da história.

O Que Não Fazer Antes de Morrer (em revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora