(9) - UM INVASOR DE QUARTOS

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                Acordei em meu quarto, que estava pouco iluminado. Meu pai estava sentado na poltrona ao lado da cama, cochilando. Eu não sabia ao certo o que tinha acontecido de fato e só me lembrava de ter saído da piscina com a ajuda de alguém. Fiquei me perguntando se eu tinha conseguido passar na prova de natação, até que meu pai acordou com minha pequena agitação.
               - Você precisa parar de me assustar desse jeito, Hannah! – disse meu pai, olhando para mim. – Já estou velho para essas situações.
               - Aquela vagabunda... – eu disse. – Aquela vagabunda me empurrou do trampolim!
              Meu pai estava ciente dos acontecimentos. Ele me disse que Victoria contou tudo a ele, sobre a prova, sobre o acidente e sobre o possível empurrão.
              - Você só está com a perna esquerda um pouco inchada pelo impacto com o trampolim de baixo. – ele disse, um pouco magoado. –Você vai precisar de repouso por uns dias e...
             - Eu não preciso de repouso! Minha perna está ótima, olhe! – eu disse, levantando a perna direita e fazendo um gemido de dor.
             Meu pai se levantou da poltrona e me deu um abraço. Eu me senti completamente indefesa naquele momento. Senti que nada que eu pudesse fazer iria resolver aquele problema.
             Quando ele saiu do quarto e fechou a porta, Scott entrou, segundos depois.
             - Então é verdade... – ele disse, olhando para mim. – Você arrumou confusão no colégio. De novo...
             - Eu não briguei com ninguém dessa vez! – eu disse, me defendendo de uma forma irônica.
             - Espero que eles tem deem outra chance de mostrar o salto. É o que você é melhor nessas provas. Lembro quando estávamos em São Francisco e você arrasou no último campeonato, quando pulou de quatro metros.
             Dei um sorriso para ele, que sorriu de volta. Scott estava sendo bastante compreensivo, como sempre fora. Ficamos conversando por alguns minutos, até que minha mãe bateu na porta, nos mandando dormir. Quando olhei no relógio, vi que ele marcava quase uma da manhã.
            - Bom, espero que você fique boa logo. – disse Scott. – Preciso de alguém que me treine em troca de treinos.
            Ele me deu um abraço e saiu do quarto, fechando a porta. Tentei me levantar rápido da cama, mas sem sucesso. Todo o processo de me levantar fazia com que minha perna doesse cada vez mais. Quando consegui me levantar totalmente, fui andando devagar até o banheiro e passei uma água no rosto.
             Eu não estava com sono, tampouco iria dormir. Procurei pelo closet por minha camisa velha de pintura e a aquarela, junto com os pincéis. Tentei ouvir através da porta alguma voz vindo dos corredores e fiquei mais tranquila quando senti o silêncio.
             Peguei uma tela nova e tentei pensar em alguma coisa para pintar. Assim que coloquei o pincel na tinta preta, ouvi barulhos de vidro tilintando. Olhei para a janela que dava para a janela de Connor e vi que ele estava debruçado em seu parapeito. Coloquei a aquarela na mesa e caminhei devagar até a janela, onde eu a abri.
            - Posso pular? – perguntou Connor, já se preparando para entrar em meu quarto através da janela.
            - Deve. – eu disse, tentando parecer amistosa.
            Enquanto ele pulava, tentei o mais rápido possível trancar a porta. Por fim, Connor estava sentado na beirada de minha cama. Eu me encostei na cabeceira e me sentei também, esticando a perna luxada.
            - São uma da manhã... – eu disse, quebrando o silêncio que havia entre nós dois.
            - Nunca é tarde pra saber o que houve, né? – disse Connor, dando um sorrisinho.
            - Como o que houve? – perguntei, um pouco indignada. – Sua namorada me empurrou lá de cima porque sabia que eu ganharia a prova, Connor.
            Connor esfregou uma das mãos em seu rosto. Respirou fundo e tentou manter a calma e a paciência.
            - Ela gritou por seu nome como se tivesse tentado segurar você lá de cima... Como se tivesse tentado te ajudar a não se desequilibrar... Foi o que ela disse.
            - Eu pulo de trampolins desde os dez anos de idade. – eu disse, com um tom de desdém. – Eu me lembraria de alguma vez que eu escorregasse. Mas não importa. Nada mais importa agora...
            Connor colocou uma de suas mãos em minha perna dolorida. O calor e a maciez de sua palma tomou conta de todo meu corpo. Tentei manter a calma e aproveitar o momento, apesar de tudo.
            - Me desculpe estar tão... arrogante. – eu disse, enfim. – Não posso nadar por duas semanas. E sei que não consegui a vaga no time.
            Connor ficou calado por mais alguns segundos. Segundos que aqueles pareciam minutos. Longos minutos.
            - Han, a prova foi cancelada depois que você caiu. – disse Connor, após a longa pausa. – Tive de pular rápido pra tirar você de lá de dentro. E por causa disso, Margarett não está falando comigo. Ela deve estar extremamente brava. Mas eu precisava ter feito aquilo.
           Toda a raiva que eu sentia naquele momento fora substituída por uma calma sem igual. A prova havia sido cancelada por mim e eu talvez teria uma chance de entrar no time de natação. Connor havia pulado para me tirar do fundo da piscina e Margarett não tinha ganhado nada me empurrando lá de cima.
           - Bom, pelo menos uma coisa boa, não é? – eu disse, tranquila.
           - Com certeza o treinador vai deixar você repetir a prova depois desse... acidente. – ele disse, sorrindo.
           - É... acidente.
           Connor e eu ficamos conversando por mais algum tempo. Falamos sobre sua prova para entrar no time, que consistia em uma avaliação rigorosa dos dois treinadores antigos. Ele também me disse sobre as indignações anuais de Margarett por não conseguir entrar no time de natação e as ameaças que o pai dela fazia ao colégio por isso.
           Conversamos sobre como a natação havia mudado nossa vida e como ele fez vários amigos nos campeonatos estudais. As pessoas pareciam gostar dele, e com razão. Connor era muito divertido, engraçado e tinha um papo bom. Mesmo em cima da cama e sentindo dores na perna, ele conseguira me distrair e me deixar a par de tudo que acontecia na cidade e na escola.
           - É bom conversar com você. – ele disse. – Sinto que não preciso planejar as coisas. Os assuntos vão render. E você vai rir das idiotices que eu digo.
           - É raro eu encontrar alguém às... - ele verificou a hora em seu relógio de pulso. - três da manhã que converse comigo e me distraia da forma que você faz. – eu disse, dando um sorriso.
           - Podemos conversar sempre nessas horas, nos fins de semana. É muito bom encontrar alguém que leva as coisas de uma forma tão... Leve.
           Senti meu rosto queimar um pouco. Tentei não encará-lo para que ele não percebesse meu nervosismo aparente. Olhei para o chão e para o teto, em seguida.
           - Mas pra mim você ainda é o desconhecido capitão do time de natação que invade o quarto das pessoas de madrugada. – eu disse, sarcástica.
           - Se continuarmos assim, vou ser somente o capitão do time de natação que invade o seu quarto de madrugada.
           Dei uma risada animada, assim como ele.
           - Amanhã vamos passar o dia todo juntos. – ele disse, por fim, se levantando da cama e indo em direção à janela. – E aí você vai mudar o conceito de desconhecido para... seu vizinho gente boa que curte conversar com pessoas divertidas como você.
           - Espera, vamos? - perguntei, confusa.
           - É claro. - ele disse. - É o mínimo que posso fazer como pedido de desculpas pela Maggie.
           Connor pulou a janela e voltou para seu quarto. Eu me levantei da cama um pouco mais rápido e fui até a janela, onde ele, com um aceno, se despediu de mim. Abaixei o vidro e fechei as cortinas.
           Deitei novamente em minha cama e apaguei os abajures. Eu não sabia o que iríamos fazer no dia seguinte, mas eu me sentia tão ansiosa quanto o dia anterior da prova. Mas aquela ansiedade era melhor do que antes.

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