CAPÍTULO 27

495 51 5
                                    

    Foi algo estranho. Não conseguia ver seu rosto. Deduzi ser uma mulher por um cabelo comprido e usava saia. Mas era frio demais para tal vestimenta. Estava com os pés sujos, descalços. Me abaixo para olha-la, oferecer ajuda. Seu corpo um pouco exposto a mim, deslizo minhas mãos pelo chão gelado, os joelhos também.

Ploft, ploft, ploft... alguém bate na porta.

A mulher some.

__________________________________

_ Rose!? _ sou interrompida dos meus devaneios por Daryl.

_ Hum? _ pisco os meus olhos inúmeras vezes. Estou acordada. E fora do quarto, longe da cama.

_ Nós vamos por este caminho. _ papai usa o indicador no mapa.

_ Pode ser que uma horda apareça. Quando fomos a Atlanta quase nenhum morto-vivo surgiu. _ Daryl coça a barba.

_ É, daqui a pouco a neve fica ainda mais forte. Eles ficarão devagar. Por aqui seria mais rápido. Foi este o caminho que eu e Beth usamos. _ digo tentando me manter focada na realidade.

_ Não querida. Este caminho dar para o Leste. Rota para Washington.Vou pegar armas, lanternas e alguns cobertores. Volto logo. _ diz papai.

_ Como? _ questiono.

_ Rose, acho melhor você ficar. _ papai cruza os braços. Detendo o frio. _ Passou por muitas coisas.

_ Estou bem, pai. _ claro que não estava. Mas não queria ficar longe de Daryl.

Pai apenas balança a cabeça. No fundo não concorda com minha ida, não naquele estado. Forcei um modo "melhor".

O mundo podia estar acabando mas ainda sim, tudo aquilo é lindo. Mórbido. Confuso.

Vestia uma calça, jaqueta e luvas. Daryl ainda tinha um gorro.

_ Preciso de um.

_ O que? Um gorro?

_ Sim. O frio vai aumentar. E minhas orelhas congelam. _ digo entrando no carro.

_ É, vai. _ me acompanha sentando ao volante. _ quer este?

_ Não. Fica bem em você. _ sorrio. Vou de encontro a sua boca, para beijá-lo.

Ele meneia. Afastando.

_ Papai perguntou se transamos. _ contraio os lábios para não rir.

_ Sério? _ Daryl pergunta sem o menor interesse na resposta.

_ Não com essas palavras, mas sim, é sério.

_ O que disse?

_ A verdade. Não fizemos nada. Acabei de sofrer um aborto e tudo meu dói, e...

Paro de falar. Aquilo a eu parece normal, mas já a Daryl não.

_ Me desculpe. _ abaixo a cabeça.

_ Não sei se vou te desculpar por isto um dia. Matou nosso filho. _ Daryl fita as terras coberta por uma neve rasa.

_ Eu sei. Eu entendo, só que... _ tenho que escolher bem as palavras. _ não me sinto mau por isto.

_ É, percebi. Tanto que dormiu ao meu lado rapidamente. Nem quis saber como me sentia a respeito. Tinha noção da minha tristeza, aflição, mas agiu como se nada tivesse acontecido.

Ele tem razão. Fui egoísta pelo aborto e fui mais ainda por agir normalmente, quando para todos não era bem assim.

É errado fingir? Não sei. A única certeza disto é que algumas vezes, somente algumas vezes, isto se faz necessário. Questão de sobrevivência. Fatos antropológicos. Ou por respeito a hipocrisia humana, sei lá.

_ O que faz seu pedido de desculpa inválido e falso. _ continua ele.

Fico calada. Eu não tenho um pingo de razão.

_ Só que... quero ficar com você. Fazer dar certo. _ termina.

Sorrio para ele. Papai caminha até o carro. Glenn está ao seu lado carregando uma mochila. O ruído dos dois abrindo  as portas traseira faz ver que estava inconsciente sobre o tempo da chegada dos dois até nós.

Daryl dá a partida. Logo pousando sua mão na perna, eu a alcanço, ele a aperta.

Sim, não está nada bem.

Sim, papai tinha razão, tenho que arrumar um meio de organizar a bagunça feita pela minha covardia.

___________________________________

A mais ou menos uns 7 quilômetros longe da fazenda avistamos uma horda. O odor embrulhava meu estômago, ocasionando um enorme calafrio. Daryl parou o carro.

_ Eles vão passar pela gente. _ diz papai.

_ Sim, temos que voltar. _ digo.

_ Não. Eles já viram o carro, se voltarmos vamos atraí-los a fazenda. O melhor é deixar o carro aqui e buscarmos refúgio na mata. _ diz Glenn.

Papai meneia a cabeça.

Descemos rapidamente. Levando pouquíssimas coisas. Escondidos atrás de árvores podemos ver quão numerosa era a horda. Fizemos bem em nos esconder. O ruim era que, de acordo com Glenn, está horda levaria cerca da noite toda para se dissipar. Teríamos de acampar ali, na mata fria.

Encontramos um lugar bom e distante. Papai começou a juntar pedaços de madeiras para fazer uma fogueira, eu, peguei algumas folhas secas e abri um buraco no chão.

Montamos nossa fogueira, eu, papai, Daryl e Glenn estávamos sentados ao redor dela.

_ Não devemos ficar na fazenda. _ Glenn joga um graveto molhado no fogo.

_ Por quê? Faremos com que der certo. _ diz papai.

_ Aquele lugar é instável demais para a Judith. _ Glenn respira fundo e diz algo que é impossível de se ouvir.

_ Como? _ papai toca seus ombros. Parece que conseguiu ouvir.

_ A Maggie está grávida. _ por fim solta aquilo sobre nós como se fosse uma bomba. _ Ela quer ter o bebê, mas lá na fazenda não é seguro. Nós queremos, na verdade. _ ele sorri. Mas logo desfaz seu sorriso ao me olhar.

Eu abaixo a cabeça. Ouço sons de passos, é Daryl se levantando.

_ Espera _ digo com a voz trêmula _ onde vai?

Minha pergunta paira no ar. O silêncio é cruel e amargo. Sinto-me exposta. Também levanto, com um pouco de dificuldade pois tudo meu ainda dói, e vou seguindo seus rastros.

E mais uma vez, a mulher aparece atrás de uma árvore.

The Walking Dead: Algo para temer [CONCLUÍDA]Onde histórias criam vida. Descubra agora